ESQUEMA PIRÂMIDE

Faraó dos Bitcoins: quem é a esposa do suposto fraudador presa em Chicago

Venezuelana teria movimentado rede de R$ 38 bilhões; mesmo foragida das autoridades brasileiras, ela seguiu publicando nas redes sociais

Com mais de 60 mil seguidores, Mirelis publicava nas redes sociais mesmo foragida da Polícia Federal.Créditos: Reprodução/Instagram/@mirelisdiazoficial
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A venezuelana Mirelis Diaz Zerpa foi presa em uma operação da Polícia Federal (PF) nesta quarta-feira (24). Conhecida como a esposa do "Faraó dos Bitcoins", ela foi encontrada em Chicago, nos Estados Unidos, após ficar foragida por mais de dois anos e meio por suposto envolvimento em um esquema de pirâmide financeira, disfarçado de operação de investimento em criptomoedas.

Em uma cooperação internacional com o Serviço Secreto dos EUA e a Imigração e Alfândega dos EUA (ICE, da sigla em inglês), a Polícia Federal a encontrou. Mirelis permanecia como imigrante de forma ilegal no país, o que seria o único motivo de sua prisão, conforme declaração de sua defesa (leia a nota completa no final da matéria).

Mirelis tem um mandado de prisão em aberto pela 3ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, na qual é acusada de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, lavagem de dinheiro e integração de organização criminosa. 

Desde 2021, ela estava foragida da Operação Kryptos, que descobriu que a investigada era proprietária de uma empresa de consultoria em Cabo Frio (RJ), a GAS Consultoria e Tecnologia, em nome da qual, firmaram-se contratos que integram uma rede para lavagem de dinheiro

Junto de seu esposo, Glaidson Acácio dos Santos, e cúmplices, eles teriam movimentado cerca de R$ 38 bilhões entre o início da oferta de contratos, em 2015, e a prisão do "Faraó dos Bitcoins", em 2021. Os contratos prometiam rendimentos fixos mensais de 10% em uma quantia específica.

 

Os contratos não possuíam autorização ou registro junto à Comissão de Valores Mobiliários (CMV), autarquia do Ministério da Fazenda responsável pela fiscalização e normatização do mercado de valores mobiliários e a atuação de seus protagonistas. Mais de 278 mil pessoas foram alvo de golpe.

Quem é Mirelis Zerpa

Mirelis Yoseline Díaz Zerpa morava em Chicago, onde atuava como DJ e produzia criações artísticas com inteligência artificial. Ela se caracterizava como "artista, música, criadora de arte digital e escritora", nas suas redes sociais.

Mesmo foragida da Polícia Federal, Mirelis seguiu publicando em suas redes sociais, sobretudo no Instagram, onde acumula mais de 61 mil seguidores. Na rede da Meta, ela publica suas artes criadas com IA, nas quais divulga sua música "Indestructible".

"Quero agradecer a todas as pessoas do Brasil que me apoiaram desde o início, a esse povo brasileiro de mente aberta, com forças para continuar lutando, com vontade de viver em um mundo de liberdade e justiça", escreveu em publicação de dezembro de 2023.

No YouTube, onde soma mais de 8 mil seguidores, ela divulga conteúdos de criptomoedas: "Também tenho um canal para membros que se inscrevam. Se as pessoas querem saber sobre mundo de bitcoin, sobre inteligência artificial, também estarei postando", informou.

Na véspera de sua prisão, na terça-feira (23), ela publicou uma foto de seu rosto com uma legenda que diz: "A qualidade da nossa vida é forjada na medida em que estamos dispostos a investir em nós mesmos, sem deixar que as opiniões alheias ditem o nosso caminho".

De acordo com a Polícia Federal, Mirelis teria usado parte da fortuna para as compras de um avião, avaliado em R$ 4 milhões, e de um carro de luxo da fabricante Rolls-Royce, avaliado em R$ 2,5 milhões. O pagamento do automóvel teria sido feito à vista.

Em agosto de 2021, um dia após a deflagração da Operação Kryptos, Mirelis retirou R$ 1,2 bilhão das contas bancárias da empresa de fachada e, em dezembro daquele ano, ela transferiu R$ 2 milhões para uma conta em nome de sua irmã, Noiralis Zerpa. As movimentações foram feitas com bitcoins.

Acusada de ser cúmplice dos crimes do marido, Mirelis viajou aos Estados Unidos em 2021, sob proteção de Ricardo Rodrigues Gomes, conhecido como "Piloto". Foi ele quem obteve um visto de estudante para Mirelis, na Universidade de Atlanta, em junho de 2022.

Documentos da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), mostram que Gomes obteve licença de comandante de aeronave na década de 1980 e teria se envolvido com tráfico de drogas.

Em 1989, investigações da Administração de Fiscalização de Drogas (DEA, da sigla em inglês) dos EUA descobriram que Gomes transportava cocaína no trajeto Rio-Miami como parte do Cartel de Medellín, o grupo de narcotráfico então liderado pelo colombiano Pablo Escobar.

Foragida nos EUA, Mirelis teve seu mandado de prisão anulado por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2022. Contudo, segundo o Fantástico, uma nova ordem de prisão foi emitida, de modo que ela permaneceu como procurada pelas autoridades brasileiras.

A esposa do "Faraó dos Bitcoins" teria montado um esquema internacional de pirâmide financeira e de lavagem de dinheiro. Entre março de 2020 e dezembro de 2022, clientes lesados pelos crimes apontaram uma empresa em Medellín, na Colômbia, cujo finalidade era de injetar dinheiro de origem desconhecida no mercado de câmbio.

Segundo dados do governo colombiano, a Consultoria Y Tecnologia Avanzada S.A.S pertenceu a Juan Pablo Bonilla Guzman e Noiralis Zerpa, a irmã de Mirelis, que é procurada pelas autoridades desde o recebimento milionário das contas de Mirelis.

O que diz a defesa de Mirelis

Em nota, os advogados Andre Hespanhol e Ciro Chagas, que representam a investigada, declararam que o motivo da prisão "foi uma irregularidade formal em seu visto, [...] e que está em vias de ser esclarecido". Os advogados também indicam que ela sempre residiu de forma legal nos Estados Unidos.

A defesa utilizou o Recurso de Habeas Corpus (RHC) para argumentar que o STJ entendeu o decreto de prisão como ilegal e reconheceu que " MIRELIS jamais esteve foragida nem ilegal nos EUA".

"Portanto, qualquer ordem de prisão eventualmente existente no Brasil, sobretudo "secretas", que violam também decisão da Suprema Corte é absolutamente ilegal."

Confira a nota na íntegra:

Na data de hoje a defesa de MIRELIS DIAZ foi surpreendida com matérias na imprensa noticiando sua prisão, nos EUA. 

Em contato estabelecido por ela, com sua família, o motivo da detenção foi uma irregularidade formal em seu visto, o que era de seu desconhecimento e de seus advogados, e que está em vias de ser esclarecido. Mirelis vive, estudava e sempre esteve legalmente residindo nos Estados Unidos da América. Para as próximas horas esperamos as informações oficiais. 

Em 20/12/2023 o Superior Tribunal de Justiça concedeu ordem de habeas corpus a MIRELIS, entendendo que seu decreto de prisão é ilegal e fixando medidas cautelares em substituição à prisão (HC 186358/RJ). A decisão é expressa quanto à identidade das prisões da operação Cryptos e também é expressa em reconhecer que MIRELIS jamais esteve foragida nem ilegal nos EUA: 

"...Em que pese a defesa argumente que ela não está foragida, o que é tecnicamente correto, pois foi ao exterior em 30 de junho de 2021, quando ainda não havia sequer uma investigação formal contra ela e a única ordem de prisão está agora sob questionamento…" (...) Resta, no entanto, a análise da adequação da medida de prisão à gravidade do crime, às circunstâncias do fato e às condições pessoais da recorrente, conforme art. 282, inc. II, do CPP. Conforme se verifica dos autos, não se trata de crime que envolva violência ou grave ameaça. A menção à violência é incidental e não tem relação direta com a Recorrente. De outro lado, as circunstâncias do fato, especificamente a residência do exterior, indicam que a prisão preventiva seria inadequada. De outro lado, mostra-se adequada a imposição de outras medidas cautelares diversas da prisão, como forma de satisfazer a mencionada necessidade cautelar à instrução e aplicação da lei penal. Ante o exposto, defiro a medida liminar para suspender a decretação da prisão preventiva até julgamento do mérito do presente RHC…" (STJ, RHC 186.358/RJ, grifos nossos).

O recesso forense impediu a apreciação de embargos de declaração que ponderavam duas questões fundamentais que pendem de manifestação no  STJ: 1) a sequência de ilegalidades cometidas pela 3a Vara Federal do Rio de Janeiro; 2) O descumprimento reiterado, por parte do Juízo da 3a. Vara Federal do Rio de Janeiro das decisões do Superior Tribunal de Justiça, fracionando e fabricando eternas acusações e prisões sucessivas, sempre a impedir o cumprimento das decisões das Cortes Superiores.

Portanto, qualquer ordem de prisão eventualmente existente no Brasil, sobretudo "secretas", que violam também decisão da Suprema Corte é absolutamente ilegal. A defesa de Mirelis Diaz confia que o episódio de sua detenção seja efetivamente exclusivamente em razão de qualquer irregularidade sanável quanto ao seu procedimento de migração e não imagina que a ousadia do Juízo não tenha chegado a mais um descumprimento das ordens do Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal. Se este for o caso, certamente mais essa irregularidade será sanada, com a responsabilização dos atores perante as leis brasileiras e normas administrativas que disciplinam a hierarquia dos Tribunais e autoridades constituídas.

Por fim, nenhum ator, advogado ou não, está autorizado a debater em redes sociais tais procedimentos e não falam por Mirelis ou por Glaidson Acácio, que recentemente revogou expressamente o mandato de todos os seus advogados, constituindo em sua defesa os advogados que esta nota subscrevem. Tal circunstância não foi formalizada ainda, perante os tribunais, porque os advogados encontram-se no estudo estratégico do caso. As informações oficiais, relevantes, honestas e seguras sobre Glaidson, Mirelis e Operação Criptos são aquelas publicizadas pelo CHAGAS e HESPANHOL ADVOGADOS.

Brasília, 25 de Janeiro de 2024.

Andre Hespanhol e Ciro Chagas.

 

Com informações do El Publique e do O Globo.