ORIENTE MÉDIO

Netanyahu chama críticos do genocídio em Gaza de 'idiotas úteis do Irã'

Em discurso no Congresso dos EUA, primeiro-ministro de Israel exagera no tom bélico e na xenofobia e afirma que conflito é um 'choque entre barbárie e civilização'

Créditos: Reprodução YouTube - Benjamin Netanyahu discursa no Congresso dos EUA
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O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, defendeu vigorosamente a guerra de Israel em Gaza durante um discurso nesta quarta-feira (24) em uma reunião conjunta do Congresso dos EUA, em Washington D.C, onde elogiou a aliança israelense-estadunidense e procurou retratar a guerra como uma batalha entre o bem e o mal, civilização e barbárie.

Netanyahu disse que a guerra contra o Hamas fazia parte de um conflito maior entre o Irã e os Estados Unidos, e afirmou que Washington deve apoiar Israel para defender seus valores comuns.

"Meus amigos, se vocês lembrarem de uma coisa, uma coisa deste discurso, lembrem-se disso" Nossos inimigos são seus inimigos. Nossa luta é sua luta. E nossa vitória será sua vitória", afirmou.

Ele também teceu grandes elogios tanto ao presidente Joe Biden quanto ao ex-presidente Donald Trump. Netanyahu evitou falar sobre diferenças de opinião entre ele e o atual presidente democrata e, em vez disso, dirigiu sua ira aos manifestantes anti-guerra, a quem acusou de simpatizar com terroristas e agir como "idiotas úteis do Irã".

“Esses manifestantes cantam do rio ao mar, mas muitos não têm ideia do que rio e de que mar estão falando.” Netanyahu disse.

O premiê israelense não mencionou um cessar-fogo pelo nome, nem discutiu o status do acordo que Israel e o Hamas têm negociado há semanas e que a administração Biden quer desesperadamente concluir. Ele disse que a guerra poderia terminar se o Hamas se rendesse, se desarmasse e devolvesse os reféns.

Trumpistas aplaudem Netahyahu

O premiê israelense recebeu aplausos repetidos dos senadores e representantes republicanos sentados na câmara da Casa para a reunião conjunta, que dezenas de legisladores democratas optaram por não participar.

Uma das presenças que assistiram ao discurso do líder israelense na condição de convidado foi o bilionário Elon Musk, dono do X (antigo Twitter).

Musk sentou-se no espaço reservado a Netanyahu, ao lado da esposa do primeiro-ministro de Israel, Sara, vários soldados israelenses e pelo menos um ex-refém do Hamas.

A visita de Musk ao Capitólio ocorreu um dia depois de ele anunciar que sua empresa de internet via satélite Starlink havia sido ativada em um hospital de Gaza, com o apoio de Israel e dos Emirados Árabes Unidos.

AOC enquadra Musk

A representante democrata Alexandria Ocasio-Cortez, conhecida como AOC, enquadrou Musk ao relembrar que o bilionário já endossou publicamente uma teoria da conspiração antissemita popular entre supremacistas brancos: que as comunidades judaicas promovem o "ódio contra brancos".

AOC respondeu a comentário de Musk postado em resposta a uma postagem da política sobre o discurso de Netanyahu.

"Só para que fique claro, Netanyahu perdeu tantas pessoas que está discursando apenas para uma fração do Congresso. Quando isso acontece, eles preenchem as cadeiras com não associados, como fazem nas cerimônias de premiação, para projetar a aparência de total presença e apoio", escreveu a democrata.

Em resposta, Musk escreveu: "O Partido Democrata tornou-se aberta e ousadamente antissemita" 

AOC resgatou uma matéria veiculada pela mídia de uma postagem do bilionário de novembro de 2023. Na ocasião, o post de Musk chocou até mesmo quem já o critica por recorrer a insinuações racistas ou de outra forma preconceituosas na plataforma Foi a declaração pública mais explícita do bilionário endossando visões antijudaicas.

Ausências e críticas de democratas

A vice-presidenta Kamala Harris, potencial candidata presidencial do Partido Democrata, recusou presidir a sessão, como é tradicional para o cargo que ocupa, citando um conflito de agenda. Quase 100 estagiários da Câmara e do Senado ligaram doentes para protestar contra o discurso.

Netanyahu apresentou uma visão para o dia após o término da guerra, dizendo que após a derrota do Hamas "uma nova Gaza poderia surgir" e que Israel não tinha planos de "reassentar" Gaza. Isso é uma questão que Harris tem pressionado desde o início da guerra.

A representante Nancy Pelosi, ex-presidenta da Câmara, também não compareceu ao discurso de Netanyahu, mas aparentemente ela o ouviu. Pelas redes sociais, ela disse que o discurso dele foi "de longe a pior apresentação de qualquer dignitário estrangeiro convidado e honrado com o privilégio de discursar no Congresso dos Estados Unidos".

Nesta quarta, Pelosi se reuniu com cidadãos israelenses cujas famílias foram mortas ou feitas reféns pelo Hamas em 7 de outubro. “Essas famílias estão pedindo um acordo de cessar-fogo que trará os reféns para casa – e esperamos que o Primeiro-Ministro gaste seu tempo alcançando esse objetivo.”

Em uma publicação online, o senador Chris Murphy, democrata de Connecticut, que no passado já sinalizou estar aberto a condicionar a ajuda a Israel, criticou o discurso de Netanyahu.

"Eu dediquei minha carreira a lutar por uma forte relação entre EUA e Israel. Eu quero que o Hamas seja derrotado. Aquele discurso foi, como eu esperava, um retrocesso tanto para a relação EUA-Israel quanto para a luta contra o Hamas", escreveu.

Manifestações pró-Palestina

Do lado de fora do Capitólio, mais de cinco mil manifestantes pró-palestinos se reuniram para protestar contra o discurso de Netanyahu, alguns usando lenços palestinos, cantando para que os Estados Unidos parassem de armar Israel.

Alguns carregavam cartazes chamando Netanyahu de "criminoso de guerra" e "primeiro-ministro do genocídio". Outros manifestantes tentaram queimar as bandeiras nacionais dos EUA, junto com uma efígie de Netanyahu.

A polícia de Washington retirou as bandeiras palestinas que manifestantes hastearam em três mastros em frente à uma estação de transporte público após removerem três bandeiras dos EUA.

Encontro com candidatos

Netanyahu vai se encontrar com  Harris em Washington nesta quinta-feira (25), após uma reunião separada com o presidente Biden. Os dois também se encontrarão com familiares de estadunidenses mantidos reféns pelo Hamas, informou a Casa Branca.

O líder israelense viajará para a Flórida para se encontrar com o ex-presidente Donald Trump em seu clube privado, Mar-a-Lago, na sexta-feira (26).

O premiê israelense foi convidado para Washington semanas atrás, antes da decisão de Biden de não buscar a reeleição. A relação entre o democrata  e Netanyahu tem se tornado mais tensa nos últimos meses à medida que a guerra se prolonga.

Genocídio em curso

O número de mortos desde o início da guerra, há mais de nove meses, ultrapassou 39 mil, segundo as autoridades de saúde do enclave, cujos números não distinguem entre civis e combatentes.

Israel tem atacado áreas de Khan Younis, uma cidade no sul de Gaza, que havia sido previamente designada como uma zona humanitária, alegando que militantes estavam disparando foguetes e o Hamas estava tentando se reagrupar lá. Mais de 270 trabalhadores humanitários foram mortos durante a guerra, segundo as Nações Unidas.

Embora ambos os lados tenham concordado com os contornos gerais de um acordo de cessar-fogo em três fases, as negociações para encerrar a guerra em Gaza e libertar os reféns parecem ter chegado a um impasse.

Nesta quinta-feira (25) espera-se que uma delegação de negociadores israelenses se encontre com mediadores no exterior, segundo o gabinete de Netanyahu, mas não está claro onde as reuniões serão realizadas ou qual será o nível delas. Israel diz que só concordará com um cessar-fogo permanente após a eliminação do Hamas e o retorno dos 120 reféns vivos e mortos em Gaza.

O Hamas afirmou que não devolverá nenhum dos reféns a menos que Israel forneça um caminho para um cessar-fogo permanente. Ao mesmo tempo, o Hamas tem resistido a pedidos para abandonar seu controle da Faixa de Gaza, que governa desde 2007.