VIOLÊNCIA NO CAMPO

Estado brasileiro é sentenciado na Corte Interamericana por omissão em assassinato de sem terra

Antonio Tavares foi morto pela Polícia Militar do Paraná que tentava impedir uma caravana do MST de chegar a Curitiba em maio de 2000; Saiba onde acompanhar a transmissão da sentença

Manifestação do MST em 2 de maio de 2022, relembrando os 22 anos do assassinato de Antonio Tavares.Créditos: Wellington Lenon/MST-PR
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A Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA), divulga na próxima quinta-feira (14) a sentença contra o Estado brasileiro pela omissão em relação ao assassinato do trabalhador rural Antonio Tavares e a lesões sofridas por mais de 185 pessoas ligadas ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

Antonio Tavares Pereira foi assassinado em 2 de maio de 2000, quando mais de 1500 integrantes do MST se dirigiram à capital paranaense para participarem da Marcha pela Reforma Agrária, em comemoração ao Dia dos Trabalhadores. Mas a manifestação foi duramente reprimida pela polícia.

Sob comando do governador à época, Jaime Lerner (antigo DEM), e sem qualquer ordem judicial, a Polícia Militar do Paraná, organizada em uma tropa de 1500 agentes, bloqueou a BR-277 e impediu à bala a chegada da comitiva de 50 ônibus a Curitiba. Na altura do km 108, em razão do bloqueio, os passageiros desceram de um dos ônibus quando PMs fizeram disparos contra os trabalhadores rurais. Foi nesse momento que Antonio Tavares foi morto e outras 185 pessoas ficaram feridas.

Antonio Tavares tinha 38 anos e deixou esposa e cinco filhos. Ele era assentado da reforma agrária no município de Candói e fazia parte do Sindicato dos Trabalhadores Rurais da cidade. A Polícia Militar sequer prestou socorro às vítimas na ocasião.

O MST aponta que o ataque à marcha não foi um caso isolado. “A repressão está inserida num contexto de intensa criminalização e perseguição aos movimentos sociais de luta pela terra no Paraná, endossada pelo então governador Jaime Lerner. Entre os anos de 1994 e 2002 – primeiro e segundo mandatos de Lerner – ocorreram 502 prisões de trabalhadores rurais, 324 lesões corporais, 7 trabalhadores vítimas de tortura, 47 ameaçados de morte, 31 tentativas de homicídio, 16 assassinatos e 134 despejos violentos no Paraná”, relembra uma nota do movimento.

Diante do arquivamento do caso na justiça brasileira e a manutenção da impunidade dos PMs envolvidos e do governador, o caso foi denunciado em 2004 à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) por uma série de organizações. Entre elas estão Terra de Direitos, Comissão Pastoral da Terra (CPT), Justiça Global, MST e Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (Renap).

O caso então foi submetido à Corte Interamericana em fevereiro de 2021. Nos dias 26 e 27 de junho de 2022 foi realizada a audiência na Costa Rica com as organizações representantes das vítimas, Maria Sebastiana (a viúva de Antônio Tavares) e Loreci Lisboa, outra vítima dos tiros.

Também participaram a perita Ela Wiecko Volkmer de Castilho e representantes da CIDH, da Advocacia Geral da União (AGU), do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (SIC) e da Casa Civil do Paraná. O Estado brasileiro não conseguiu contestar a agressão aos manifestantes e o assassinato de Tavares.

“Temos a expectativa de que a decisão da CIDH contribua para articularmos forças para pautar o Estado brasileiro na investigação e responsabilização de quem pratica violências e violações de direitos humanos. E mais, apontar a necessidade dos governos em assumir o compromisso de combater essas práticas com políticas concretas de solução dos conflitos, que é retomar a reforma agrária e os direitos dos trabalhadores do campo”, avalia Ayala Ferreira, da direção nacional do Setor de Direitos Humanos do MST.

Por meio do Decreto 4463/2022, o Estado brasileiro reconheceu a competência da Corte Interamericana de Direitos Humanos para fatos posteriores a 10 de dezembro de 1998, ou seja, se submeteu expressa e voluntariamente à sua jurisdição. A transmissão do comunicado da Corte inicia às 10h30 (horário de Brasília), pelo canal da Corte. Clique aqui para assistir.