Em 2023, o Brasil registrou queda no número de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil e atingiu o menor nível desde 2016, quando teve início a série histórica da PNAD Contínua, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgado nesta sexta-feira (18).
Em 2022, a proporção de crianças no trabalho infantil havia interrompido a sequência de quedas e subido para de 4,9%. Naquele ano, 1,881 milhão crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos estavam nesta situação. Já em 2023, houve queda de 14,6% - foram registradas 1,607 milhão. Em comparação com 2016, a queda foi de 23,6%.
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O advogado e membro da Comissão da Criança e do Adolescente da OAB-SP, Ariel de Castro Alves, afirma que a queda foi gerada pelo novo Bolsa Família, que condiciona a matrícula e frequência escolar das crianças e adolescentes para o recebimento do benefício por suas famílias. Além disso, ele destaca que o governo Lula retomou as fiscalizações de enfrentamento ao trabalho infantil realizadas pelos auditores do Ministério do Trabalho e Emprego, com apoio da Polícia Federal.
Ele também acrescenta que a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (Coneaeti), paralisada no governo de Jair Bolsonaro (PL), foi retomada em fevereiro de 2023, contribuindo para a criação de políticas públicas de enfrentamento ao trabalho infantil.
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"Na Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente criamos, em janeiro de 2023, uma coordenação de enfrentamento ao trabalho infantil para articular ações e politicas públicas contra o trabalho infantil com os demais ministérios do governo federal, com governos estaduais e municipais, organizações da sociedade civil, Organização Internacional do Trabalho, Ministério Público do Trabalho e a Justiça do Trabalho", explica o advogado.
"Já o governo Bolsonaro, além de ter inviabilizado as fiscalizações das equipes do Ministério do Trabalho no enfrentamento ao trabalho infantil e ter paralisado a Conaeti, estimulava essa situação através de discursos exaltando o trabalho infantil e com projetos de seus líderes no Congresso Nacional para legalizar a exploração do trabalho infantil", acrescenta Ariel.
Por fim, ele sinaliza que agora falta que o governo Lula retome as ações do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, que gerou impactos importantes para a redução dos casos entre 1996 e 2016.
Crianças em situação de trabalho infantil no Nordeste
De acordo com o levantamento do IBGE, o maior contingente de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil estava no Nordeste (506 mil), mas a maior proporção estava na Região Norte, onde 6,9% das crianças e adolescentes de 5 a 17 anos estavam em situação de trabalho infantil.
Maioria das crianças é preta ou parda
Em relação ao perfil dessas crianças, 65,2% eram pretas ou pardas. Esse percentual superava a participação deste grupo de cor ou raça na população do país de 5 a 17 anos de idade (59,3%).
Já a proporção de brancos entre os trabalhadores infantis (33,8%) era inferior à sua participação na população de 5 a 17 anos do país (39,9%).
Jornadas chegam a mais de 40h para um em cada cinco crianças e adolescentes
Para 39,2% das crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil a jornada de trabalho era de até 14 horas, enquanto para 20,6%, poderia chegar a 40 horas ou mais.
Segundo o IBGE, o número de horas semanais trabalhadas aumenta conforme a idade. No grupo dos 5 a 13 anos, mais de 80% das crianças e adolescentes trabalhavam até 14 horas. Já no grupo dos 16 e 17 anos, 19,7% trabalhavam até 14 horas, enquanto 31,1% trabalhavam 40 horas ou mais.
Mais de meio milhão nas piores formas de trabalho infantil
Em 2023, 41,1% - ou 586 mil - das crianças e adolescentes que realizavam atividades econômicas exerciam as piores formas de trabalho infantil. Entre as crianças e adolescentes nesta situação, 76,4% eram do sexo masculino e 67,5% eram de cor preta ou parda.
O contingente de trabalhadores infantis na Lista TIP foi o menor da série histórica (586 mil pessoas) em 2023, recuando 22,5% frente a 2022, quando 756 mil crianças e adolescentes estavam nessa situação. Em 2016, havia 926 mil crianças no país exercendo as piores formas de trabalho infantil.
No ano passado, o percentual de crianças e adolescentes nas piores formas de trabalho infantil também registrou queda histórica, recuando e 51,3% para 41,1%, menor taxa da série.
As piores formas de trabalho infantil atingem os mais jovens: 65,7% das crianças e adolescentes de 5 a 13 anos de idade que realizavam atividades econômicas exerciam ocupações na lista TIP. No grupo de 14 e 15 anos, esse percentual foi de 55,7%. Entre os adolescentes de 16 e 17 anos, 34,1% estavam nessa condição.
Setores que concentram trabalho infantil
Comércio e agricultura são os dois setores que mais concentram a presença de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil. Em 2023, 26,7% desse contigente atuavam no comércio e na reparação de veículos (26,7%), enquanto 21,6% estavam na agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura.
As crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil eram exploradas, principalmente, em atividades não agrícolas (78,4%), fosse como empregados (62,8%), trabalhadores familiares auxiliares (24,3%) e ocupados por conta própria ou empregadores (12,8%).
Em relação às ocupações informais, a proporção de adolescentes de 16 e 17 anos recuou para 73,4%. Foi a menor taxa de informalidade da série histórica, que havia chegado ao auge (76,5%) em 2022. Em 2016, a taxa de informalidade desse grupo etário foi de 75,3%.
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