INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

IA: Senado aprova regulamentação, mas "há pontos que precisam ser revistos”, analisa especialista

Principal controvérsia gira em torno da exclusão das big techs de sistemas de alto risco

PL de regulamentação das Inteligências Artificias é aprovado no Senado.Créditos: Matheus Bertelli/Pexels
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O Senado Federal, em sessão realizada nesta terça-feira (10), aprovou um marco regulatório histórico para a inteligência artificial (IA) no Brasil, o PL 2338/2023. A proposta, que agora segue para análise da Câmara dos Deputados, estabelece um conjunto de normas para o desenvolvimento e utilização de sistemas de IA em todo o território nacional. 

O projeto, apresentado em 2023 pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), integra as prioridades que o parlamentar buscou aprovar antes do término de seu mandato à frente da Presidência da Casa, previsto para fevereiro. A matéria teve relatoria do senador Eduardo Gomes (PL-TO).

Como mostrou a Fórum, organizações da sociedade civil, representada por mais de 30 conjuntos da Coalizão Direitos na Rede, alertaram para a necessidade de aprimoramentos urgentes no texto na última sexta-feira (29). As entidades sinalizaram que a versão atual do projeto continha retrocessos que podiam comprometer a proteção dos direitos dos cidadãos no ambiente digital.

Com a aprovação, a principal divergência ocorre justamente em relação à classificação de algoritmos de redes sociais como sistemas de alto risco, uma das partes mais importantes do projeto e enfatizada pelas entidades. As big techs ou gigantes da tecnologia, como Google, Microsoft e Meta, ficaram de fora da categoria e agora o lobby será favorecido

De acordo com Edgard Piccino, analista de dados da Fórum, o PL traz pontos que precisam ser revistos, principalmente quanto à exclusão das empresas de tecnologia dessa classificação. “Essa abordagem é equivocada, porque o que deve definir o risco é a natureza da atividade, não o porte da empresa. Afinal, operações realizadas por gigantes da tecnologia podem ter impactos ainda mais amplos e potencialmente perigosos para a sociedade”, afirma.

A mesma categoria ainda permite regulamentar a identificação biométrica à distância, em tempo real, em locais públicos, o que pode ser bastante problemático, já que, segundo o analista, abre brechas para o racismo algorítmico.

“Sistemas de IA treinados com dados enviesados podem conter discriminações implícitas, comprometendo a imparcialidade que deveria nortear decisões automatizadas. Além disso, a permissão para a ausência de supervisão humana em certos contextos é um risco grave”, acrescenta Piccino.

“Abre uma brecha perigosa para que decisões cruciais, como o atendimento emergencial do SAMU, dos bombeiros ou até a seleção em vestibulares, sejam entregues totalmente a sistemas que, por mais avançados que sejam, podem falhar e impactar diretamente a vida das pessoas”

Alguns pontos importantes aprovados:

IA generativa

Normas específicas foram definidas para sistemas de inteligência artificial generativos e de propósito geral. Antes de sua comercialização, vai ser obrigatório que os responsáveis realizem uma avaliação preliminar para determinar a classificação de risco. 

Esses sistemas devem demonstrar que medidas foram tomadas para mitigar possíveis impactos sobre direitos fundamentais, o meio ambiente, a liberdade de expressão, a integridade das informações e o processo democrático. Além disso, é necessário que sejam concebidos com foco na eficiência energética, no uso sustentável de recursos e na redução de resíduos. O processamento de dados deverá seguir padrões legais estabelecidos.

A produção ou alteração de textos, imagens, vídeos e áudios por IA deverá ser acompanhada de identificadores — como metadados — que permitam verificar sua origem e autenticidade. A regulamentação dessas práticas será desenvolvida em conjunto com atores da iniciativa privada, do meio acadêmico e da sociedade civil.

Direito Autoral

Artistas participaram nesta terça-feira de uma reunião no Senado com o presidente Rodrigo Pacheco e o senador Eduardo Gomes, relator do texto. Entre os presentes estavam o ator Paulo Betti, os músicos Otto, Paula Lima, Marina Sena e Paula Fernandes, além da produtora cultural Paula Lavigne.

Artistas defenderam, em reunião, a inclusão do direito autoral na proposta, garantindo remuneração justa para os criadores quando suas obras forem utilizadas por plataformas digitais. O pleito foi atendido, e o texto aprovado no Senado mantém essa proteção.

"Ninguém está aqui lutando contra a inteligência artificial, porque a inteligência artificial a gente entende como uma tecnologia que veio também para trazer progresso. Mas a gente entende que, se há empresas ganhando bilhões com isso, essas empresas precisam arcar com as consequências e precisam arcar com essa mineração de dados que fazem com a nossa obra, com a nossa vida. E não só a nossa vida, mas a vida de toda a população brasileira", comentou Marina Sena.

As garantias aprovadas incluem:

  • Identificação no treinamento de IA: Empresas de tecnologia deverão informar previamente os conteúdos protegidos por direitos autorais usados no treinamento de seus sistemas.
  • Controle pelos autores: Os criadores poderão impedir o uso de suas obras, caso desejem.
  • Ambiente de negociação: Um espaço será criado pelo órgão regulador da IA para que empresas e autores possam negociar pagamentos.
  • Liberação coletiva ou individual: Os autores poderão liberar o uso de suas obras de forma direta ou por meio de associações de titulares de direitos. A remuneração levará em conta fatores como o porte econômico da empresa, a frequência de uso do conteúdo e os impactos sobre a concorrência.
  • Uso permitido para pesquisa: Conteúdos protegidos poderão ser usados em pesquisas e no desenvolvimento de IA por instituições acadêmicas, culturais e educacionais, desde que não sejam comercializados nem concorram com a obra original. O direito autoral é garantido como cláusula pétrea da Constituição.
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