O deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) acionou a Procuradoria-Geral da República (PGR) e o Ministério Público do Trabalho (MPT) contra o iFood e agências de publicidade contratadas pela empresa. O motivo é a revelação, feita em reportagem da Agência Pública, de que o aplicativo de entregas de comida contratou publicitários, criou perfis falsos e infiltrou agentes para desmobilizar o movimento de entregadores que reivindica melhores condições de trabalho.
Em abril de 2021, entregadores organizaram grandes protestos e paralisações contra o iFood por conta dos valores baixos que recebem por longas horas de trabalho e para denunciar as condições precárias de trabalho a que são submetidos. Em março deste ano novas manifestações e "breques" foram registrados.
Te podría interesar
Segundo Agência Pública, o iFood contratou duas agências de publicidade que teriam criado duas páginas que deram suporte à narrativa: a fanpage "Não Breca Meu Trampo" e a página de memes "Garfo na Caveira". Ambas as iniciativas serviam para criar uma narrativa contra a reivindicação por direitos, usando perfis falsos para simular falsos entregadores que se colocavam contra o movimento grevista.
"As páginas foram criadas para interagir com os entregadores, como ferramenta de auxílio ao IFOOD, para desestimular os trabalhadores em suas mobilizações de reivindicações de melhorias nas condições de trabalho, utilizando-se de inteligência artificial para esvaziar a narrativa de greve", aponta Ivan Valente na representação protocolada junto à PGR e MPT.
Te podría interesar
O parlamentar lembra que pesquisa realizada pela Locomotiva Pesquisas e Estratégia, sob encomenda do iFood, em março de 2021, revela que a maioria dos entregadores (61%) trabalha sete dias por semana para o aplicativo e que 47% trabalham mais de 10 horas diárias. Entre outros dados, há o de que 17% dos entregadores passam mais de 12 horas fazendo entregas.
Para o deputado, a atitude da empresa e das agências de publicidade contratadas configuram uma violação ao direito de greve, garantido pela Constituição Federal nos artigos 8º e 9º.
"Trata-se de sabotagem a direitos constitucionais de trabalhadores que vivem em situações extremamente precárias e que revela patente ilegalidade praticada pelos representados, o que torna imperiosa a apuração e responsabilização dos abusos cometidos, de maneira a se resguardar a liberdade de manifestação e de organização e do direito de greve dos entregadores de aplicativos", assinala o congressista.
Ivan Valente é o autor do projeto de lei aprovado em dezembro do ano passado na Câmara dos Deputado que garante proteção e direitos básicos aos entregadores de empresas de aplicativos.
Máquina de propaganda do iFood contra movimento de entregadores; entenda
De acordo com documentos, fotos e relatos obtidos pela Agência Pública a empresa iFood infiltrou agentes para tentar desmobilizar as manifestações de entregadores de aplicativos.
Durante as manifestações de abril de 2021, agentes portavam adesivos e faixa que pediam “vacinação já” no estádio do Pacaembu, na zona oeste de São Paulo, que vieram acompanhados pela disseminação de posts e comentários de usuários falsos, que teriam sido criados por agências de publicidade a serviço do iFood no Twitter e Facebook. As agências contratadas teriam criado duas páginas que deram suporte à narrativa: a fanpage de conteúdo político Não Breca Meu Trampo e a página de memes Garfo na Caveira.
Segundo os relatos, o objetivo da publicidade não assinada era disseminar ideias e opiniões em um formato que imitasse a forma dos entregadores de se comunicarem, simulando que as postagens e narrativas vinham de verdadeiros entregadores.
O documento, que seria usado como guia pelas agências de publicidade, explica a tática: “Usamos Páginas de Facebook, Perfis do Instagram, Perfis de Twitter, Perfis de Facebook, criados por nós para gerar esses rumores. Como? Comentamos em publicações que falam do assunto, vamos em perfis que abordam o assunto e comentamos de forma indireta […], mas NUNCA assinado como iFood para que ninguém desconfie”.
A Pública acessou mais de 30 documentos das campanhas — entre relatórios de entrega, cronograma de postagens, vídeos, atas de reuniões e trocas de mensagens —, além de conversar com pessoas que trabalharam nas agências e acompanharam a campanha desenvolvida para o iFood durante pelo menos 12 meses. As pessoas entrevistadas foram mantidas em anonimato.