MEMÓRIA

"Os Quatro da Candelária", da Netflix, faz duro retrato sobre uma tragédia sem fim

A produção narra a história a partir do ponto de vista dos adolescentes e crianças que viviam nos arredores da igreja localizada no centro do Rio

"Os Quatro da Candelária", da Netflix, faz duro retrato sobre uma tragédia sem fim.Créditos: Divulgação / Netflix
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Recém-estreou na Netflix a minissérie "Os Quatro da Candelária" (2024), que foi escrita e dirigida por Luís Lomenha e que, como indica o título, narra, a partir do ponto de vista das crianças e adolescentes que viviam no entorno da igreja localizada no centro do Rio, a chacina da Candelária, ocorrida na madrugada do dia 23 de julho de 1993, quando seis menores e dois jovens foram assassinados por milicianos.

Dessa maneira, a série relata as 36 horas que antecederam a chacina da Candelária a partir do dia a dia de quatro amigos que vivem na Candelária: Jesus (Andrei Marques), Douglas (Samuel Silva), Sete (Patrick Congo) e Pipoca (Wendy Queiroz).

Cada episódio da minissérie da Netflix é dedicado a um dos personagens: no primeiro, acompanhamos a trajetória de Douglas, que tenta dar um enterro decente para seu pai. Aqui, é preciso destacar a atuação espetacular do jovem ator Samuel Silva. Anotem esse nome.

Posteriormente, acompanhamos Sete (Patrick Congo), adolescente que busca viver sua sexualidade livremente e se envolve com um homem mais velho e casado, interpretado por Bruno Gagliasso. Em seguida, acompanhamos as desventuras de Pipoca, que é abandonada pela mãe, e de Jesus, que busca vingança.

A partir desse mosaico composto por adolescentes que vivem nos arredores da Igreja da Candelária, o roteiro de Luís Lomenha busca mergulhar nos sonhos e desejos daquelas crianças que viviam nas ruas da cidade, mas que também representam tantas outras até hoje nas grandes capitais brasileiras.

A estreia de "Os Quatro da Candelária" se deu no mesmo dia em que os assassinos de Marielle Franco e Anderson foram condenados. Indiretamente, essas duas tragédias se conectam: ocorreram na mesma cidade — Rio de Janeiro — e pelas mãos dos mesmos personagens — milícia.

Um dos pontos altos da série "Os Quatro da Candelária" é não tratar a trágica noite de 1993 como um evento isolado, mas sim colocá-la como mais um episódio de uma sequência que se desenrola desde o tempo colonial, quando pessoas negras eram escravizadas no Brasil. De maneira acertada, Luís Lomenha conecta esses dois períodos e nos mostra que ainda hoje a estrutura colonial busca ceifar vidas e sonhos da juventude negra.

Além da conexão com o período colonial, “Os Quatro da Candelária” também está inserido na tragédia cotidiana em que crianças são mortas dentro de casa por balas disparadas pela polícia, tráfico e milícia. Em 2023, mais de 25 crianças morreram vítimas de bala perdida. A nova série da Netflix é um retrato, às vezes lírico, mas sempre duro e triste, sobre uma tragédia sem fim.