EXTREMISMO

"Não é um lobo solitário": a análise de uma antropóloga sobre o atentado em Brasília

"Se alguém achava que o oito de janeiro era uma coisa isolada, foi um equívoco. O risco está aumentando", aponta Isabela Kalil

Atentado em Brasília não é fato isolado e prevenção para novos ataques é necessáriaCréditos: Reprodução de vídeo/YouTube
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A antropóloga e pesquisadora do Observatório da Extrema Direita Isabela Kalil avalia que o uso da expressão "lobo solitário" não é adequado para episódios como o de Francisco Wanderley Luiz, o Tiü França, autor do atentado a bomba na Praça dos Três Poderes.

Ainda que pessoas como ele possam fazer ataques sozinhos, existe uma conexão com comunidades fundadas no discurso do ódio. "A ideia de lobo solitário, de alguém que não participa de uma comunidade ou agenda específica e acaba tomando uma atitude totalmente individual, foi usada para explicar determinados atentados e dizer serem casos isolados", diz ela, em entrevista concedida ao portal Uol.

"Existe repetição, como nas escolas, que o mês de abril é geralmente escolhido e é um período crítico, porque é quando acontece o aniversário de Hitler. Alguns atos parecem inofensivos, mas foram preparatórios para o 8/1. Depois o próprio oito de janeiro e agora essas explosões, que são como uma performance do 8/1. As motociatas são alguns desses atos preparatórios onde circulam mensagens disruptivas, falas como a do Bolsonaro dizendo que não aceitaria decisões judiciais ou não usaria máscara - não são falas normais. Ele está ali comunicando que não respeita decisões judiciais, sendo chefe de Estado", explica a antropóloga.

Isabela destaca que a extrema direita estimula ataques como o que aconteceu na Praça dos Três Poderes no ambiente virtual, no entanto, não se restringe a ele. "Agora temos eventos, mobilizações de massa, como manifestações. É mais complexo", pontua.

"Crianças de 10 anos já estão nessas comunidades de ódio. Em camadas iniciais de recrutamento, essas pessoas não sabem que parte do grupo exerce ataques motivados por ódio a determinados grupos sociais. Há uma espécie de contentamento em ver ataques violentos contra esses grupos. São grupos misóginos, que pregam o ódio às mulheres, compartilham imagens de crimes, inclusive de morte de mulheres. Outro tipo de grupo que é muito comum é os de supremacistas brancos", explica.

Segundo ela, a perspectiva de punição não é suficiente para refrear possíveis novos ataques, sendo necessário trabalhar aspectos relacionados à prevenção. "Teremos novos ataques à praça dos Três poderes? Depende da resposta que vamos dar a esses ataques. O atentado de anteontem tem duas consequências: o efeito de repetição, de outras pessoas quererem fazer coisas parecidas, e o de contágio. Se alguém achava que o oito de janeiro era uma coisa isolada, foi um equívoco. O risco está aumentando."

A íntegra da entrevista está aqui.