PABLO MILANÉS

Pablo Milanés, a voz da revolução cubana – por Marco Piva

Movimento musical dos anos 1970, Nova Trova Cubana uniu romantismo com engajamento político

Pablo Milanés.Créditos: Redes Sociais
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Por Marco Piva*

Existem artistas que não morrem. Alguns deixam uma obra que pode ser lembrada por um tempo. Outros ultrapassam as fronteiras da vida para legar uma obra que permanecerá por muito tempo. Este é o caso de Pablo Milanés, que morreu em Madri, aos 79 anos. Ao lado de Silvio Rodriguez, ganhou destaque no cenário musical internacional, conquistando dois prêmios Grammy e uma legião de fãs. A trajetória da dupla coincide com um momento especial da revolução liderada por Fidel Castro onde canções de amor e luta resultaram no movimento que ficou conhecido como a Nova Trova Cubana.

As músicas de Pablo percorreram a América Latina e se tornaram verdadeiros hinos no contexto das batalhas contra a opressão e a desigualdade social. Mas, não são apenas músicas revolucionárias como a famosa “Canción por la unidad latino-americana”, que ganhou versão em português nas vozes de Chico Buarque e Milton Nascimento. O romantismo e as feridas amorosas também seguem um padrão irretocável em melodia e poesia. “Yolanda” é um exemplo acabado dessa simbiose.

Conheci Pablo Milanés em 1982, em Manágua, durante o Festival Internacional da Canção pela Paz, evento que contou com a participação de grandes artistas latino-americanos como Chico Buarque, Fagner, Daniel Viglietti e Mercedes Sosa. Da entrevista que me concedeu, lembro do carinho com que falou da música popular brasileira, uma “inspiração permanente”. Falou de sua parceria com Chico e Milton Nascimento e de sua trajetória que nem sempre foi entendida pelo regime. Esteve preso quase dois anos no final dos anos 60 porque, segundo ele, “era um rebelde sem causa”.

Após a prisão, passou a ver com outros olhos o processo revolucionário e firmou um compromisso de vida com o seu país. Apresentações na televisão cubana o aproximaram do grande público e a parceria com Silvio Rodriguez ensejaram um dos principais movimentos musicais de um país marcado exatamente pela qualidade de seus artistas.

Foram mais de 40 álbuns que renderam a Pablo o reconhecimento internacional de um pop star. Foi quase profético quando lançou “Yo pisaré las calles nuevamente” meses após a derrubada e morte do presidente chileno Salvador Allende. Ele chegou a ver a eleição de Gabriel Boric e a saudação que o novo mandatário fez à estátua de Allende, erguida na frente do Palácio La Moneda. Nesse momento, chorou.

As canções de amor e luta de Pablo Milanés foram entoadas por milhões de pessoas. Cada verso e cada nota deixam hoje um amargo sabor de tristeza por sua morte e, ao mesmo tempo, uma imensa certeza que jamais serão apagadas de nossas memórias e histórias.

*Marco Piva é jornalista e apresentador do programa Brasil Latino, na Rádio USP FM 93,7. Integra o grupo de pesquisadores do Centro de Estudos Latino-americanos sobre Cultura e Comunicação da Universidade de São Paulo CELACC-USP).