O novo livro do neurocientista Sidarta Ribeiro, "As flores do bem", publicado pela Fósforo Editora, é uma poderosa obra acerca da cannabis e da desinformação em torno da planta. Ribeiro chama o livro de uma "reflexão autobiográfica", apresentando uma ampla e bem fundamentada discussão sobre os benefícios da cannabis.
O livro começa com um breve histórico do cultivo da cannabis, que remonta a pelo menos 12 mil anos na China, onde ele destaca a importância da cannabis para diversas culturas ao longo da história, tanto como planta medicinal quanto como fonte de alimento e fibra.
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Em seguida, Ribeiro aborda a política de combate às drogas, que ele considera um fracasso. A proibição da cannabis seria baseada em preconceitos e desinformação, de acordo com o texto, e assim, o autor defende a regulamentação da planta para fim medicinal.
Neurocientista e biólogo, pós-doutor em neurofisiologia pela Universidade Duke e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Ribeiro é conhecido por seu livro "O oráculo da noite", que trata dos mistérios que envolvem os sonhos humanos. Já em seu novo livro, "As flores do bem", o uso da maconha é o tema principal tratado por ele.
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Previsto para chegar às livrarias amanhã, 7 de novembro, o livro explora os últimos avanços em relação aos usos da planta para tratamento de ansiedade, depressão, Parkinson e Alzheimer. Em entrevista ao jornal O Globo, o escritor pontuou que “a guerra das drogas na verdade é uma engrenagem ideológica de uma guerra contra os negros e os pobres” e que declarar “guerra às drogas não conseguiu reduzir o consumo nem mitigar o crescimento de facções criminosas.”
Um dos pontos destacados por Sidarta no livro é de que a planta fica mais perigosa se ela for proibida. "Uma pessoa não morre de overdose de maconha, isso não existe. A maconha não é veneno, é remédio, ressalvando os casos em que há grupo de risco. Já a guerra às drogas mata potencialmente qualquer um. A Ágatha Félix (menina de 8 anos atingida por um tiro de fuzil de PM numa favela do Rio em 2019) foi morta indo para a escola numa kombi, ao lado da mãe. E qual é a justificativa? Do que a sociedade está sendo protegida? É o contrário, há uma desproteção gigantesca em várias dimensões.”
Segundo ele, “o direito que a polícia tem de matar uma pessoa desde que ela seja chamada de traficante é o mesmo direito que os EUA tiveram de financiar e organizar operações militares na Colômbia ao longo de décadas.”
‘Ponto de virada’
Sidarta aponta que há dez anos, havia uma maioria consolidada contra a cannabis em qualquer forma, independentemente da finalidade. “Hoje a gente está nesse momento estranho em que cerca de 75% das pessoas, segundo a última pesquisa do Datafolha, são a favor da cannabis medicinal e são contra a recreativa.”
O biólogo acredita que o estigma contra a cannabis vai reduzir se mais pessoas entenderem que a planta ajuda a combater várias situações.”Mas, se mais gente entender que maconha é um excelente remédio para um monte de coisas, o preconceito vai diminuir. E aí o que resta? Eu acho que é muita culpa cristã. Por que eu posso usar para mitigar uma dor ou uma inflamação, mas não posso usar para ouvir música? Essa distinção é artificial.”
Aconselha para adultos e desaconselha para jovens
Ribeiro afirmou que o uso abusivo de maconha pode favorecer a síndrome amotivacional, que é uma condição caracterizada pela perda de motivação, interesse e entusiasmo. Essa síndrome pode prejudicar o desempenho acadêmico dos jovens. "Então jovens devem evitar a maconha, com exceção de casos de recomendação médica. Da mesma forma como devem se abster do consumo de álcool e da nicotina", disse.
Comparações entre o governo Bolsonaro e Lula
O escritor lembra que no governo Bolsonaro, o Brasil foi um grande importador de insumos de cannabis, quando poderia estar exportando. No governo Lula, por outro lado, é mais aberto ao setor.
No entanto, há um risco de que as associações de cultivadores clandestinos sejam prejudicadas na tramitação do PL 399, projeto que trata da comercialização de medicamentos à base de cannabis. “Temos que lembrar que foram os cultivadores clandestinos que, em ato de solidariedade, ofereceram remédio a preço de custo ou grátis para crianças epilépticas e com outros quadros nos últimos dez anos.”, coloca Ribeiro.
“Então a gente precisa de um mercado diverso, com microempresas e startups.” De acordo com o neurocientista, as periferias também devem participar desse mercado, visto que foram elas que pagaram o preço da guerra às drogas.