PARLAMENTO EUROPEU

Eleições europeias: a importância do pleito, a guinada à direita e o caso alemão

População de 27 países vai às urnas para eleger representantes do único parlamento transnacional do mundo; na maior economia da Europa, a Alemanha, ultradireita com nuances neonazistas já é a segunda maior força política para o pleito

Bandeira da União Europeia em frente ao Portão de Brandemburgo, na capital alemã Berlim.Créditos: Reuters/Folhapress
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De BERLIM | Mais de 350 milhões de pessoas vão às urnas, em diferentes países, entre esta quinta-feira (6) e domingo (9), para aquele que é um dos maiores pleitos eleitorais do mundo. Trata-se das eleições ao Parlamento Europeu, única casa legislativa transnacional do mundo e que contará, este ano, com 720 deputados eleitos pela população dos 27 Estados-membros da União Europeia

Complexo por reunir interesses políticos de diferentes nações e das mais variadas ideologias políticas, o Parlamento Europeu define legislações que influenciam na vida de todas as pessoas que vivem nos países pertencentes ao bloco. São os eurodeputados, por meio do Conselho Europeu, que indicam o presidente da Comissão Europeia, órgão responsável pela aplicação das leis aprovadas. Atualmente, a Comissão é presidida pela alemã Ursula von der Leyen. 

Através de colegiados especializados em áreas temáticas, como meio ambiente, economia, direitos civis, etc, o Parlamento Europeu tem o poder de determinar o orçamento anual da União Europeia, influenciando diretamente nas finanças e na política de todos os Estados-membros. É na casa legislativa que se formula a governança europeia com projetos que podem impactar não só o continente, como todo o mundo. Suas decisões têm peso, por exemplo, em acordos comerciais, políticas de imigração e ações contra a mudança climática, causando efeitos globais.

E é no contexto de guerras na Ucrânia e no Oriente Médio, colapso climático, crises migratórias e ascensão da ultradireita que os europeus vão às urnas para escolher seus representantes pelos próximos cinco anos. 

Composição 

O Parlamento Europeu elegerá este ano 720 deputados, sendo que o país que mais possui parlamentares na casa legislativa é a Alemanha, dado o princípio de proporcionalidade de acordo com a população de cada Estado-membro da União Europeia. 

O plenário do Parlamento Europeu (Foto: Daina Le Lardic/Divulgação)

Veja abaixo quantos deputados cada país elegerá:  

  • Alemanha: 96 
  • França: 81 
  • Itália: 76
  • Espanha: 61 
  • Polônia: 53 
  • Romênia: 33 
  • Países Baixos: 31 
  • Bélgica: 22 
  • Grécia: 21 
  • Chéquia: 21 
  • Suécia: 21 
  • Portugal: 21 
  • Hungria: 21 
  • Áustria: 20 
  • Bulgária: 17 
  • Dinamarca: 15 
  • Finlândia: 15 
  • Eslováquia: 15 
  • Irlanda: 14 
  • Croácia: 12
  • Lituânia: 11 
  • Eslovênia: 9 
  • Letônia: 9 
  • Estônia: 7 
  • Chipre: 6 
  • Luxemburgo: 6 
  • Malta: 6

Ao serem eleitos, os eurodeputados formam grupos políticos que, em uma comparação com o Brasil, seriam como as bancadas no Congresso Nacional. Essas “bancadas” são constituídas por afinidades ideológicas.

Atualmente, são sete os grupos políticos no Parlamento Europeu, sendo o maior deles o Partido Popular (Democratas-Cristãos), de centro-direita; seguido por: Aliança Progressista, de centro-esquerda/social-democrata; Renovar Europa, liberais e democratas; Verdes/Aliança Livre, ligados às causas ambientais; Conservadores e Reformistas, de extrema direita; Identidade e Democracia; também de extrema direita; e Esquerda, que o próprio nome já diz a corrente política. 

Pesquisas mostram guinada à (extrema) direita 

As últimas pesquisas de intenções de voto para o Parlamento Europeu mostram que a nova legislatura deve sofrer uma guinada à direita, puxada principalmente por países como Alemanha, Espanha e Portugal, que observam um crescimento assustador da ultradireita. Somados aos sempre presentes eurodeputados de centro-direita, a social-democracia, de centro-esquerda, vai perdendo espaço na composição da casa legislativa que dá as cartas na União Europeia. 

Um agregador de levantamentos em cada um dos Estados-membros do bloco feito pelo britânico The Economist, por exemplo, aponta que o grupo Partido Popular, de centro-direita, deve eleger o maior número de deputados nas eleições europeias, com 22% de intenções de voto. Na sequência aparecem os sociais-democratas, de centro-esquerda, da Aliança Progressista, com 17%. 

Chama atenção o fato de que a terceira força nas eleições ao Parlamento Europeu revelada pelas pesquisas é a composta por candidatos que não são “filiados” a nenhum grupo político - e a maior parte deles pertence, em seus países, a partidos de extrema direita

É o caso de candidatos da legenda alemã AfD (Alternativa para a Alemanha), que recentemente foi expulsa do grupo Identidade e Democracia, também de extrema direita, por conta de declarações feitas por um de seus líderes, Maximilian Krah, que relativizou o nazismo ao afirmar, em entrevista, que os membros da Schutzstaffel (SS), a força paramilitar do regime nazista, “não eram todos criminosos”

O eurodeputado alemão Maximilian Krah, do AfD (Foto: Reuters/Folhapress)

O Identidade e Democracia, que reúne candidatos e parlamentares também de extrema direita, como a primeira-ministra italiana Giorgia Meloni, por sua vez, vem logo atrás com 11% das intenções de voto. 

Ou seja, dos quatro grupos que lideram as pesquisas para as eleições europeias, três reúnem uma maioria de candidatos conservadores, sendo um deles composto por radicais, sinalizando uma clara guinada à extrema direita

O caso alemão 

A Alemanha, país que elege o maior número de deputados no Parlamento Europeu, vive momentos de tensão. Governada atualmente pelo chanceler Olaf Scholz, do SPD (Partido Social-Democrata), em uma coalizão com liberais e democratas, a chamada Die Ampel (Semáforo, por conta as cores das legendas: vermelho, amarelo e verde), a potência econômica vem observando um crescimento assustador da popularidade da extrema direita, representada pelo AfD.  

A legenda foi fundada em 2013 e conseguiu uma cadeira no parlamento alemão, pela primeira vez, em 2017 - hoje, já são 77 deputados, sendo a quarta maior força política local. 

Trata-se de uma organização ultrarradical que abriga os membros mais extremistas da Alemanha. O AfD defende abertamente ideias xenofóbicas, racistas, segregacionistas e violentas. A principal plataforma política são projetos antimigração, permeada de retóricas ultranacionalistas que remetem ao nazismo. Diversos membros do partido, inclusive, já tiveram comprovadamente relações com grupos neonazistas e já fizeram falas com tal teor. 

Björn Höcke, uma das principais lideranças do AfD, por exemplo, foi denunciado pelo Ministério Público alemão em 2023 por utilizar linguajar nazista ao dizer que a política migratória do país "nada mais é que a eliminação do povo alemão", usando o slogan nazista "Alles für Deutschland" (tudo pela Alemanha). Mais recentemente houve o caso de Maximilian Krah - o que relativizou os crimes da SS

Desde 2021, o AfD é monitorado pelo serviço de inteligência interno da Alemanha, o BfV, por tentativa de enfraquecer a constituição democrática do país.

Pesquisas recentes revelam que o AfD já tem o apoio de cerca de 24% dos alemães, o que o torna o segundo partido mais popular do país, atrás apenas do CDU, legenda da ex-chanceler Angela Merkel. Nos estados da Turíngia, Saxônia e Brandemburgo, a sigla ultrarradical lidera as intenções de voto para as eleições regionais deste ano, com cerca de 30%. 

Pichação em Berlim: "20% para o AfD? Antifascismo já! (Foto: Ivan Longo/Revista Fórum)

Esse crescimento do AfD às vésperas das eleições do Parlamento Europeu vem gerando conflitos e episódios de violência. Franziska Giffey, ex-prefeita de Berlim, que é do Partido Social-Democrata (SPD), por exemplo, foi atacada em maio por um apoiador do partido de extrema direita em uma biblioteca pública da capital alemã. Ela ficou levemente ferida após ser atingida na cabeça por uma bolsa contendo um objeto pesado. 

Pelas ruas de Berlim, cartazes de candidatos às eleições europeias estão espalhados em praticamente todas as esquinas e aqueles ligados ao AfD recorrentemente são vandalizados ou retirados por militantes de esquerda, gerando confrontos entre os dois lados. Em janeiro, uma multidão protestou na capital alemã contra a extrema direita

Cartaz do AfD é destruído por manifestantes em Berlim (Foto: Folhapress)

A reação de alguns em Berlim à extrema direita, entretanto, não se reflete nas pesquisas de intenção de voto a nível nacional para o Parlamento Europeu: o AfD conta, segundo os últimos levantamentos, com cerca de 15% da preferência dos alemães, atrás apenas do CDU.