De Baku, Azerbaijão -- Como tudo o que os chineses fazem na diplomacia internacional, aconteceu sem alarde.
Os que precisavam entender, entenderam.
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A notícia: o Ministério das Finanças da China lançou papéis denominados em dólar na Arábia Saudita. Algo inédito.
O objetivo era vender U$ 2 bi, mas a procura foi de U$ 39 bi, quase vinte vezes mais que a meta (quando os EUA fazem o mesmo, a procura é de 2 a 3 vezes maior).
Curiosamente, os chineses estão cobrando juros nos papéis muito pouco acima dos oferecidos pelo Tesouro dos Estados Unidos -- de 0,01% e 0,03%.
Ou seja, estão competindo com o próprio Tesouro estadunidense na oferta de financiamento em dólar.
A revista estadunidense Newsweek noticiou com a manchete: Como a China poderia enfraquecer o dólar.
Sublinhou que as agências internacionais de classificação de risco não foram levadas muito a sério:
Marc Joffe, analista político do Instituto Cato, apontou [no X] as baixas taxas de juros como um reflexo do crescente conforto do mercado com a qualidade de crédito da China. 'O fato de a China poder atingir spreads dentro de 1 a 3 pontos base dos títulos do Tesouro dos EUA indica que o mercado está rejeitando as avaliações das agências de classificação ocidentais'. Ele destacou a classificação A1 da Moody's para a China, em comparação com a classificação AAA, de nível superior, para os EUA.
Técnica de arte marcial
Não se trata de atacar a moeda dos Estados Unidos diretamente, mas de competir com quem tem o poder de imprimí-la.
Como notou o empresário Arnaud Bertrand, no X, os chineses estão entupidos de dólares: U$ 940 bi de superávit em 2024.
Seria uma imensa provocação se Xi Jinping, depois da posse de Donald Trump, a China passasse a realizar o mesmo tipo de operação em outros países, com quantias muito mais elevadas.
Por exemplo, nos Emirados Árabes Unidos, que assim como a Arábia Saudita tem projetos que precisam de financiamento internacional para reduzir a dependência histórica da produção de petróleo e gás.
Como Bertrand observou, algo inusitado aconteceria:
Isto criaria um sistema paralelo onde a China, e não os EUA, controla parte do fluxo de dólares. Os EUA continuariam a imprimir os dólares, mas a China decidiria cada vez mais para onde eles vão. [...] Outro aspecto crítico é que cada dólar que vai para obrigações chinesas em vez de títulos do Tesouro dos EUA é um dólar a menos que ajuda a financiar as despesas do governo dos EUA.
Usando a força do inimigo
Trocando em miúdos, a China poderia dificultar o financiamento da economia estadunidense, que sobrevive à custa de imensos déficits. Os EUA só são capazes de fazer isso por emitirem a moeda de referência internacional.
Arnaud responde à pergunta que não quer calar: por que a China teria interesse em sustentar a moeda alheia?
Primeiro, por ter uma imensa quantidade dela.
Segundo, pelas imensas necessidades de financiamento de infraestrutura dos países que aderiram à Nova Rota da Seda.
A China poderia emprestar dólares de suas reservas aos países que precisam, mas ser paga em recursos naturais, por exemplo.
Seria uma forma de Beijing se livrar de sua própria imensa carga de reservas em dólar. Em outubro de 2024, eram de U$ 3,2 trilhões.
Diferentemente do Banco Mundial ou do Fundo Monetário Internacional, a China não impõe condicionalidades aos países que aderem aos mecanismos de financiamento de Beijing.
Em outras palavras, suavemente, neste caso a China poderia usar o poder do dólar para enfraquecê-lo, num aviso indireto a Donald Trump, que já escalou lideranças linha dura contra Beijing para cargos-chave do governo.
Arnaud Bertrand resumiu:
Isso parece ser uma espécie de movimento de Tai Chi, usando o mínimo de força para redirecionar a força do dólar de uma forma que beneficie a China.