RIO GRANDE DO SUL

Caminhões com doações impedidos de circular no RS? Saiba o que realmente aconteceu

Como toda mentira eficiente, as fake news bolsonaristas partem de meias verdades; Conheça casos

Caminhão na estrada - imagem ilustrativa.Créditos: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Como toda mentira eficiente, as fake news bolsonaristas mais exitosas costumam partir de meias verdades. E ao longo do colapso climático do Rio Grande do Sul, que nesse mês de maio com uma série de inundações, uma dessas fake news que circulou pelas redes sociais dizia que caminhões que levavam doações para o Estado estavam sendo parados, multados e até mesmo apreendidos pelas autoridades federais.

Figuras como o coach Pablo Marçal e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) fizeram coro a essa história e ajudaram a montar a narrativa de que o Governo Lula “nada faz” pelos gaúchos. No decorrer dos dias a narrativa foi “validada” pelos seus narradores a partir de matérias da imprensa e imagens nas redes sociais que mostravam os veículos parados para fiscalização.

A meia verdade está aí: alguns caminhões realmente foram parados para atender a procedimentos padrão de fiscalização das autoridades. E era nesses momentos que as imagens eram feitas. No entanto, logo a seguir eram liberados para seguir viagem, especialmente se levavam doações para os gaúchos atingidos pelas chuvas.

A Agência Aos Fatos, que faz justamente a checagem de possíveis fake news, fez um levantamento desses casos.

O primeiro relato verificado foi feito em 3 de maio no X e contou com um print de uma conversa de WhatsApp que relatava caminhões parados próximos a Erechim (RS). De acordo com o post, a liberação só ocorreria após apresentação de nota fiscal e recolhimento do ICMS (Imposto Estadual sobre a Circulação de Mercadorias) das doações.

O autor da “denúncia” publicou no dia seguinte que os motoristas foram liberados para seguir viagem depois de provarem que o conteúdo dos caminhões era de doações para as vítimas. Mas o estrago já estava feito durante o intervalo em que o engano foi tratado como "informação".

Um segundo caso explorado pelos bolsonaristas ocorreu em 6 de maio, segunda-feira, com um caminhão da empresa Bread King que aparecia em vídeo nas redes como se estivesse sendo barrado por não apresentar notas fiscais das doações. No dia seguinte, a empresa informou em nota que o veículo tinha sido parado pela Receita Federal por excesso de peso em Torres (RS), mas que logo foi liberado e entregou as doações já naquela madrugada.

O terceiro e último caso verificado pela agência de checagem diz respeito à matéria do programa Tá na Hora, do SBT. A peça jornalística, intitulada “Exclusivo: comboio com ajuda humanitária é multado” e publicada em 7 de maio, foi inclusive citada por Pablo Marçal na difusão da fake news em questão.

Na realidade, o caso ocorreu em posto de pesagem da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) em Araranguá (SC). Era um comboio com quatro caminhões escoltado por uma viatura da Defesa Civil catarinense.

Samuel Vidal, o agente da Defesa Civil, falou à reportagem do SBT que a fiscalização era procedimento padrão e que realmente um dos veículos foi multado. Mas que se tratou de uma multa de R$ 200 por excesso de carga da qual é possível recorrer, e que apesar do contratempo o comboio seguiu viagem.

Ainda durante a fiscalização, foi sugerido que a carga em excesso fosse dividida com os demais veículos. Não sendo possível essa operação, os veículos foram liberados com a multa.

Mais tarde, a ANTT reconheceria que alguns servidores realizaram “notificações isoladas” e publicaria uma portaria que garante a isenção de pedágio e tarifas para quem transporta doações. O SBT, por sua vez, emitiu nota dizendo que não publica “inverdades”. De fato, a notícia não era falsa, mas ensejou todo um arcabouço de fake news, sobretudo pela forma espetaculosa com que foi publicada.

Uma simples fiscalização de um caminhão eventualmente multado por excesso de peso se transformou no suposto fato de que a Receita Federal e outros órgãos federais estariam “apreendendo caminhões com doações” que não apresentassem as notas fiscais das doações. Exagerado, não?