INÉDITO

Conceição Evaristo lançará releitura de 'A Hora da Estrela', de Clarice Lispector

Macabéa ganha nova história, agora sob o olhar de uma das maiores autoras negras do país

Conceição Evaristo ganhou prêmio Juca Pato Intelectual do Ano em 2023.Créditos: Divulgação
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Conceição Evaristo está prestes a lançar sua interpretação de uma das obras-primas da literatura brasileira: "A Hora da Estrela”. Previsto para ser apresentado pela Oficina Raquel durante a Festa Literária Internacional de Paraty no final de novembro, "Macabéa: Flor de Mulungu" é uma narrativa que focaliza a mesma protagonista marcante de Clarice Lispector, mas agora sob a perspectiva de uma das maiores autoras negras do país.

Em 2012, a autora mineira integrou um projeto de reinterpretação da obra de Clarice Lispector. Doze escritores elaboraram contos à convite da editora Oficina Raquel, os quais foram compilados no livro "Clarice Lispector: personagens reescritos", lançado pela editora naquele ano. 

A coletânea já teve todas as cópias vendidas, no entanto, este ano, Evaristo revisitou e recriou seu texto sobre Macabéa, a protagonista de "A hora da estrela" para ampliar e dar um novo olhar sobre o conto original. Produzido com ilustrações de Luciana Nabuco, a obra reconstrói de maneira crítica a narrativa de Macabéa, uma mulher carregada de dor e profundamente afetada pelo ato de ser silenciada.

Conforme expresso por Evaristo, a personagem é descrita como "uma das criações mais provocativas de Clarice". "Ela exibe uma certa serenidade perante a vida, então meu objetivo era conceber uma Macabéa mais dinâmica, que se tornasse uma força geradora de vida."

Ilustração de Luciana Nabuco, da obra de 2012. Créditos: Divulgação

Primeira mulher negra a receber o prêmio Juca Pato

Conceição recebeu a premiação pelo livro “Canção para ninar menino grande”, que discute as contradições e complexidades em torno da masculinidade de homens negros e os efeitos nas relações com mulheres negras. “Um mosaico afetuoso de experiências negras”, é como se definiu o livro que levou a autora a ganhar o prêmio Juca Pato como Intelectual do Ano em setembro.

“À personalidade que, havendo publicado livro no Brasil no ano anterior, tenha se destacado, pelo conjunto da sua obra, em qualquer área do conhecimento e contribuído para o desenvolvimento e prestígio do País, na defesa dos valores democráticos”, definiu União Brasileira de Escritores em São Paulo, que concedeu o prêmio à escritora.

Mineira de Belo Horizonte, Conceição nasceu em 1946 e trabalhou como empregada doméstica grande parte de sua vida. É nos anos 1970 que ela ingressa no mundo literário, quando se muda para o Rio de Janeiro e se torna doutora em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense

É consagrada como uma das escritoras brasileiras mais importantes e foi a criadora do conceito de “escrevivência”, estilo de escrita inspirado na realidade das pessoas. Com esse diferencial, ela aborda e reflete em suas obras de forma profunda o racismo e o machismo na sociedade.

“Na verdade, tudo que eu escrevo, romances, poemas, contos e também ensaios, é profundamente marcado pela condição de mulher negra. Não há como me desvencilhar disso, mesmo quando invento uma história. Dizem que o que marca a autoria negra é o ponto de vista do texto. No entanto, o ponto de vista não é matéria espontânea. Há um sujeito autoral responsável por esse ponto de vista. O sujeito que vive em uma sociedade racista, classista e machista. E essa herança histórica sempre está presente na minha escrita. Antes, até sem querer. Mas, de alguns anos para cá, de forma proposital, consequência de um projeto literário”, destacou Conceição em entrevista à Fórum em 2017.