Um artigo publicado no periódico Humanities and Social Sciences Communications revela algo inusitado sobre as mulheres da Idade Média no Ocidente Latino, isto é, em partes da Europa dominadas pela Igreja Católica Romana, entre os anos 400 d.C. e 1500 d.C.
Durante esse período, muitos anos antes da invenção da prensa por Gutenberg (no século 15), manuscritos eram a principal forma de produzir e disseminar informação, e, se o número de letrados era baixo na Idade Média europeia, o número de mulheres letradas era menor ainda.
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O estudo sugere que, dos cerca de 10 milhões de manuscritos produzidos nesse período, pelo menos 1,1% foram escritos por mulheres.
Isso corresponde a um número aproximado de 110.000 manuscrito. No entanto, acredita-se que esse número seja subestimado. Há tanto uma falha nas buscas por esse tipo de evidência quanto uma dificuldade inerente em identificar contribuições femininas nos escritos ao longo do tempo, diz o artigo, e elas são frequentemente esquecidas ou "passadas por cima" por pesquisadores.
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As descobertas recentes baseadas em análises conduzidas por pesquisadores da Universidade de Bergen, na Noruega, basearam-se na análise de colofões — inscrições semelhantes a assinaturas — em manuscritos que traziam data e local de registro indicados por quem os copiou.
"Eu, filha de Birgitta Sigfurs, freira no mosteiro Munkeliv em Bergen, escrevi este saltério [livro de orações] com iniciais, embora não tão bem quanto deveria. Reze por mim, uma pecadora", escreveu uma dessas "copiadoras" ao fim de um manuscrito encontrado em Bergen.
Dos 23.774 colofões analisados — registros no final dos manuscritos que trazem informações sobre sua redação —, extraídos de um catálogo beneditino (800-1626 d.C.), pelo menos 254 (1,1%) foram identificados como escritos por mulheres. Estima-se, ainda, que pelo menos 8.000 manuscritos (escritos por mulheres) ainda existam na Europa.
Outro dado avaliado pela pesquisa sugere que a presença de mulheres no ofício de transcrever manuscritos aumentou significativamente por volta de 1400 d.C., provavelmente devido ao aumento da demanda por livros em línguas vernáculas.
"Nossa investigação sugere que há comunidades de mulheres 'copiadoras' ainda não identificadas, ou, no mínimo, que deve ter havido muito mais escribas do que o que foi contabilizado até agora", diz o estudo, intitulado "Quantos manuscritos medievais e modernos foram copiados por escribas mulheres? Uma análise bibliométrica baseada em colofões".
Em um dos manuscritos avaliados, uma ilustração medieval feita de sua copiadora, uma mulher chamada Guda, está presente na carta que ela escreveu, tendo escrito ao final da página: "Guda peccatrix mulier scripsit et pinxit hunc librum", traduzido do latim como: "Guda, uma pecadora, escreveu e pintou este livro".