Acossado ao Sul pela Argentina, que caiu nos braços dos Estados Unidos, e ao norte pela possibilidade -- ainda que remota -- de debacle do regime de Nicolás Maduro, o governo Lula pegou o "caminho do meio" ao renovar e ampliar a parceria estratégica com a França, cujo ponto alto é o PROSUB, de 2008, que prevê a construção de cinco submarinos até 2035, com transferência de tecnologia.
Conforme a própria página do PROSUB:
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"Além dos cinco submarinos, o PROSUB contempla a construção de um complexo de infraestrutura industrial e de apoio à operação dos submarinos, que engloba os Estaleiros, a Base Naval e a Unidade de Fabricação de Estruturas Metálicas (UFEM), no Município de Itaguaí. As inaugurações da UFEM e do Prédio Principal do Estaleiro de Construção representam a conclusão das duas primeiras etapas de construção desse complexo e os primeiros passos dessa grande conquista da defesa nacional".
De longe, a capacidade de patrulhar a costa brasileira, de 8,5 mil quilômetros quadrados -- a chamada Amazônia Azul -- é uma das prioridades da Estratégia Nacional de Defesa. Nela estão as reservas do pré-sal, possivelmente o petróleo da bacia do Amapá e uma infinidade de riquezas ainda inexploradas.
O Brasil requisitou à ONU a ampliação da Amazônia Azul para cobrir toda a plataforma continental, o que daria ao país soberania sobre 4,5 milhões de quilômetros quadrados de mar.
URÂNIO E OUTRAS RIQUEZAS
Como parte do acordo ampliado, Brasil e França pretendem retomar o projeto do Centro Franco-Brasileiro de Biodiversidade Amazônica.
Os franceses tem interesse específico nas reservas minerais brasileiras, especialmente no urânio, agora que perderam sua principal fonte fornecedora, no Níger, que se aproximou da esfera de influência da Rússia.
Durante seu encontro com Macron, Lula reafirmou as intenções pacifistas do Brasil.
O presidente francês causou imensa controvérsia ao dizer que tropas francesas poderiam lutar na Ucrânia contra a Rússia.
Ele foi "desautorizado" pela OTAN, cujo secretário-geral Jens Stoltenberg afirmou recentemente que a aliança não está em guerra, mas apenas apoia o direito de defesa da Ucrânia.
A OTAN está desenvolvendo um plano de apoio a Kiev de cinco anos de duração, que envolve mais de U$ 100 bilhões.
No contexto europeu e na tradição da diplomacia francesa, Macron tem tentado reafirmar a independência de Paris, ainda que a França tenha se tornado o parceiro júnior da Alemanha na União Europeia.
VENEZUELA E RÚSSIA
Recentemente, o Itamaraty publicou nota revelando "preocupação" com processo eleitoral na Venezuela, depois que uma candidata indicada por Maria Corina Machado, que se considera líder da oposição, não conseguiu registrar sua candidatura.
O governo da Venezuela sustenta que nem Maria Corina, nem seu partido Vamos Venezuela, nem a candidata indicada estavam habilitados para registrar candidatura na plataforma online do Conselho Nacional Eleitoral.
O Brasil é fiador de um acordo entre a Venezuela e a Guiana para resolver de forma pacífica a disputa pela Guiana Essequibo.
O presidente Nicolás Maduro sancionou esta semana a lei que incorpora dois terços da Guiana à Venezuela e denunciou que os Estados Unidos, a CIA e a Exxon Mobil estão por trás da reivindicação da ex-colônia britânica.
Com o Atlântico Sul entregue à OTAN pela Argentina, o controle dos recursos naturais da Venezuela daria a Washington o cenário ideal para conter a dita diplomacia "altiva e ativa" que marcou os dois primeiros mandatos de Lula.
Quando os EUA ainda não tinham adotado sua política de conter a China na América do Sul, o Brasil tentou estender sua influência até a América Central, do que recuou.
Porém, segue sendo o maior parceiro comercial da China na região.
PRESENÇA DE PUTIN
Além disso, o governo Lula já indicou que pretende garantir a presença de Vladimir Putin na Cúpula do G-20, prevista para os dias 18 e 19 de novembro no Rio.
O Tribunal Penal Internacional emitiu um mandado de prisão contra Putin por questões relacionadas à invasão da Ucrânia.
Se Putin vier, vai sentar-se ao lado de representantes de países com os quais Moscou reivindica "estado de guerra".
O G20 é composto por África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia, além da União Africana e da União Europeia.
Ao buscar o "caminho do meio", o Brasil tenta barrar a diplomacia cada vez mais agressiva dos EUA na América do Sul, cujo objetivo de fundo sempre foi a contenção da influência regional brasileira -- Washington aplica a mesma estratégia em relação a todos os competidores em potencial.
Desde a fracassada tentativa de golpe contra Hugo Chávez, em 2002, os EUA perseguem a troca de regime em Caracas.
Washington tem um projeto de Estado, que independe de governo de turno, para reduzir sua dependência energética do Oriente Médio, transferindo a importação de petróleo para a África -- agora disputada por Moscou -- e a América do Sul, muito mais próxima e "fácil" de defender -- como se fosse um quintal.