"Eu costumava me ver como parte do futuro do Partido Democrata, mas acabei de regressar da Palestina e agora vou trabalhar para garantir que o partido nunca mais triunfe. A disposição desta liderança partidária, do presidente Biden, das autoridades eleitas e dos candidatos de permitir que ocorresse um genocídio, transmitido ao vivo e em tempo real, me afastou para sempre".
O depoimento escrito por Emma West Rasmus foi publicado no popular site de política The Hill. Emma é funcionária do escritório sobre violência contra a mulher do Departamento de Justiça e integrou uma missão da igreja Presbiteriana a território palestino ocupado por Israel.
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Emma é uma mulher negra de meia idade que faz parte da rebelião democrata contra Joe Biden por conta dos acontecimentos em Gaza.
Preocupado com o impacto da rebelião na campanha eleitoral deste ano, Biden faz jogo duplo: numa entrevista à MSNBC, disse que não pretende cortar o envio de munição para Israel, mas ao mesmo tempo fez seu mais duro ataque ao primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, dizendo que ele mais atrapalha do que ajuda Israel.
Na véspera da entrevista de Biden, a vice-presidente Kamala Harris mandou outra mensagem a Bibi: não se pode confundir o governo com o povo de Israel.
A REBELIÃO
A surpreendente rebelião enfrentada por Joe Biden pode ser expressa em números: nas primárias de Michigan, mais de 100 mil democratas participaram de uma campanha de protesto e, em vez de votar no presidente candidato a reeleição, marcaram "sem compromisso".
Em dezembro, uma pesquisa bancada pelo New York Times revelou que entre os entrevistados de 18 a 19 anos de idade 72% desaprovavam o comportamento de Biden em relação a Gaza.
O motor da rebelião são jovens democratas que refletem um "fosso de gerações" com o presidente de 81 anos de idade.
Este fosso vai muito além das questões relativas a Gaza e é um fenômeno do século 21, onde blocos de eleitores mulheres e jovens estão se mostrando decisivos em eleições, como se viu no Brasil e na Argentina.
Nos Estados Unidos, foi o comparecimento massivo dos jovens eleitores democratas, como nunca se viu antes, que levou Barack Obama à Casa Branca em 2008. Obama venceu por 66% a 32% entre os jovens de até 29 anos de idade.
Não foi apenas uma questão de identidade geracional, mas de ideias.
As questões econômicas (conseguir um emprego que pague a sobrevivência), a violência das armas e a ameaça das mudanças climáticas estão no topo da preocupação dos jovens.
O mesmo fenômeno que se observa no Brasil acontece nos Estados Unidos.
Aqui, a audiência de portais como o G1, da Globo, despencou, na medida em que os jovens acessam a internet pelo celular.
Ao fazer isso, navegam por links enviados por amigos e se informam pelo instagram, whatsapp e tik tok -- onde, aliás, os vídeos da matança em Gaza recebem centenas de milhares de comentários e compartilhamentos.
Com isso, o blecaute de informações sobre o genocídio em Gaza, que se viu na mídia comercial estadunidense no início do conflito, não impactou o jovem eleitorado democrata que é engajado em questões políticas.
Este segmento de eleitores é o responsável pela popularidade do Black Lives Matter, da luta contra a violência policial e pela extinção do ICE, o US Immigration and Customs Enforcement, acusado de aterrorizar imigrantes ilegais capturados na fronteira.
É o envolvimento na luta antirracista que levou este bloco de eleitores a se identificar com as acusações feitas pela África do Sul de que Israel pratica apartheid contra os palestinos.
Trata-se, portanto, de uma reedição da luta pelos direitos civis dos anos 60, agora não só nos EUA, mas também em Gaza.
O Centro de Informação e Pesquisa em Aprendizagem e Engajamento Cívico [Circle] analisou uma pesquisa de boca-de-urna das eleições de 2022 nos Estados Unidos e constatou que os jovens de até 29 anos escolheram candidatos democratas em relação a republicanos por 63% a 35%.
Em outras palavras, o eleitorado jovem foi decisivo para frustrar os republicanos e Donald Trump, que esperavam uma "onda vermelha" e contavam com a conquista do controle das duas casas do Congresso.
Há ao menos 41 milhões de eleitores em potencial na chamada Geração Z, nascida entre o final dos anos 90 do século passado e os anos 2000.
É justamente por isso que Joe Biden está dando cambalhotas para parecer solidário com o sofrimento do povo palestino. Baixo comparecimento de eleitores jovens nas eleições deste ano pode custar a ele a reeleição.