O Ministério Público do Trabalho do Distrito Federal (MPT-DF) converteu a Notícia de Fato (NF) contra o jornal O Estado de S. Paulo em “Procedimento Preparatório” (PP), o que na prática torna a publicação alvo de uma averiguação. O tabloide está sendo acusado, na pessoa de sua editora-executiva, Andreza Matais, de “jornadas excessivas”, “horas extras impagas” e “assédio moral”. Neste último caso, como mostrou com exclusividade a Fórum, uma denúncia apontava que ela teria “obrigado” repórteres recém-contratados a produzirem uma reportagem enviesada para associar artificialmente o ministro Flávio Dino, da Justiça e Segurança Pública, com uma mulher batizada pelo jornal de “dama do tráfico do Amazonas”, que visitou a sede da pasta em questão durante um evento da área de direitos humanos em março deste ano, na condição de familiar de detento.
“Considerando, contudo, a necessidade de corroborar alguns elementos trazidos no bojo das denúncias, sobretudo para assegurar que o Ministério Público do Trabalho não seja utilizado como mecanismo para criação de factoides político-partidários, entendo mais prudente, no momento, a instauração de Procedimento Preparatório (PP), nos termos do artigo 2º, § 7º da Resolução CSMPT nº 69/2007”, escreveu o procurador do Trabalho Tiago Muniz Cavalcanti.
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O documento mostra ainda que foram três as denúncias feitas contra o Estadão, sendo duas delas datada de 12 de novembro, que foram anexadas, enquanto a terceira é do dia 20 do mesmo mês. Cabe salientar que as duas primeiras queixas ao MPT contra o Estadão foram feitas seis dias antes da reportagem exclusiva da Fórum, o que faz cair por terra as insinuações da publicação paulista de que tais denúncias seriam forjadas, sempre utilizando o argumento de que foram feitas “por quem é simpático ao governo”.
Notícia de Fato e Procedimento Preparatório: o que significa
Ao converter a Notícia de Fato (NF) em Procedimento Preparatório (PP), o MPT, na prática, inicia uma análise preliminar da existência ou não de indícios de uma lesão ou ameaça de lesão aos direitos trabalhistas. A Notícia de Fato é qualquer demanda dirigida ao Ministério Público. Com a instauração do procedimento, o órgão sinaliza que as denúncias em questão podem configurar violações a serem investigadas. Trata-se de uma etapa intermediária entre a Notícia de Fato e o inquérito civil, que pode ser aberto caso o procurador designado entenda ser necessário.
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Sigilo
A reportagem da Fórum solicitou acesso ao procedimento aberto para apurar a denúncia sobre suposto assédio moral aos jornalistas do Estadão na produção matéria sobre a "dama do tráfico", mas o MPT indeferiu o pedido por ter colocado as informações sob sigilo.
"Registre-se que o fato em apuração é grave e pode ter consequências relevantes para a sociedade, bem como que a divulgação do fato pode prejudicar as investigações, dificultando a identificação dos responsáveis e a obtenção de provas, tornando, ainda, inúteis, ineficazes e sem finalidade as diligências necessárias", escreveu, em despacho, o procurador Paulo Cezar Antun de Carvalho.
"Além disso, há a necessidade de proteger a identidade de testemunhas ou vítimas que ainda não prestaram depoimento e de preservar a intimidade e a vida privada de pessoas envolvidas nos fatos noticiados, evitando-se colocar em risco a integridade física ou psicológica de todas as pessoas mencionadas na investigação", prosseguiu.
Jornada abusiva, hora extra e assédio moral
Em denúncia enviada ao Ministério Público do Trabalho do Distrito Federal (MPT-DF) contra o jornal Estadão e a editora-executiva de Política Andreza Matais, no último dia 12, que se soma às outras duas já tornadas públicas, os denunciantes pedem ao MPT-DF que investigue “urgentemente [...] jornadas abusivas superiores a 13 horas por dia e fraudes trabalhistas nos controles de ponto e horas extras”.
"Solicitamos diligências urgentes do Ministério Público do Trabalho no jornal O Estado de S. Paulo, 2º andar do Brasília Shopping, para fiscalizar as jornadas abusivas, superiores a 13 horas por dia, a que são submetidos os profissionais e as fraudes trabalhistas nos controles de ponto e horas extras, praticadas pelos gestores da empresa", inicia a denúncia.
Em seguida, os denunciantes solicitam “que o Ministério Público cumpra seu dever constitucional e averigue se a gestora Andreza Matais, diretora da sucursal de Brasília, tem o direito legítimo de impedir o registro de horas extras nas folhas de ponto dos repórteres e editores do jornal”, gerenciados por ela.
Os autores da denúncia também afirmam ter provas de que “a gestora Andreza dava ordens imperativas para que subordinados sonegassem o registro de horas extras dos controles oficiais e que fazia tais ordens mediante assédio moral”.
Mais adiante, os denunciantes revelam que horas extras realizadas por funcionários não estão sendo pagas e, diante desse quadro, pedem ao MPT-DF que tome depoimentos da diretora de Recursos Humanos, Mariana Sampaio, e do diretor de redação, Leonardo Mendes Junior.
“Adiantamos aqui que funcionários não estão tendo horas extras registradas e que esse controle discricionário é feito pela gestora Andreza, com aprovação expressa dos diretores de RH, jurídico e redação do jornal. Solicitamos, por isso, que o MPT tome depoimentos de Andreza, da diretora de Recursos Humanos, Mariana Sampaio, e do diretor de redação, Leonardo Mendes Junior, para que eles possam apresentar suas versões sobre a falta de contabilização e pagamento de horas", exigem os denunciantes.
Outra parte da denúncia revela que o desrespeito trabalhista e a violação do Código de Ética por parte da editora Andreza Matais eram constantes e que, mesmo após apurações internas, nada foi feito em torno do caso.
“Solicitamos ainda que o MPT questione, em depoimento aos diretores Mariana e Leonardo, por que eles não tomaram atitude concreta para afastar a gestora Andreza, depois de sucessivas apurações internas indicarem que a gestora Andreza violou o Código de Ética da empresa, da profissão e a legislação nacional. O que Leonardo e Mariana fizeram com essas investigações internas? Como garantiram o cumprimento das leis dentro da empresa em relação às horas extras?”, questionam.
Print de uma conversa de um grupo de WhatsApp intitulado “Nova Política”, que foi enviado à Fórum por uma fonte, mostra a editora de política do Estadão, Andreza Matais, orientando como deve ser feita a execução de horas extras. “Caros, fiz uma revisão hoje das horas extras de vocês. A partir de agora, hora extra só será permitida com autorização por escrito de um dos coordenadores”, exige editora no diálogo.