POR UM VOTO

STF vai legalizar a maconha? Entenda o que está em julgamento

Corte retoma análise, iniciada em 2015, que pode descriminalizar o porte de maconha para consumo próprio

Marcha da Maconha em Brasília.Créditos: Sérgio Lima/Folhapress
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O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma, nesta quarta-feira (6), o julgamento sobre a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. O tema retorna à pauta da Corte após pedido de vista do ministro André Mendonça, em agosto de 2023. 

Neste momento, o placar está em 5 a 1 a favor da descriminalização - o que significa que basta apenas mais um voto favorável para que o porte de maconha para consumo próprio deixe de ser criminalizado. Votaram a favor os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e a ministra recém-aposentada Rosa Weber; enquanto Cristiano Zanin votou contra. 

Apesar do julgamento tratar do porte de drogas como um todo, os ministros que votaram a favor da descriminalização o fizeram apenas com relação maconha, exceto Gilmar Mendes. A análise do tema foi iniciada pelo STF em 2015 a partir do julgamento da constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), baseado em um fato concreto de prisão por porte de 3g de maconha. 

O STF, porém, não vai "legalizar a maconha" ao final do julgamento, mesmo se houver mais um voto favorável à descriminalização. Isso porque descriminalizar o porte para consumo pessoal não significa a legalização total, visto que a produção, venda e distribuição de maconha ou de qualquer droga seguem proibidos no Brasil

O efeito prático, caso o porte para consumo próprio seja, de fato, descriminalizado, seria apenas impedir que pessoas flagradas portando pequenas quantidades de maconha, desde que comprovado que é para uso pessoal, não sejam penalizadas. Atualmente, a Lei de Drogas considera crime adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo pessoal e prevê penas como prestação de serviços à comunidade.

A interpretação do que é quantidade para "consumo pessoal" e o que configura tráfico, entretanto, é feita, a princípio, pelas polícias, que recorrentemente consideram pretos e pobres como traficantes e pessoas brancas, de classe média ou alta como usuários. O julgamento do STF, portanto, atacaria este cenário e definiria, exatamente, qual a quantidade de droga que pode ser considerada para uso pessoal. 

Em declaração feita durante evento da Faculdade de Direito da PUC-SP, no Tuca, o teatro da universidade, o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que "não há descriminalização de coisa alguma" na pauta da Corte. 

"Como ela [a quantidade de droga] não está na lei, quem faz essa definição é a polícia. E o que se verifica é que há um critério extremamente discriminatório. Dependendo do bairro, de classe média alta ou de periferia, a mesma quantidade recebe um tratamento diferente (...) O que o Supremo quer fazer é ter uma regra que valha para todo mundo e que não seja definida pelo policial no ato da prisão. Portanto, não tem nada a ver com descriminalização, tem a ver com impedir uma injustiça e impedir a discriminação entre pessoas", declarou o magistrado. 

Os votos dos ministros

Desde a reabertura do julgamento sobre porte de drogas para uso pessoal, em 2 de agosto, os ministros do STF proferiram seus votos e análises pessoais acerca da ação. O placar, iniciado em 2015, já apontava 3 a 0 a favor da descriminalização.

Na ocasião, Gilmar Mendes considerou que o artigo 28 da Lei de Drogas é inconstitucional. Embora o caso em questão referia-se ao porte da maconha, o ministro votou pela descriminalização de todas as drogas ilícitas.

O magistrado tem o entendimento da necessidade de uma transição gradual entre as medidas punitivistas tomadas contra os usuários e a implementação de novas regras de prevenção e combate ao uso de drogas, por meio de sanções administrativas e cíveis, por exemplo.

Em 2015, os ministros Edson Fachin e Luís Roberto Barroso também votaram pela inconstitucionalidade do artigo, com ressalvas. Fachin afirmou que a descriminalização deveria ser feita "exclusivamente para o porte de maconha", enquanto Barroso decidiu não se manifestar sobre os demais tipos de drogas e propôs critérios mais flexíveis, permitindo a análise de juízes em audiência de custódia.

Alexandre de Moraes, em agosto de 2023, votou a favor da descriminalização mediante apresentação de critérios que definem se o portador é usuário ou traficante. O ministro apontou a necessidade de se definirem outros parâmetros, que não a divisão social ou racial que o agente policial possa se apoiar no momento da abordagem.

"Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente", disse Alexandre de Moraes.

Ao fim, Moraes votou pela descriminalização da maconha, mas não de outras drogas, acompanhando Barroso. Uma de suas falas viralizou nas redes sociais ao satirizar a comparação entre o uso pessoal de cigarros de maconha com o famoso narcotraficante Pablo Escobar.

"Quando o parágrafo 2 do artigo 28 diz: ‘o juiz atenderá a natureza e a quantidade da substância’, qual seria uma quantidade razoável tratando aqui da questão da maconha, eventualmente, dentro desses dados empíricos, para se analisar? Digo isso porque as situações radicais não deixam dúvida. Alguém preso com 100 kg de pasta de cocaína , ninguém acha que é usuário. Não há nariz para tanto. Assim como alguém pego com duas toneladas de maconha não é visto como usuário. Da mesma maneira, alguém pego com dois cigarrinhos de maconha não pode ser visto como o ‘novo Pablo Escobar’, um traficante perigoso", disse Moraes no voto.

Até o momento, o único voto contrário foi do ministro Cristiano Zanin, ex-advogado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Era esperado que o ministro votasse a favor da descriminalização. Segundo ele, a descriminalização contribuirá para agravar problemas de saúde relacionados ao vício.

Zanin, contudo, sugeriu pela fixação da quantidade máxima de 25 gramas para diferenciar um usuário de um traficante. A ministra Rosa Weber antecipou seu voto tendo em vista a sua aposentadoria e votou a favor, deixando o placar em 5 a 1 a favor da descriminalização.