A Polícia Civil do Rio Grande do Sul anunciou nesta segunda-feira (19) que irá indiciar o motoboy Everton Henrique da Silva, de 40 anos, detido no último sábado (17) em Porto Alegre após quase ser esfaqueado com um canivete. O indiciamento também é válido para o seu agressor, um homem branco de 72 anos que incrivelmente não teve sua identidade revelada à imprensa. Ambos respondem por lesão corporal.
As informações foram confirmadas pela delegada Rosane de Oliveira, da 3ª Delegacia de Polícia da Capital do Rio Grande do Sul. Ela é a responsável pelas investigações.
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“Efetivamente vai ter o indiciamento de lesão corporal de ambas as partes, tanto do motoboy quando do senhor, que feriram-se mutuamente. O outro delito [de racismo] ainda vai ser apurado”, explicou a delegada.
A delegada faz a diferenciação entre os crimes. Por um lado, há a lesão corporal, uma vez que os dois entraram em briga corporal propriamente dita. De outro lado está a denúncia de racismo, tanto em relação ao idoso como da parte dos agentes da Brigada Militar.
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Diversos vídeos do episódio circularam nas redes sociais ao longo do último final de semana. Alguns deles mostram que o homem negro é questionado pelo militar enquanto o agressor conversa tranquilamente com outra autoridade. Ao afirmar que trabalha no local, a vítima é contestada pelo agressor e rebate, falando para que mostre novamente a faca que usou para ameaçá-lo.
Em seguida, o militar puxa o homem negro pela camisa, que pede para ser solto, já que não fez nada de errado - pelo contrário, é a vítima da situação. No entanto, o militar ainda empurra o homem contra a parede e o prende. As testemunhas se manifestam pedindo para que o homem seja solto e reforçam que a situação é um caso de racismo. Enquanto isso, o homem branco sai de cena livremente.
A delegada confirmou que já ouviu os depoimentos de Everton e do idoso agressor. Conforme informou à imprensa, o motoboy estaria “mais alterado” do que o senhor branco de 72 anos que segundo testemunhas teria tentado esfaqueá-lo no pescoço. Ela ainda aguarda os depoimentos dos agentes da Brigada Militar que atenderam a ocorrência.
Após o episódio viralizar nas redes sociais, a própria corporação abriu uma sindicância interna para investigar a abordagem dos agentes. Sandro Caron, secretário de Segurança Pública, informou que sete pessoas já foram ouvidas nesse âmbito e promete punição caso comprovado o “desvio de conduta” dos policiais no tratamento desigual entre as partes.
Motoboy se pronuncia
Ainda no sábado, após deixar a delegacia, o motoboy explicou à rádio gaúcha o motivo alegado pelo homem, que não teve a identidade revelada até o momento, para desferir uma facada nele.
"Ele não gosta desse volume de motoboys concentrado na frente do prédio. E tentou me matar. Ele me esfaqueou. Chamamos a polícia e o brigadiano foi ignorante", afirmou o rapaz à rádio.
Em vídeo, Everton afirma que esperava um pedido pelo WhatsApp, quando foi abordado pelo homem.
"Estou sentado e chega um cidadão que é cliente da casa à frente de onde eu estava com uma faca e me desferiu um golpe no meu pescoço. Chamamos a Brigada, que não soube chegar conversando normal. Ai eu conversei do mesmo jeito que eles estavam conversando. Me agrediram e fui para a delegacia. E o cidadão se encontra na rua, tranquilo", diz.
Racismo
O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, se pronunciou na manhã deste domingo (18) sobre a prisão do motoboy negro pela Brigada Militar.
Almeida afirmou que o caso "demonstra, mais uma vez, a forma como o racismo perverte as instituições e, por consequência, seus agentes" e anunciou ação conjunta com a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco.
"É preciso que as instituições passem a analisar de forma crítica o seu modo de funcionamento e aceitar que em uma sociedade em que o racismo é estrutural, medidas consistentes e constantes no campo da formação e das práticas de governança antirracista devem ser adotadas. Em outras palavras, é preciso aceitar críticas e passar a adotar medidas sérias de combate ao racismo em nível institucional", diz o ministro.
"Conversei com a Ministra Anielle Franco e entraremos em contato com as autoridades gaúchas para acompanhar o caso e ajudar na construção de políticas de maior alcance", emendou.
Anielle Franco também se pronunciou sobre o caso e disse que "as imagens causaram revolta, com razão, pelos indícios de racismo institucional".
"Nossa equipe buscará, junto ao Ministério da Justiça e Ministério dos Direitos Humanos acompanhar os desdobramentos das investigações. Prestamos nossa solidariedade e apoio à equipe do mandato do vereador Matheus Gomes, que visibilizou o caso e acompanha a vítima no estado".