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[caption id="attachment_140081" align="alignnone" width="700"] Foto: Nelson Jr./ASICS/TSE[/caption]
Por Paulo Illes* e Anna Paula Ferrari**
No próximo dia 07 de outubro milhões de brasileiros irão às urnas para escolher seus representantes para os cargos de Presidente, Senadores, Governadores, Deputados Federais e Deputados Estaduais. Conforme a Constituição Federal em seu Art. 14, a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, sendo obrigatório aos maiores de dezoito anos e facultativo aos analfabetos, aos maiores de setenta anos e aos maiores de dezesseis e menores de dezoito anos. O parágrafo segundo, no entanto, veta esse direito universal aos imigrantes: “§ 2º Não podem alistar-se como eleitores os estrangeiros e, durante o período do serviço militar obrigatório, os conscritos”.
Em 2017, o Congresso Nacional aprovou a Lei 13445 – mais conhecida como a Nova Lei de Migrações – substituindo o Estatuto do Estrangeiro. O antigo Estatuto, Lei 6815, datava da ditadura civil militar e tinha como característica a aversão ao estrangeiro, ao imigrante e que, portanto, criminalizava a ação política de pessoas em condição de imigração no Brasil. A Nova Lei busca reformar esse modelo ao estabelecer princípios visando uma mudança de paradigma. Tendo como central a proteção de direitos humanos, garantia constitucional à dignidade humana, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, assegurando-lhe também os direitos e liberdades civis, sociais, culturais e econômicos (artigo 4º, caput e inciso I), a promoção da regularização migratória, acesso igualitário e livre dos imigrantes a serviços, programas e benefícios sociais, bens públicos, educação, assistência jurídica integral pública, trabalho, moradia, serviço bancário e seguridade social (artigo 3º, XI), ainda deixa explícito o repúdio e a prevenção à xenofobia, ao racismo e a qualquer tipo de discriminação.
No contexto eleitoral, um dos pontos mais importantes da Lei é a garantia do direito à participação e manifestação política aos imigrantes, antes negligenciado e reprimido pelo Estatuto do Estrangeiro. A legalização da participação na vida política abre uma janela importante para colocar em debate o direito de votar e de ser votado para imigrantes. Atualmente tramitam no congresso alguns Projetos de Emenda Constitucional que propõem mudanças para assim permitir a participação plena das populações migrantes na vida e no destino do país. Pronta para ser votada no Senado Federal, desde setembro de 2017, a PEC 25/2012 de autoria do Senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) estabelece o direito à participação de imigrantes nas eleições municipais, desde que haja reciprocidade em favor de brasileiros. Na Câmara Federal tramita a PEC 347/2013 de autoria do Deputado Federal Carlos Zarattini (PT-SP), que altera o § 2º do artigo 14 da Carta Magna, visando conceder direitos políticos a imigrantes residentes no Brasil há mais de quatro anos e que estejam em situação migratória regular. A PEC prevê inscrições de imigrantes como eleitores em eleições a nível federal, estadual ou municipal. Sujeita à Apreciação do Plenário à PEC 347/2013 foi apensada a PEC 386/2017 de autoria da Deputada Federal Renata Abreu (PODE-SP) que altera de 4 para 5 anos o tempo de permanência regular no Brasil.
Conforme levantamento da Rede Espaço Sem Fronteiras, uma importante rede de organizações que atuam no tema das migrações no continente, o Brasil é o único país da América do Sul que ainda não garante direitos devotar e ser votado aos imigrantes em nenhuma instancia: municipal, distrital, estadual ou nacional. Em todos os outros países do continente imigrantes têm direito a participação eleitoral em um ou mais níveis. No Uruguai e no Chile há garantia, inclusive, do direito de voto em presidente da República.
Considerando que no Brasil vivem cerca de 1,7 milhões de imigrantes, o que corresponde ao eleitorado do Distrito Federal ou do estado do Mato Grosso do Sul, é muito importante que a temática esteja presente no debate eleitoral e explicitado nos programas de governo dos candidatos a presidência. Nesse sentido, uma busca no site do TSE permite conhecer o que cada coligação apresentou nos seus programas de governo, resumidos abaixo.
Álvaro Dias (Podemos): Não há menção
Cabo Daciolo (Patriota): Não há menção
Ciro Gomes (PDT): Menciona brevemente proteger população vulnerável (LGBTI) em situação de refúgio (p. 51)
Eymael (DC): Não há menção
Geraldo Alckmin (PSDB): Não há menção
Guilherme Boulos (PSOL): Discorre sobre proteger população vulnerável, incluindo refugiados, sob Centros de Referência Especializados de Assistência Social (p. 153)
Na parte de Relações Internacionais (XIX), explicita política própria para refugiados: Promover a proteção aos refugiados e a garantia dos direitos humanos de migrantes, incluindo a sua não criminalização e a integração social, por meio da regularização migratória e do amplo acesso a direitos. Estes são garantidos no Brasil pela nova Lei de Migração, Lei Nº 13.445 de 2017 (p. 227)
Henrique Meirelles (MDB): Não há menção
Jair Bolsonaro (PSL): Tangencia de leve o tema imigração ao mencionar facilitar a imigração de famílias de médicos cubanos participantes do programa Mais Médicos (p. 40).
João Amoêdo (NOVO): Menciona brevemente a atração de imigrantes qualificados por facilitar a revalidação de diploma de estrangeiros que queiram trabalhar no Brasil (p. 23).
João Goulart Filho (PPL): Não há menção
Fernando Haddad (PT): Política explícita para imigrantes e refugiados:
O compromisso com os direitos humanos não deixará ninguém para trás. O governo implementará políticas voltadas para todos os segmentos socais. Será promovido o direito dos migrantes por meio de uma Política Nacional de Migrações e reconhecerá, de forma ampla, os direitos de refugiados. Além disso, serão implementadas políticas intersetoriais para a população em situação de rua (p. 18)
Menciona brevemente estender programas sociais a imigrantes e refugiados:
Serão implantadas ações voltadas para a saúde das mulheres, pessoas negras, LGBTI+, idosos, crianças, juventudes, pessoas com deficiência, população em situação de rua, população priva- da de liberdade, imigrantes, refugiados e povos do campo, das águas e das florestas (p. 24);
O governo criará o Programa Emergencial de Emprego (...) fortalecendo a proteção social às pessoas idosas, crianças e adolescentes, jovens, mulheres, pessoas com deficiência, povos tradicionais e indígenas, população em situação de rua, migrantes, entre outros. (p. 26)
Marina Silva (REDE): Não há menção
Vera (PSTU): Defende política de conceder documentos que permitem aos imigrantes trabalharem:
Documentos para os trabalhadores imigrantes e direitos iguais aos dos trabalhadores brasileiros. (p. 4)
Embora alguns candidatos mencionem em seus programas de governo ações inclusivas envolvendo as migrações a visão do imigrante como sujeito de direitos ainda continua vaga e é um tema a ser aprofundado. A Cidade de São Paulo desde 2013 vem construindo uma política com participação da população migrante. Eles participam ativamente dos processos de discussão e de participação, inclusive do Conselho Municipal de Migrantes da Cidade, colegiado instituído pela Lei Municipal 16478/2016 e seus representantes eleitos pelo voto imigrante. Talvez esse seja o caminho a trilhar e quem sabe nos próximos 4 anos o Brasil reconheça esse direito universal aos brasileiros e brasileiras de todo o mundo.
* Paulo Illes, ativista e ex-coordenador de políticas para migrantes da Prefeitura de São Paulo, cursou filosofia na Faculdade Vicentina de Filosofia de Curitiba/PR
** Anna Paula Ferrari Matos, mestranda em Relações Internacionais pelo IRI- USP e membra do ProMigra