Adrian Gottfried, liderança da comunidade judaica no Brasil e rabino sênior da Congregação Shalom em São Paulo, afirmou em entrevista ao jornal israelense Haaretz nesta quarta-feira (8) que as comunidades libanesa e palestina se "radicalizaram" no país.
A declaração foi feita como uma reação à operação da Polícia Federal (PF), que cumpriu alguns mandados de prisão e busca e apreensão ao redor do Brasil, a partir da suspeita de que brasileiros supostamente ligados ao grupo islâmico Hezbollah planejariam ataques terroristas no país.
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A PF recebeu as informações do Mossad, a principal agência de inteligência israelense, e dos EUA. Um dos presos no Brasil estava desembarcando de uma viagem oriunda de Beirute, no Líbano, país de atuação principal do Hezbollah. Entre os alvos apontados pelos investigadores, estariam sinagogas e prédios ligados à comunidade judaica no Brasil. Um deles seria a Embaixada de Israel, em Brasília.
O caso é curioso, afinal o Brasil não possui histórico de terrorismo e tem baixa penetração de redes desse tipo. Além disso, o próprio Hezbollah não é responsabilizado por atos terroristas no exterior há muitos anos, pois o foco do grupo se concentra em objetivos militares na Síria e em Israel.
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Ao ser perguntado sobre o assunto pelo jornal Haaretz, o rabino Adrian Gottfried disse não estar surpreso com a suposta presença de pessoas ligadas ao Hezbollah no Brasil, já que, segundo ele, as comunidades libanesa e palestina no Brasil teriam se "radicalizado".
“Muitos judeus no Brasil têm sido complacentes e acreditam que algo assim nunca poderia acontecer aqui porque somos uma sociedade muito inclusiva e tolerante, mas sempre senti que era uma possibilidade, considerando as grandes populações palestinas e libanesas no país e como radicalizaram-se nos últimos anos”, disparou.
O líder judeu disse, ainda, que tinha "certeza" que o ataque deflagrado pelo Hamas contra Israel em 7 de outubro "daria um grande impulso a todos os extremistas do mundo, inclusive no Brasil".
Presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil rebate
Em entrevista à Fórum, o presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal), Ualid Rabah, rebateu as declarações do rabino Adrian Gottfried sobre "radicalização" de comunidades libanesas e palestinas no país.
"Não há essa radicalização. Eles estão confundindo a luta nacional contra o extermínio, contra o apartheid, contra os ataques sistemáticos de um regime opressor, de um regime expansionista, de um regime que tem armas nucleares e que se gerencia por um regime de apartheid, com radicalismo", atesta o líder palestino.
"Ser contra o sionismo é igual ser contra qualquer ideologia racista. É igual ser contra o nazismo, por exemplo. Isso, em absoluto, não representa radicalização. O que os sionistas e o regime pútrefo de Israel pretendem? Pretendem transformar todos aqueles que lutam contra o apartheid na Palestina em pessoas que se manifestam contra os judeus. Absolutamente, não. Na verdade, o judaísmo precisa se livrar da chaga sionista. A chaga sionista que está prejudicando tanto a palestinos quanto a libaneses, tanto na Palestina e no Líbano, como no brasil", emenda Rabah.
O presidente da Fepal, ao contrapor a acusação de Gottfried sobre "radicalização" de palestinos e libaneses, ainda questiona quem de fato é o "radical" ao elencar fatos recentes de perseguição àqueles que se posicionam em solidariedade à Palestina - deflagrada principalmente por lideranças judaicas e parlamentares bolsonaristas.
"Afinal de contas, quem que perseguiu acadêmicos solidários à Palestina? Quem perseguiu deputados solidários à Palestina e que se posicionaram contra o genocídio? Quem que perseguiu ativistas? Quem que perseguiu dirigentes de partidos e sindicatos? Quem que perseguiu militantes? Enfim, foram eles que perseguiram agora, recentemente, nesses dias, de um modo atroz, como nunca foi visto no Brasil", declara, citando o exemplo do deputado Gustavo Gayer (PL-GO), que recentemente fez uma lista com nomes de brasileiros que apoiam a causa palestina e a entregou à Embaixada dos EUA no Brasil.
"Qual foi o deputado que fez uma lista e que entregou essa lista de brasileiros, como ele, seus compatriotas, para uma potência estrangeira hostil, para os Estados Unidos? Em qualquer país do mundo ele estaria preso e talvez sob corte marcial por traição. Me parece que isso é absolutamente infundado", critica Rabah.
"O que Israel quer fazer é tornar a luta das pessoas que lutam contra o apartheid em uma luta criminalizável. E a melhor maneira que eles têm é inventar uma radicalização dessas comunidades. Isso é absolutamente inverídico", finaliza.