Ailton Krenak tomou posse na Academia Brasileira de Letras (ABL) nesta sexta-feira (5) após cerimônia que ocorreu na sede da instituição no Rio de Janeiro. O primeiro indígena a entrar na ABL ficará na Cadeira 5, que era ocupada por José Murilo de Carvalho até agosto do último ano, quando veio a falecer.
Eleito por 23 votos, concorreu ao lugar de prestígio com Daniel Munduruku, que também é indígena, e com a historiadora Mary del Priore. Após a cerimônia, Krenak falou com a imprensa e reiterou sua missão de dar mais voz e espaço para as línguas indígenas.
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"Espero que o Brasil inteiro, os outros brasileiros, possam entender que nós estamos virando uma página da relação da ABL com os povos originários. Eu já disse que venho para cá para trazer línguas nativas do Brasil para um ambiente que faz a expansão da lusofonia. A Academia Brasileira de Letras é portuguesa, e eu trago para cá as línguas indígenas e acho que isso faz uma diferença muito grande para a história do Brasil," declarou.
O novo membro da ABL foi muito comemorado pelos colegas. Um deles, o cantor e compositor Gilberto Gil, comentou sua alegria em receber Krenak aos meios de comunicação.
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“Significa muita coisa. Muito singelamente é o fato de que um homem muito interessante, de uma origem muito especial e muito importante para a redenção da vida brasileira, está chegando a uma casa que é consagrada. A casa da literatura. Mas é muito mais do que isso”, comemorou.
Nascido em 1953 em Minas Gerais, Krenak é ambientalista, filósofo, poeta e defensor dos povos indígenas. Foi um dos fundadores da Aliança dos Povos da Floresta e da União de Nações Indígenas, históricas organizações de direitos e luta por demarcação de terras.
Na Assembleia Constituinte, em 1987, foi uma figura central na defesa dos direitos indígenas. Não por acaso, nos anos que seguiram a promulgação da Constituição de 1988 a maioria das terras indígenas, sobretudo aquelas de grande extensão territorial, foram demarcadas. Ele vive na Terra Indígena Krenak, próxima a Resplendor (MG)
Krenak também é doutor honoris causa pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Entre os seus livros mais famosos estão “Ideias para Adiar o Fim do Mundo” (Companhia das Letras, 2019), “O amanhã não está à venda” (2020) e “A vida não é útil” (2020).
O pensador também é um profundo crítico do modo de vida que está levando a humanidade para o abismo. Confira um trecho de sua entrevista ao Roda Viva em 2021.
“O abismo cognitivo foi instalado quando todos nós vimos que as coisas podem ser reproduzidas em série e que a caixinha do leite ou qualquer outro produto que está na gôndola do supermercado. Aquela coisa apareceu ali (...) e não importa mais o processo. Então a caixinha de leite e toda essa facilidade da gôndola seriam coisas que aparecem na sua cara e você pode simplesmente consumir. É isso que o Davi Kopenawa Yanomami, nessa sua prospecção do mundo do branco que ele olha de dentro da floresta, dirá que é o ‘mundo da mercadoria’. Vamos imaginar que esse mundo da mercadoria é mágico. Ele faz aparecer água na torneira, leite na caixinha e coisas na gôndola. Quer dizer, é um pensamento mágico o desse mundo subalterno à ordem capitalista. É tão mágico quanto o pensamento de um xamã. O pensamento mágico de um escravo do capitalismo é tão fantástico que ele acredita que o capitalismo pode acabar com o mundo e criar outro. Eu me pergunto: por que um cara vai financiar o envio de um foguete para o espaço? (…) Perdemos a prioridade. Nesse mundo mágico do capitalismo, tudo pode. A Terra, inclusive, se acabar tem outra."