EUROPA

Precisamos dos imigrantes, diz chanceler da Alemanha em debate acalorado com oposição e extrema direita

Olaf Scholz subiu o tom após ataques da oposição, que acusa governo de levar o país a uma situação de "imigração descontrolada" em meio ao crescimento do fascismo

Chanceler alemão Olaf Scholz discursa no parlamento.Créditos: Thomas Koehler/photothek.de
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De BERLIM | O chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, elevou o tom na última quarta-feira (11), durante o debate-geral no Bundestag, o parlamento federal do país, em Berlim, após ser alvo de críticas da oposição por sua política de imigração, um tema central nos debates políticos da maior potência econômica da Europa.

A oposição, representada pela aliança conservadora CDU/CSU, liderada anteriormente pela ex-chanceler Angela Merkel, acusa o governo atual, uma coalizão encabeçada por Scholz, do Partido Social Democrata (SPD), com o FDP (liberais) e os Verdes, de promover uma "imigração descontrolada", o que teria sobrecarregado o país.

A Alemanha é um dos países europeus que mais receberam imigrantes e refugiados, principalmente do Oriente Médio e da África, nos últimos anos. A guerra entre Rússia e Ucrânia agravou a crise econômica, intensificando o sentimento xenofóbico e antimigração, o que impulsionou o crescimento da extrema direita, representada pelo partido AfD (Alternativa para a Alemanha), cujas lideranças incluem membros associados ao neonazismo.

Alexander Dobrindt, líder do CSU, criticou Scholz no Bundestag, acusando-o de "ignorância e arrogância" após fracassadas tentativas de acordo entre governo e oposição sobre a política de imigração.

"A sua coligação não é uma coligação de progresso, é uma coligação de declínio. O país não se tornou mais seguro nem mais competitivo desde que assumiram o poder", afirmou Dobrindt, visivelmente exaltado.

Durante seu discurso, Scholz, conhecido por seu tom geralmente calmo, elevou a voz para responder às críticas, defendendo a necessidade de imigração, mas com maior controle. Segundo o chanceler, a imigração é "essencial" para o país, devido ao envelhecimento da população e à consequente redução da força de trabalho.

"Não há país no mundo com uma força de trabalho em declínio que tenha crescimento econômico. Essa é a verdade que nos confronta", afirmou Scholz.

Ele acrescentou que a imigração legal é "essencial" para a economia alemã, e citou a introdução da Lei de Imigração de Trabalhadores e a reforma da Lei de Cidadania como exemplos dos esforços do governo. "É preciso escolher quem vem para a Alemanha", disse Scholz.

Quanto ao asilo para refugiados de guerra e perseguidos políticos, Scholz deixou claro que essa questão não está em debate, uma vez que a proteção dessas pessoas está garantida pela Constituição.

O chanceler também destacou que seu governo tem acelerado as deportações de imigrantes ilegais e reforçado a segurança nas fronteiras, numa tentativa de responder às críticas sobre o alegado "descontrole" migratório.

Esse sentimento antimigração foi o principal fator que levou o AfD a uma vitória assustadoramente histórica em 1º de setembro na Turíngia – a primeira de um partido de extrema direita desde o regime nazista. A legenda conquistou a segunda maior bancada no parlamento da Saxônia e lidera as pesquisas para a eleição estadual de Brandemburgo, marcada para 22 de setembro.

Alice Weidel, presidente do AfD, também discursou no Bundestag, acusando Scholz e a oposição de CDU/CSU de "dividir" a sociedade alemã com suas políticas pró-imigração. Ela defendeu a "proibição total" da imigração para a Alemanha e a expulsão imediata de todos os imigrantes ilegais. "Todos vocês promoveram ativamente o fracasso da política de migração do estado nos últimos anos e décadas", declarou.

Controles nas fronteiras

O debate ocorreu em meio a tentativas de governo e oposição de chegar a um acordo sobre a política migratória, e logo após o anúncio da ministra do Interior, Nancy Faeser, sobre a introdução temporária de controles em todas as fronteiras terrestres da Alemanha.

Segundo Faeser, a medida visa conter a imigração ilegal e proteger o país de ataques terroristas por extremistas islâmicos. No final de agosto, um solicitante de asilo sírio matou três pessoas e feriu outras oito em um ataque com faca na cidade de Solingen, ação reivindicada pelo Estado Islâmico.

"Estamos fazendo de tudo para proteger a população. Estamos fortalecendo a segurança interna e mantendo uma postura firme contra a migração irregular", declarou Faeser em coletiva de imprensa.

A ideia dos controles é restringir a entrada de imigrantes ilegais e facilitar o processo de deportação. A Alemanha faz fronteira com nove países, totalizando mais de 3.700 km de extensão, e já implementou controles rigorosos nas fronteiras com Polônia, República Tcheca e Suíça em resposta ao aumento nos pedidos de asilo.

Ascensão da extrema direita

Pela primeira vez desde o regime nazista de Adolf Hitler, a extrema direita venceu uma eleição estadual na Alemanha. O AfD obteve 32,8% dos votos na Turíngia, um estado do leste alemão, que anteriormente fazia parte da Alemanha Oriental.

O principal líder do AfD na Turíngia, Björn Höcke, ex-professor, é uma figura central na ala mais radical do partido, que já foi dissolvida após investigações sobre vínculos com o neonazismo. Höcke defende um nacionalismo extremo, com claras influências nazistas.

Na Saxônia, o AfD também teve uma votação expressiva, embora tenha ficado em segundo lugar com 30,6% dos votos, atrás do CDU, que obteve 31,9%.

Apesar da crescente ameaça representada pela extrema direita, é improvável que o AfD consiga formar um governo, já que o sistema parlamentarista alemão exige a formação de coalizões para atingir a maioria absoluta no parlamento estadual, e nenhum partido está disposto a se aliar aos ultradireitistas.

O chanceler Olaf Scholz apelou para que os partidos na Turíngia e na Saxônia evitem coligações com o AfD: "Todos os partidos democráticos são chamados agora a formar governos estáveis sem extremistas de direita", declarou.

AfD e neonazismo

A popularidade do AfD, fundado em 2013, vem crescendo rapidamente. O partido conquistou uma cadeira no parlamento alemão pela primeira vez em 2017 e hoje já conta com 77 deputados. 

O AfD defende abertamente ideias xenofóbicas, racistas e segregacionistas. Muitos de seus membros têm comprovados vínculos com o neonazismo e utilizam retórica semelhante à usada pelos nazistas. Em 2023, Björn Höcke foi denunciado por usar linguagem nazista ao se referir à política migratória como "a eliminação do povo alemão", um eco da propaganda nazista "Alles für Deutschland" (tudo pela Alemanha).

Desde 2021, o AfD é monitorado pelo serviço de inteligência alemão, o BfV, por tentar enfraquecer a constituição democrática do país. Pesquisas recentes indicam que o partido já conta com o apoio de 24% da população alemã, tornando-se a segunda maior força política, atrás apenas do CDU.