MASSACRE DO CARANDIRU

Carandiru 31 anos: quem foi Jocenir Prado, preso e autor de "Diário de um detento"

Parceiro de Mano Brown na letra imortalizada pelo Racionais MCs, detento conhecia a realidade no presídio e era famoso entre os internos pelos seus textos.

Mano Brown e Josemir Prado, em um dos encontros depois de sua libertação.Créditos: Reprodução/Instagram
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Uma operação da Polícia Militar no presídio do Carandiru, conhecida como Massacre do Carandiru, deixou 111 vítimas fatais em 2 de outubro de 1992, 31 anos atrás. O episódio teve ainda mais repercussão com a música "Diário de um detento", escrita pelo rapper Mano Brown e o ex-detento Jocenir Prado.

A faixa do álbum Sobrevivendo no Inferno, do grupo Racionais MC's, narra a vida de um presidiário em meio ao "circo de horrores, descrição referente à casa de detenção utilizada por Jocenir. Jocenir, como foi apresentado por Brown, conta a vivência na prisão da véspera ao dia seguinte do massacre, mesmo sendo preso anos depois do ocorrido, apenas em 1994.

"Diário de um detento" foi classificada como a 52ª maior música brasileira pela revista Rolling Stone. A Folha de S. Paulo elegeu o vídeo da música – que acumula 5,4 milhões de visualizações no YouTube – como o 2º melhor clipe brasileiro de todos os tempos.

Quem foi Jocenir Prado

Na época do Massacre do Carandiru, em outubro de 1992, Jocenir trabalhava como comerciante na região metropolitana de São Paulo. "Quando eu via aqueles presos, sentia o mesmo que a maioria sente quando vê os programas policiais da TV", afirmou em seu livro autobiográfico, que recebe o nome da canção.

Em dezembro de 1994, aos 44 anos, ele foi preso pelo crime de receptação. Conforme seus escritos, teria sido preso injustamente ao assumir a culpa de um delito que o irmão, Márcio, cometeu no seu envolvimento com uma gangue de cargas roubadas. 

A maior parte das análises críticas que se faz ao sistema são feitas da calçada, olhando para a vitrine. E eles têm de conversar com quem viveu dentro da vitrine.

Jocenir foi condenado a oito anos e três meses de prisão e foi encaminhado às cadeias públicas de Barueri e Osasco e os presídios do Carandiru e Avaré. Nas celas, passou a ser conhecido como "tiozinho" ou "velhinho", devido à idade.

Sua experiência como detento foi marcada pela tortura policial – recebeu golpes de um PM com luvas de boxe – desconfiança dos presos e rebeliões. Segundo o livro, os companheiros de cela no Carandiru, onde foi transferido em 1995, sobreviveram ao massacre: um teve parte da panturrilha arrancada pela mordida de um cachorro e outro socava as paredes de cimento para aplacar a raiva.

O autor passou a ser respeitado pelos presos, que pediam à ele que escrevesse cartas aos familiares, poemas e petições judiciais. A confiança era tamanha que redigiu o estatuto da facção Comando Democrático da Liberdade (CDL), então rival do Primeiro Comando da Capital (PCC) – originado na Casa de Custódia de Taubaté para combater a opressão dentro do sistema prisional paulista e vingar a morte dos assassinados no Carandiru.

O encontro com Mano Brown

Em uma das visitas de Mano Brown na Casa de Detenção, no ano de 1996, ele foi apresentado a Jocenir em busca de inspiração para novas músicas sobre a vida na prisão. Ao ler os escritos do detento, Brown teria gostado dos poemas: "Ele me perguntou se podia copiar uns trechos. Eu destaquei a folha do caderno e dei para ele".

Jocenir descobriu qual foi a finalidade do empréstimo de seus versos para o compositor do Racionais MC's somente quando foi transferido para Avaré, no interior de São Paulo. Ele terminou de cumprir metade de sua pena em novembro de 1998 e chegou a subir no palco de um show do grupo de rap, na Zona Norte da capital paulista.

Em 1 de dezembro de 2021, seus familiares anunciaram seu falecimento, aos 71 anos.

 

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