Um levantamento inédito mostra quais as habilidades digitais dos usuários de internet no Brasil. A investigação, independentemente do dispositivo utilizado para acesso à rede, revela que mais da metade (51%) das pessoas entrevistadas disse ter buscado verificar se uma informação que encontrou no ambiente online era verdadeira. A porcentagem caiu quando a pergunta foi direcionada aos que acessavam a rede somente pelo celular (37%), e ela foi maior entre os que se conectavam por múltiplos dispositivos – tanto pelo computador quanto por celular (74%).
A pesquisa também conclui que a maioria dos usuários de internet brasileiros (62%) acessa a rede exclusivamente pelo celular, realidade de mais de 92 milhões de indivíduos. A conclusão é da TIC Domicílios 2022, lançada nesta terça-feira (16) pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).
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A nova edição da pesquisa, realizada pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), revela que o uso da internet apenas pelo telefone celular predomina entre as mulheres (64%), entre pretos (63%) e pardos (67%), e entre aqueles pertencentes às classes D e E (84%).
Situação semelhante ocorreu quando os entrevistados foram indagados se adotaram medidas de segurança, como senhas fortes ou verificação em duas etapas, para proteger dispositivos e contas: apenas 33% dos que acessam a rede exclusivamente pelo celular adotaram essas medidas, enquanto entre os usuários que acessam por múltiplos dispositivos a proporção foi de 69%.
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Não basta conectar as pessoas
À Revista Fórum, a coordenadora do CGI.br., Renata Mielli, destacou que a comprovação de que a maioria dos brasileiros, principalmente das camadas D e E, acessa a internet exclusivamente pelo dispositivo móvel, mostra que essas usuários não conseguem checar as informações que recebe.
Renata observa que o modelo de acesso feito por meio de celular pré-pago limita o acesso das pessoas à internet que acaba restrito às plataformas. Ela pontua que a grande importância é revelar no Brasil um conceito importante que tem sido trabalhado internacionalmente que é a questão não apenas do acesso à internet e o debate de universalização do acesso, mas a questão do acesso significativo.
"Não basta conectar as pessoas, essa conexão tem que ter qualidade não só na conexão, mas nos dispositivos usados para as pessoas acessarem, que têm que permitir o bom uso da internet para os mais variados fins. O que a pesquisa mostra é que o Brasil precisa avançar muito no que diz respeito às questões que envolvem o acesso significativo à internet. Essa é uma dimensão fundamental da panorâmica que pode resultar, inclusive, na perspectiva de políticas públicas. Nós precisamos ir para além de apenas conectar", comenta Renata.
Privacidade na navegação
A pesquisa também investiga a alteração das configurações de privacidade em dispositivos, contas ou aplicativos para limitar o compartilhamento de dados pessoais (citada por 23% dos que usam apenas o telefone celular, e por 57% dos usuários de múltiplos dispositivos) e a criação de programas de computador ou aplicativos de celular usando linguagem de programação (3% e 7%, respectivamente).
"Nessa edição, o indicador de habilidades digitais foi aplicado para o conjunto dos usuários de Internet no país. Os dados indicam que aqueles que acessam a rede pelo computador reportam essas habilidades em maiores proporções do que os que utilizam unicamente o celular. Uma conectividade significativa – que permita que os usuários obtenham um melhor proveito da internet – não depende apenas de uma boa conexão à rede, mas também da qualidade dos dispositivos”, enfatiza Alexandre Barbosa, gerente do Cetic.br|NIC.br.
Enquanto a conexão via computador se manteve estável (38%) em relação à edição anterior do estudo, o uso da televisão para acessar à internet segue com viés de alta, passando de 50% para 55% entre 2021 e 2022. Os aparelhos de televisão continuam como o segundo dispositivo mais utilizado para acessar a rede no país, atrás apenas do celular (99%).
Desafios de conectividade
Dos 149 milhões de usuários de internet no território nacional, 142 milhões se conectam todos, ou quase todos os dias – com prevalência nas classes A (93%) e B (91%) e em menores proporções nas C (81%) e D e E (60%). No outro extremo, 36 milhões de brasileiros não são usuários da rede. Esse grupo é maior entre habitantes de áreas urbanas (29 milhões); com grau de instrução até o Ensino Fundamental (29 milhões); pretos e pardos (21 milhões); das classes D e E (19 milhões); e com 60 anos ou mais (18 milhões).
Entre os principais motivos apontados por aqueles que nunca acessaram a internet, a falta de interesse (35%) e a falta de habilidade com computador (26%) foram os mais citados. Ao considerar somente a classe A, a “falta de interesse” salta para 90%. Já a “falta de habilidade” aumenta quando o recorte é feito na faixa etária de 35 a 44 anos, passando para 45%.
“A pesquisa aponta que houve um avanço relevante no uso da rede no primeiro ano da pandemia Covid-19, mas o indicador voltou a se estabilizar em 2022. O Brasil ainda tem um caminho importante a percorrer na universalização do acesso, adotando estratégias específicas para a inclusão digital das populações mais vulneráveis”, avalia Barbosa.
Acesso nos domicílios
A presença de internet nos domicílios também ficou estável entre 2021 e 2022, alcançando 60 milhões de lares brasileiros, o que corresponde a 80% do total de domicílios no país. Verificou-se estabilidade na presença de conexão nas residências das áreas urbanas (82%) e rurais (68%) e em todos os estratos sociais analisados: classe A (100% dos domicílios conectados), B (97%), C (87%) e D e E (60%).
Cabo ou fibra óptica segue como o principal tipo de conexão no Brasil, presente em 38 milhões dos domicílios, sobretudo, naqueles da região sul, onde 72% dos lares adotam essa tecnologia. Por outro lado, a região Norte possui a maior proporção de domicílios cuja principal conexão é pela rede móvel 3G ou 4G (27%).
Entre os domicílios conectados, 16% compartilham a conexão com o domicílio vizinho. Essa situação é mais comum nas áreas rurais (27%), no Norte (21%) e no Nordeste (22%) do Brasil e nas classes C (16%) e DE (25%).
“Observamos que um maior compartilhamento da conexão ocorre entre os estratos onde também é maior a proporção de domicílios sem acesso à internet, indicando a existência de barreiras à conectividade”, analisa Fabio Storino, coordenador da pesquisa.
Já no caso dos domicílios sem acesso à rede, o preço do serviço, a exemplo do verificado ao longo da série histórica da pesquisa, foi apontado pelos entrevistados como principal motivo (28%) para a não conexão, seguido pela falta de habilidade (26%) e falta de interesse (16%).
Comércio eletrônico
A atual edição da TIC Domicílios divulgou também os resultados do módulo de comércio eletrônico, que havia sido aplicado pela última vez na pesquisa de 2018. O estudo mostrou que 67 milhões de usuários de internet compraram online produtos e serviços em 2022. A atividade se manteve em alta, mesmo após o fim das medidas de distanciamento social impostas pela pandemia.
“Com a crise sanitária provocada pelo novo coronavírus e o consequente isolamento social, houve um incremento da proporção de pessoas que compram online, proporção essa que se manteve em 2022. Observou-se também uma ampliação dos tipos de produtos comprados pela Internet, revelando uma mudança no perfil do comércio eletrônico do país nos últimos anos”, afirma Storino.
Na comparação com 2018, a categoria de roupas, calçados e materiais esportivos destacou-se em compras online, sendo citada por 64% dos que adquiriram pela internet em 2022, proporção que era de 49% em 2018. Na sequência, aparecem produtos para a casa e eletrodomésticos (de 45% para 54%) e comidas e produtos alimentícios (avanço de 21% para 44%).
Em relação aos serviços realizados online, os que mais cresceram no período foram: pedir táxi ou motoristas em aplicativos (de 32% para 40%); pagar por filmes ou séries na internet (de 28% para 38%); e fazer pedidos de refeições em sites ou aplicativos (de 12% para 33%).
A forma de pagamento mais usada nas compras no ambiente digital em 2022 foi o cartão de crédito (73%). O Pix, lançado no final de 2020 e medido pela primeira vez pela pesquisa, ficou em segundo lugar (66%).
“Apesar de ser um meio de pagamento mais novo, o Pix foi usado por 44 milhões de brasileiros nas compras online, incluindo 23 milhões da classe C e 5 milhões das classes D e E”, comenta Storino.
Atividades online
Mais da metade (51%) dos entrevistados fez consultas, pagamentos ou outras transações financeiras na internet em 2022, um aumento de 5 pontos percentuais em relação ao ano anterior (46%), ocorrido sobretudo entre os usuários das classes C (de 45% para 51%) e D e E (de 21% para 26%). Usuários das classes A (90%) e B (73%) seguem realizando essa atividade em maiores proporções.
Em relação as atividades multimídia, assistir a vídeos, programas, filmes ou séries online foi a mais prevalente (80% em 2022 contra 73% em 2021). Em todas as atividades multimídia investigadas, observou-se uma maior proporção de realização entre usuários homens do que entre mulheres, sendo as maiores diferenças relativas a jogar online (realizado por 45% dos homens e por 30% das mulheres) e a escutar podcast (38% e 25%, respectivamente).
Já a proporção dos que postaram na internet conteúdos de sua autoria (textos, imagens ou vídeos) saltou de 31% (2021) para 43% (2022).
“Assistimos em 2022 a uma explosão de postagens curtas e rápidas, facilitadas por aplicativos de redes sociais e mensagens instantâneas e estimuladas pela retomada das atividades presenciais”, explica Storino.
"A produção de dados realizada pelo Cetic.br é fundamental, pois permite entender as nuances de uso da Internet no país e guiar a produção de políticas públicas em várias áreas, não só as que buscam ampliar o acesso, mas também as que contribuam com a conectividade significativa e o desenvolvimento de habilidades digitais", finaliza Renata.
Sobre a pesquisa
Realizada anualmente desde 2005, a TIC Domicílios tem o objetivo de mapear o acesso às tecnologias da informação e comunicação nos domicílios urbanos e rurais do país e as suas formas de uso por indivíduos de 10 anos de idade ou mais. Na atual edição, a coleta de dados aconteceu de junho a outubro de 2022 (período antecipado em relação a 2021, quando a coleta ocorreu de outubro daquele ano a março de 2022), e incluiu 23.292 domicílios e 20.688 indivíduos.
Para conferir a lista completa de indicadores aqui
O Cetic.br disponibiliza, ainda, os microdados do estudo para download, além das tabelas completas de proporções, totais e respectivas margens de erro aqui.
* Matéria atualizada às 15h52 para incluir a declaração de Renata Mielli