Sempre que há alguma indicação de que a Petrobrás não vai atuar como se fosse uma empresa privada, priorizando o interesse de muitos dos seus acionistas minoritários, ou tem alguma mudança, suas ações caem. Aconteceu nesta quarta-feira (15) após o anúncio da saída de Jean Paul-Prates da presidência da companhia.
A mídia corporativa logo passou a bradar que "intervencionistas" tinham ganho a disputa pelo poder da estatal. Destacam nas manchetes o quanto a empresa perde em valor do mercado com a queda na Bolsa, ignorando que a volatilidade pode jogar a favor nos próximos dias.
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Atualmente, investidores estrangeiros detêm 41,94% das ações ordinárias, e os investidores privados brasileiros ficam com 7,80%. Em relação às ações preferenciais, que dão aos seus proprietários a participação nos lucros da empresa por meio dos dividendos, o maior grupo é o de acionistas estrangeiros, que possuem 47,51% do total, enquanto a União tem 36,61% e os investidores privados brasileiros, 14,96%.
Em março, houve uma queda similar nas ações da Petrobrás por conta da decisão da direção da petrolífera de não pagar os dividendos extraordinários, avaliados em R$ 43,9 bilhões, alocando os recursos em um caixa de contingência. Dividendos extraordinários são aqueles que ultrapassam o mínimo obrigatório a ser pago aos acionistas, ou seja, a companhia pode não distribuir a detentores de ações. Ainda assim, em abril a companhia anunciou o repasse de 50% aos acionistas.
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Após o 7 de março em que o Conselho de Administração da Petrobrás anunciou que deixaria retidos os dividendos extraordinários, a estatal, que valia R$ 529,1 bilhões, perdeu, no dia seguinte, R$ 55 bilhões em função da desvalorização das ações. Mas a "perda" foi revertida de forma rápida, tanto que, em 25 de abril, o valor de mercado chegava a R$ 561,4 bilhões, um acréscimo de R$ 87,6 bilhões, superando em muito a queda.
O que significa de fato essa oscilação das ações da Petrobrás que ganha manchetes? Conversamos com o economista do Observatório Social do Petróleo, Eric Gil Dantas para saber. Confira:
Qualquer variação negativa do valor das ações da Petrobrás sempre é tratada pela mídia como algo relativo à má gestão. Isso é necessariamente verdade?
Não. O valor das ações da Petrobrás sobe ou desce na Bolsa, de modo geral, a partir da expectativa de quanto que essas ações vão render para os acionistas minoritários, principalmente no curto prazo. E não necessariamente isto está ligado com a sustentabilidade da empresa.
Por exemplo, ao longo do governo Bolsonaro, houve trimestre em que se pagou mais dividendos do que a empresa teve de lucro, e isso fez subir o preço da ação. Ora, você investiria numa empresa em que sai mais dinheiro do que entra? Parecia empresa familiar das mais mal administradas. Outro exemplo, a Petrobrás privatizou a NTS e a TAG, subsidiárias que eram responsáveis por fazer o transporte de gás natural da própria estatal. Isso elevou os custos da empresa e colocou a Petrobras sob o monopólio de um outro agente. Quem em sã consciência acha que é uma boa prática criar uma situação de monopólio pra você mesmo? Isso não fez a ação da Petrobrás cair.
Hoje, se você aumentar o investimento da empresa – que a deixa mais pronta para a transição energética – é capaz da ação se desvalorizar, porque o objetivo exclusivo de boa parte do mercado é receber dividendos no mês que vem.
Em que medida os interesses do mercado financeiro e dos acionistas da empresa são conflitantes com os interesses gerais da sociedade?
Acho que a questão do preço é um ótimo exemplo da divergência em si dos interesses da sociedade e dos detentores privados de ações da Petrobras. Em 2022, tivemos o maior preço real da história do Brasil para petróleo, gasolina, diesel e GLP. Com isto, a Petrobras teve o maior lucro da história de uma empresa no território brasileiro. Bem, mas isso fez a população brasileira empobrecer em termos monetários, com uma inflação de dois dígitos.
O governo tem que arbitrar para que uma empresa estatal não gere problemas econômicos profundos na população, senão não faria sentido ela ser estatal. Se fosse uma empresa privada, não teria o que fazer, mas como é a Petrobras, naquele momento o governo poderia ter mudado a política de preços e assim equilibrar mais os interesses da população com os do mercado, adicionando à equação a preocupação com o poder de compra da população. No entanto, naquele momento, a única coisa que importava era o que o mercado queria.
É correto chamar de "intervencionismo" quando o governo, mesmo sendo acionista majoritário de uma sociedade de economia mista como a Petrobrás, busca enquadrá-la em uma política de desenvolvimento?
A Petrobras é uma estatal, mesmo sendo de capital misto. Uma estatal, e isto está na lei das estatais, não busca exclusivamente o lucro, mas também o bem-estar da população. Há o bônus e o ônus em investir em uma empresa estatal, como, por exemplo, raramente uma empresa estatal vai falir, diferentemente de empresas privadas que falem todos os dias.
Além do mais, a Petrobras é hoje a melhor opção de investimento para receber dividendos do Brasil. Quem quer ganhar dinheiro de forma estável no Brasil (como fundos de pensão) não procura empresa privada, e sim título público e ação da Petrobras.