Um ano após embolsar cerca de R$ 3 milhões da administração Ricardo Nunes (MDB) para publicar reportagens pagas elogiando a prefeitura de São Paulo - conforme apuração do site The Intercept -, a Folha de S.Paulo resgatou nesta quarta-feira (11) um processo de 2012, relacionado à violenta reintegração de posse de Pinheirinho, em São José dos Campos, para atacar Guilherme Boulos.
ENTENDA:
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A ação contra Boulos, proposta pelo Ministério Público em 27 de maio de 2013, foi prescrita em 2021, mas o jornal da família Frias recorre a um "desabafo" do promotor João Carlos de Camargo Maia em um documento de 2022 para atacar o principal oponente de Nunes na disputa à prefeitura da capital paulista.
"Melancolicamente se trabalhou pela confecção da Justiça, mas o criminoso conseguiu fugir por manobra jurídica, de modo muito semelhante a outro personagem mais famoso que pretende ser o mandatário maior. Muito triste e lamentável esta constatação", diz a aspas do promotor que abre a "reportagem" na Folha com o título "Boulos fica 6 anos sem ser encontrado pela Justiça, processo prescreve e promotor desabafa".
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Camargo Maia é um antigo desafeto de Lula - apoiador de Boulos - dentro do Ministério Público paulista. Em 2016, ele foi um dos signatários de uma moção de apoio aos colegas Cássio Conserino, José Carlos Blat e Fernando Henrique Araújo que pediram a prisão preventiva do então ex-presidente no caso Triplex do Guarujá, antes do caso ser enviado à Curitiba para deleite do lawfare conduzido pela Lava Jato.
Caso Pinheirinho
A própria reportagem da Folha afirma que a desocupação de Pinheirinhos, no interior paulista, foi "uma das ações mais violentas da PM nessa área".
O caso foi citado por Boulos, que se deslocou até São José dos Campos e foi preso em 22 de janeiro de 2022 na tentativa desesperada de evitar o uso da violência contra as famílias despejadas na área.
Como diz a própria nota enviada pela campanha ao jornal, "Guilherme Boulos nunca foi condenado a cumprir sentença e jamais fugiu da Justiça".
A atuação de Camargo Maia desde o início foi recheada por uma sucessão de erros com clara intenção política, no que pode ser considerado o embrião do levante de parte do Ministério Público contra a esquerda.
A Folha ainda comete um erro crasso ao dizer que Boulos foi acusado de "dano ao patrimônio público".
A acusação - outro erro do promotor - colocaria Boulos como responsável por atos que teriam sido cometidos por pessoas que estavam na região.
As matérias pagas por Nunes na Folha
Segundo reportagem de Paulo Motoryn, publicada no The Intercept Brasil em agosto do ano passado, mostrou que a Prefeitura de São Paulo gastou quase R$ 3 milhões em publicidade na Folha de São Paulo para publicar matérias que promovem a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB-SP).
A publicidade não era através de banners ou peças publicitárias explícitas. Na verdade, as ações eram matérias patrocinadas, e não mostravam com clareza que eram pagas pela prefeitura.
Os documentos mostrados pelo The Intercept mostram que a gestão Ricardo Nunes gastou dinheiro para "projeto especial, com produção de conteúdo", com "inserção de matérias no digital" e "páginas no impresso" dedicadas à exposição positiva da gestão de Nunes.
Na reportagem, Motoryn obteve os contratos assinados entre a Prefeitura de São Paulo, a Folha de São Paulo e a agência de publicidade Propeg, que preveem a publicação dos conteúdos elogiosos em canal dentro do site da Folha chamado ‘Estúdio Folha’.
De acordo com a apuração do jornalista, os contratos da Prefeitura com a Propeg estão na ordem de R$ 200 milhões e são investigados pelo Ministério Público. Intermediadora da parceria entre Folha e Prefeitura, a Propeg repassou ao jornal R$ 500 mil em 2022 e R$ 2,3 milhões nesse ano.
Entre julho e agosto, foram publicadas pelo menos 60 reportagens elogiosas à gestão de Ricardo Nunes que podem ser facilmente interpretadas como propaganda eleitoral antecipada. Motoryn apontou, em sua reportagem, que a Folha sequer indicava que os conteúdos seriam publicitários, em prática que induz o leitor ao erro.
Após a publicação da matéria a Folha alterou o layout dos conteúdos corrigindo a indução ao engano apontada pelo jornalista. No entanto, seu Ombudsman acusou o repórter de fazer “inferências sem apontar nada de concreto”. Dias mais tarde, o The Intercept Brasil publicou nova matéria expondo os contratos na íntegra em seu site, obtidos via Lei de Acesso à Informação.
“E tem mais. O repórter Paulo Motoryn recebeu outro documento com detalhes sobre os pagamentos feitos por outra agência, a MWorks. Lá constam mais pagamentos à Folha: R$ 146.722,22 em ‘projeto especial’, ‘inserção de banners’, ‘branded pages’ e ‘mídias de divulgação’ em 2022. Neste ano, a MWorks ainda intermediou o pagamento de um anúncio relacionado à Virada Cultural no valor de R$ 213.750,00.”, diz trecho da matéria assinada por Tatiana Dias que revelou os contratos entre Prefeitura de São Paulo, a Propeg e a Folha.