A redução da pobreza e da extrema pobreza e o avanço na segurança alimentar entre 2022 e 2023, durante os primeiros dois anos do Governo Lula 3, deixou clara a relevância das políticas de distribuição de renda e dos programas sociais.
No entanto, ao logo nesse período, o novo arcabouço fiscal e o crescente endividamento público seguem sendo obstáculos no combate à pobreza e no cumprimento dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos pela Agenda 2030 das Nações Unidas. Essa situação afeta de maneira desproporcional mulheres, meninas, negros e indígenas, perpetuando desigualdades históricas.
Te podría interesar
Essa é uma das conclusões da dimensão social reveladas pelo Relatório Luz da Sociedade Civil para a Agenda 2030. O documento revela que o Brasil enfrenta grandes desafios no cumprimento desses objetivos.
Na dimensão ambiental da Agenda 2030, o documento mostra que a situação permanece crítica, mesmo com o aumento significativo dos investimentos em 2023, após o cenário desastroso do Governo Bolsonaro. As queimadas e os impactos das mudanças climáticas continuam configurando um panorama desastroso em 2024.
Te podría interesar
Embora o relatório revele avanço na proteção ambiental, como a redução de 62,2% no desmatamento da Amazônia, ele também alerta para o aumento de 67,7% no desmatamento do Cerrado, destacando a contínua ameaça ao meio ambiente e aos povos indígenas.
Além disso, o estudo critica a falta de financiamento adequado para 12 dos ODS, incluindo pobreza, saúde, igualdade de gênero e os relacionados à dimensão ambiental.
LEIA TAMBÉM: Financiamento do desenvolvimento sustentável no Brasil - Por Cláudio Fernandes
Já na dimensão econômica, esta oitava edição do Relatório Luz traz um ponto positivo: o fornecimento de dados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) que destacam a consolidação dos desembolsos para a Agenda de Desenvolvimento Sustentável.
No entanto, as informações ressaltam o grande desafio de promover investimentos equânimes no conjunto dos ODS, especialmente nas dimensões social e ambiental.
ODS brasileiro sobre racismo
O relatório inclui, pela primeira vez, um estudo de caso sobre racismo, ressaltando a criação do ODS 18 pelo governo brasileiro, que incorpora a perspectiva étnico-racial no debate sobre desenvolvimento sustentável. Ainda assim, o país permanece distante de alcançar muitos dos objetivos propostos para 2030, especialmente devido a obstáculos fiscais e ao endividamento público (leia abaixo).
Os resultados gerais, no entanto, são alarmantes. Apesar de alguns avanços, o Relatório Luz 2024 mostra que grande parte das metas ainda está longe de ser alcançada no Brasil. Das 169 metas, apenas 13 metas (7,73%) registraram progresso satisfatório — 58 (34,52%) apresentaram progresso insuficiente, 40 metas (23,8%) retrocederam, 43 (25,59%) permaneceram estagnadas e 10 (5,95%) estão ameaçadas. Além disso, 4 metas (2,38%) não possuem dados suficientes para avaliação.
Brasil ainda está em processo de reconstrução
Segundo Alessandra Nilo, co-fundadora da Gestos e co-facilitadora do GT Agenda 2030, embora existam avanços, o Brasil ainda está em um processo de reconstrução e enfrentando desafios complexos. Ela também destacou a importância do governo atual em reabrir o espaço cívico e retomar a participação social, refletindo-se no diálogo com o Relatório Voluntário Nacional 2024, que foi apresentado na ONU.
"Observamos avanços, mas isso não significa que estamos caminhando rápido o suficiente para alcançar os ODS até 2030. Estamos reconstruindo o que foi destruído e ainda enfrentamos um cenário desafiador", afirmou Alessandra.
LEIA TAMBÉM: Confira os desafios e necessidades urgentes para o desenvolvimento sustentável no Brasil
Lançamento do Relatório Luz
A oitava edição do Relatório Luz será lançada no dia 22 de outubro, às 14h, em Brasília (DF). O documento foi elaborado por 47 organizações da sociedade civil e 82 especialistas.
O documento dá continuidade à série histórica iniciada em 2017 e oferece um monitoramento abrangente dos 17 ODS e suas 169 metas, com base em dados oficiais. Além disso, o relatório apresenta 160 recomendações para a implementação de políticas públicas que dialoguem com o desenvolvimento sustentável.
A mesa de abertura do evento contará com a participação da ministra dos Direitos Humanos e da Cidadani, Macaé Evaristo; do secretário-geral da Presidência, ministro Márcio Macedo e exibição de vídeo exclusivo da primeira-dama, Janja Lula.
Confira aqui a programação completa.
Este é o segundo ano consecutivo que o lançamento é realizado na Secretaria-Geral da Presidência. Paralelamente, em julho, foi apresentado nas Nações Unidas, durante o Fórum Político de Alto Nível em Nova York, o Relatório Nacional Voluntário do Governo do Brasil (RNV).
Em sua publicação, o RNV ressaltou a importância da participação da sociedade civil e reconheceu o Relatório Luz como "um exemplo significativo de instrumento de monitoramento e avaliação da Agenda 2030 em nível nacional, que também conquistou visibilidade internacional".
Outro dado revelado pelo relatório é a falta de financiamento adequado em 12 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, como o ODS 1 (Pobreza), ODS 3 (Saúde) e ODS 5 (Igualdade de Gênero) e os ODS que contemplam a dimensão ambiental (6, 7, 11, 12, 13, 14 e 15). Embora tenha ocorrido uma redução de 62,2% no desmatamento da Amazônia, o Cerrado registrou um aumento de 67,7%, evidenciando as ameaças contínuas ao meio ambiente e aos povos indígenas.
A íntegra do Relatório Luz 2024 estará disponível a partir do dia 22 de outubro, após o lançamento oficial.
O que é o Relatório Luz
O Relatório Luz faz uma análise detalhada das políticas públicas e dos indicadores sociais, econômicos e ambientais do Brasil, destacando os desafios e apontando os pontos que precisam de mais atenção por parte do governo e da sociedade.
O documento também serve como uma ferramenta de advocacy, permitindo que as organizações da sociedade civil pressionem por mudanças e melhores políticas públicas.
Esse relatório é lançado anualmente e é amplamente utilizado para informar debates sobre o desenvolvimento sustentável no Brasil, além de fornecer uma visão independente sobre o compromisso do país com as metas globais da ONU.
Os 17 ODS
Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 são:
- Erradicação da Pobreza: Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares. (dimensão social)
- Fome Zero e Agricultura Sustentável: Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição, e promover a agricultura sustentável. (dimensão social)
- Saúde e Bem-Estar: Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades. (dimensão social)
- Educação de Qualidade: Assegurar a educação inclusiva, equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos. (dimensão social)
- Igualdade de Gênero: Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas. (dimensão social)
- Água Potável e Saneamento: Assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água potável e do saneamento para todos. (dimensões social e ambiental)
- Energia Limpa e Acessível: Assegurar o acesso confiável, sustentável, moderno e a preço acessível à energia para todos. (dimensão ambiental)
- Trabalho Decente e Crescimento Econômico: Promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, o emprego pleno e produtivo, e o trabalho decente para todos. (dimensão econômica)
- Indústria, Inovação e Infraestrutura: Construir infraestruturas resilientes, promover a industrialização inclusiva e sustentável, e fomentar a inovação. (dimensão econômica)
- Redução das Desigualdades: Reduzir as desigualdades dentro dos países e entre eles. (dimensão social)
- Cidades e Comunidades Sustentáveis: Tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis. (dimensão ambiental)
- Consumo e Produção Responsáveis: Assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis. (dimensão ambiental)
- Ação Contra a Mudança Global do Clima: Tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e seus impactos.(dimensão ambiental)
- Vida na Água: Conservar e usar de forma sustentável os oceanos, mares e os recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável. (dimensão ambiental)
- Vida Terrestre: Proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da terra e deter a perda da biodiversidade. (dimensão ambiental)
- Paz, Justiça e Instituições Eficazes: Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis. (dimensão social)
- Parcerias e Meios de Implementação: Fortalecer os meios de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável. (dimensão econômica)
Esses objetivos compõem a base da Agenda 2030 da ONU, com metas específicas que visam promover o desenvolvimento sustentável em escala global.
O ODS brasileiro
O ODS 18 é uma inovação exclusiva do Brasil, que foi incorporado à Agenda 2030 com o objetivo de tratar diretamente da questão racial e das desigualdades étnico-raciais no país. Embora não faça parte dos 17 ODS globais da ONU, o ODS 18 foi criado a partir da necessidade de reconhecer e enfrentar o racismo estrutural que afeta de maneira desproporcional as populações negras, indígenas e outras minorias étnicas no Brasil.
- Promoção da Igualdade Racial: O ODS 18 visa reduzir as desigualdades raciais em várias áreas, como acesso à educação, saúde, mercado de trabalho e moradia.
- Inclusão Social e Econômica: Através de políticas públicas, o objetivo é promover a inclusão social e econômica de populações historicamente marginalizadas, garantindo oportunidades equitativas de desenvolvimento e participação cidadã.
- Combate ao Racismo Estrutural: O ODS 18 também busca combater o racismo estrutural e institucional, promovendo uma cultura de respeito à diversidade e incentivando ações afirmativas e de reparação.
A criação do ODS 18 reflete o reconhecimento, por parte do Brasil, de que o combate às desigualdades raciais é uma questão central para o desenvolvimento sustentável e não pode ser negligenciada. O ODS 18 complementa os 17 objetivos globais, colocando a questão racial no centro do debate sobre o desenvolvimento no Brasil.
Essa inclusão é um passo importante para o avanço das políticas de equidade racial no Brasil, destacando a importância de enfrentar as desigualdades de forma mais incisiva e reconhecendo o impacto histórico da discriminação racial no país.
Siga os perfis da Revista Fórum e da jornalista Iara Vidal no Bluesky