O Brasil enfrenta uma situação de "descontrole" em relação à violência policial no país, com uso "excessivo" e "desnecessário" da força. É o que diz um relatório da Anistia Internacional publicado nesta quarta-feira (24). Somente entre os meses de julho e setembro do ano passado, pelo menos 394 pessoas foram mortas em operações policiais nos estados da Bahia, Rio de Janeiro e São Paulo.
O dado faz parte do relatório “O Estado Dos Direitos Humanos no Mundo". Para a diretora executiva da Anistia Internacional, Jurema Werneck, o número mostra um descontrole no uso da força policial.
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"Começa com o órgão constitucionalmente responsável por controlar a atividade policial, o Ministério Público, sendo omisso e inoperante diante de graves violações de direitos humanos cometidos por agentes do Estado; e termina com casos de letalidade policial que não são levados à justiça", afirma.
A diretora ainda acrescenta que o recado é de que "a polícia tem carta branca para matar e cometer outras violações, sobretudo, contra comunidades negras e periféricas".
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O relatório ressalta que as operações policiais fortemente armadas orientadas para a "guerra às drogas" nas favelas e bairros marginalizados resultaram, além do alto número de mortes, em outras violações dos direitos humanos, como invasões ilegais, destruição de propriedades, tortura, outros maus-tratos, restrições à liberdade de circulação, desaparecimentos forçados e suspensão de serviços essenciais, como escolas e centros de saúde.
O texto cita a operação policial no Complexo da Maré, na cidade do Rio de Janeiro, em outubro do ano passado, onde 17.000 estudantes não tiveram acesso à escola e mais de 3.000 consultas médicas foram suspensas devido a seis dias de operação.
A Operação Escudo na Baixada Santista, litoral de São Paulo, que chocou pela letalidade e foi alvo de diversas denúncias por violações de direitos, também foi citada pela Anistia Internacional como exemplo do descontrole da força policial. A organização, em parceria com o Conselho Nacional de Direitos Humanos e outras entidades, documentou 11 casos de violações graves dos direitos humanos realizadas por agentes do Estado, incluindo execuções extrajudiciais, entrada ilegal em residências, tortura e maus-tratos.
Impunidade
Apesar do cenário, "o uso ilegal da força pela polícia continuou não sendo investigado de forma rápida ou eficaz", afirma o relatório.
O documento cita alguns casos, como o desaparecimento forçado de Davi Fiuza, de 16 anos, durante uma batida policial na cidade de Salvador, Bahia, em 2014, que permaneceu sem solução. O caso de três policiais indiciados pelo assassinato do ativista Pedro Henrique Cruz em 2018 em Tucano, Bahia, que ainda não foram a julgamento, e o fato de sua mãe, Ana Maria, continuar a sofrer ameaças e intimidações.
A organização também afirma que o Brasil ignorou medidas para reduzir a violência policial, como o uso de câmeras corporais, e critica a fala do ex-secretário executivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Cappeli, que declarou, em outubro do ano passado, que “não se enfrenta o crime organizado com fuzil com rosas”, em relação à crise de segurança na Bahia.
Outras violações de direitos
O relatório ainda traz dados sobre violência contra defensores do meio ambiente, violência de gênero, direitos dos povos indígenas e índices de pobreza e desigualdades em relação aos 156 países analisados. Segundo a Anistia Internacional, a maioria dos países das Américas não conta com sistemas robustos para defender os direitos das populações citadas e as autoridades continuaram a violar os direitos à vida, à liberdade, a julgamentos justos e à integridade física, enquanto detenções arbitrárias foram generalizadas na região.