Porta-bandeira e baluarte da escola de samba Portela, Vilma Nascimento, de 85 anos, foi vítima de racismo na loja Duty Free Shop do aeroporto de Brasília. O caso ocorreu na terça-feira (21), mas a denúncia se tornou pública nesta quinta (23).
Vilma retornava ao Rio de Janeiro, após ser homenageada na Câmara dos Deputados, pela celebração do Dia da Consciência Negra.
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Danielle Nascimento, filha de Vilma, usou as redes sociais para contar que ela e a mãe foram comprar chocolates na loja, antes do embarque para o Rio. Após pagarem, passaram mais uma vez na porta da loja e foram abordadas por uma fiscal.
Em seguida, foram acusadas de terem furtado um produto. Danielle afirmou que a fiscal recebeu uma orientação, via rádio, para revistar a bolsa de Vilma.
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Ambas sofreram o constrangimento de terem suas bolsas revistadas na frente de todas as pessoas que estavam na loja, até que os funcionários chegassem à conclusão de que não havia ocorrido nenhum furto.
Danielle classificou a ação como “humilhante, que não deveria existir mais no Brasil ou em qualquer outro lugar do mundo”. Ela relatou, também, que a mãe “ficou surpresa, revoltada e envergonhada” e que tentou acionar a polícia sem sucesso. As duas tiveram de correr para não perderem o voo e Vilma entrou no avião “aos prantos”.
“Foi uma humilhação que nem eu, nem a minha mãe imaginávamos passar nessa vida. Estamos tristes e traumatizadas até agora. Foi um absurdo! Cheguei a perguntar se ela estava fazendo isso conosco por causa da nossa cor”, destacou Danielle.
“Na aeronave, a aeromoça percebeu que elas estavam bem agitadas e chorando, e até ofereceu água. Na terça-feira, minha avó ia chegar no Rio e ia direto para um jantar na casa da [cantora] Alcione para comemorar o aniversário [da artista]. E ela nem conseguiu ir. Ontem, ela não amanheceu bem, estava com a glicose alta. Eu tive de levá-la para a minha casa”, relatou Bernard Nascimento, neto de Vilma, segundo a Agência Brasil.
Repercussão
O Grêmio Recreativo Escola de Samba Portela publicou nota de solidariedade.
“A luta por uma sociedade mais justa e humana passa pelo combate ao racismo. O G.R.E.S Portela repudia veementemente o preconceito sofrido por Vilma Nascimento, o Cisne da Passarela, no aeroporto de Brasília, em companhia de sua filha Danielle Nascimento. Vilma é um dos ícones da Portela e do carnaval. É uma sambista de destaque, que traz na pele a marca de nossa ancestralidade. O constrangimento, demonstrado nas imagens divulgadas, é sentido por todos que temos no samba parte importante de nossa identidade, e que enxergamos em Vilma uma de nossas grandes referências. Em nome dessa ancestralidade, que orgulhosamente compartilhamos e exaltamos, levantamos nossa voz pedindo para que o caso seja apurado pelas autoridades. Este é um dever do poder constituído não apenas para com os sambistas, mas para toda a população preta de nosso país, que não admite mais ser discriminada em lugares públicos”, disse a nota.
A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, também se manifestou: “São absurdas e inadmissíveis as acusações racistas feitas por funcionários de uma loja do aeroporto de Brasília a Vilma Nascimento, Baluarte da Portela e lenda viva da cultura negra brasileira. Entraremos em contato com a vítima para prestar nossa solidariedade e auxílio. O Ministério da Igualdade Racial está desenvolvendo um acordo de cooperação técnica com a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), a Polícia Federal e os Ministérios dos Direitos Humanos e Porto e Aeroportos para medidas eficazes de combate ao racismo, envolvendo capacitação, preparo e formação antirracistas para servidores e bolsas para ampliar a diversidade na aviação. Vamos tomar as providências cabíveis para que casos absurdos como esse não se repitam”, publicou Anielle nas redes sociais.
Paulo Pimenta, ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social, condenou o episódio: “Inadmissível! Na semana da Consciência Negra, um caso absurdo de racismo escancara a dura realidade do nosso país. Meu abraço e minha solidariedade a ela e sua filha. Presidente Lula já deu o recado e nós reafirmamos que não vamos tolerar racismo no nosso país”.
Um dos principais nomes da Portela, o sambista Paulinho da Viola, publicou um texto em suas redes sociais.
“Vilma Nascimento, eterna Porta-bandeira da Portela, foi vítima de um ato inaceitável numa loja do aeroporto de Brasília. Foi obrigada a abrir sua bolsa na frente de todos para provar que não havia furtado nenhum produto. Foi com dor e indignação que vi o vídeo dessa cena lamentável, onde Vilma, constrangida, mostra seus pertences e se explica para uma funcionária. Apesar de todos os esforços que temos feito para combater esse preconceito, ele acontece diariamente toda vez que uma pessoa é agredida, humilhada, constrangida e ferida dessa maneira. Eu também me sinto ferido. Sinto muito, querida Vilma, sinto mesmo. Você é muito maior que tudo isso", postou o artista.
Denúncia na Justiça
A família registrou ocorrência e disse que pretende fazer uma denúncia na Justiça. Depois da repercussão, a loja teria afastado a funcionária.