Criticado por Lula pela condução politizada do Banco Central (BC), em especial em relação à Taxa Selic, Roberto Campos Neto usou as páginas do jornal Valor Econômico, que pertence ao grupo Globo, para atacar o presidente e se justificar dos encontros em torno da chamada "terceira via", que une inclusive a família Marinho.
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Na manchete para a entrevista, o Valor destaca uma fala em que o economista, alçado ao comando do BC por Jair Bolsonaro (PL) ataca dizendo que a "crítica de Lula atrapalha controle da inflação".
Em pergunta capciosa, o Valor diz que "o presidente Lula fez algumas críticas não só o sr., mas também à condução da política monetária e à autonomia em lei ao Banco Central. Essas críticas tem atrapalhado de alguma maneira o trabalho para controlar a inflação?".
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Campos Neto aproveita a "bola levantada" para atacar o presidente, alegando que usa "aspectos técnicos" para manter os juros altos e "controlar" a inflação.
"Obviamente, quando você tem uma pessoa da importância do presidente questionando aspectos técnicos da decisão do Banco Central, gera um prêmio de risco na frente", diz o bolsonarista, acrescentando que "essa incerteza maior acaba fazendo com que o nosso trabalho fique mais difícil. O nosso trabalho ficando mais difícil, significa que a convergência da inflação é mais lenta e significa que a gente vai demorar mais tempo para atingir uma situação de inflação mais baixa com juros mais baixos, que é o que todos queremos".
Ao culpar as "críticas" de Lula pela inflação, Campos Neto expõe a própria fragilidade dos "aspectos técnicos" da análise do Copom.
Em entrevista à CNN Brasil em maio, o presidente do BC afirmou que apesar de o pleno emprego ser desejado, existe a preocupação de a elevação dos salários gerar inflação. A declaração focava a ata do Copom que sinalizava o fim do ciclo de quedas na Selic alegando que o mercado de trabalho está apresentando “maior dinamismo que o esperado”.
“A preocupação vem quando as empresas não conseguem contratar, e você tem que começar a subir o salário. Se você sobe o salário para o mesmo nível de produção, isso significa que você está iniciando um processo inflacionário. Então, a preocupação vem daí”, disse Campos Neto. Um mês depois, o Copom decidiu manter a Selic em 10,5%.
Tarcísio e a terceira via
Na entrevista ao jornal da família Marinho, Campos Neto não foi indagado sobre o jantar, juntamente com Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos), na casa do apresentador global Luciano Huck supostamente para tratar da chamada "terceira via" em 2026.
No entanto, o bolsonarista usou a oportunidade para negar que foi convidado pelo governador paulista para ser seu Ministro da Fazenda em 2026, caso concorra contra Lula e seja eleito presidente.
"Não, nunca tive nenhuma conversa, em nenhum momento, sobre ser ministro de nada", respondeu ele, admitindo que "tem um relacionamento muito próximo com o ex-colega de governo Bolsonaro.
"A percepção que eu tenho é que ele [Tarcísio} não é candidato a presidente. E fica uma especulação sobre uma influência política, sobre a minha decisão numa possível candidatura em 2030. Daqui a seis anos, eu vou ter 61 anos. Acho que faz pouco sentido esse tipo de especulação", emendou.
Campos Neto ainda foi indagado se "teria desaconselhado o governador Tarcísio a ser candidato em 2026 porque prevê uma situação econômica negativa".
Mais uma vez, ele aproveitou a deixa para traçar um cenário catastrófico para o Brasil.
"O que eu disse e que eu sempre digo para o Tarcísio é sobre o cenário econômico. O que eu tenho dito, não só para o Tarcísio, mas está em todas as minhas apresentações, é que eu vejo um cenário em que temos juros muito altos sobre uma dívida muito alta globalmente e que a gente vai passar por momentos daqui para frente onde essa liquidez vai começar a enxugar. Essa liquidez que está sendo enxugada vai começar a ter efeitos nos emergentes", afirmou.
Diante das especulações de que ele próprio poderia ser o candidato da "terceira via", o bolsonarista negou que planeja se candidatar a algum cargo.
Na pergunta, o Valor lembrou a comparação que Lula fez entre ele e Sergio Moro (União-PR) "sugerindo que ele cumpria uma agenda política quando era juiz da Lava Jato", segundo o jornal.
"Não tenho intenção de me candidatar a nada, não vou me candidatar a nada", respondeu.
A resposta de Campos Neto, no entanto, é muito semelhante a que Moro deu em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo em 15 de agosto de 2017.
"Eu fiz uma opção na minha carreira pela magistratura, então, não me vejo e já disse mais de uma vez, reitero quantas vezes forem necessárias, não sou candidato, não serei candidato", disse Moro à época.
Pouco mais de um ano depois, o ex-juiz da Lava Jato pendurou a toga para se tornar ministro "especial" de Jair Bolsonaro (PL). Escorraçado do governo, Moro foi eleito ao Senado em 2022 após desistir de encarar as eleições presidenciais.