Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) têm conversado tanto com integrantes do governo do Distrito Federal quanto do novo governo, buscando identificar as omissões e conhecer as medidas que estão sendo tomadas diante do quadro de violência que vive a capital federal. A informação é da colunista Andréia Sadi, do G1.
Nos diálogos, uma das ações possíveis é o desmantelamento dos acampamentos bolsonaristas distribuídos pelo país, sobretudo daquele instalado em frente ao Quartel General do Exército em Brasília. Os magistrados argumentam que se os acampados fossem integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), por exemplo, já teriam sido expulsos dos locais há tempos pelos próprios militares.
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QG segue funcionando
Embora já tenham sido retiradas várias estruturas do acampamento na capital federal, bolsonaristas permanecem se manifestando no espaço e vários apoiadores do quase ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) seguem instalados por lá. Inclusive George Washington Sousa esteve lá nos últimos dias, o responsável confesso pela fabricação da bomba caseira utilizada em uma tentativa de ataque terrorista em região próxima ao aeroporto Juscelino Kubitschek no sábado (24).
Em seu depoimento à polícia, o homem, agora oficialmente acusado de terrorismo pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), afirmou ter conseguido insumos para a confecção do artefato no acampamento do QG, após conversas sobre a realização de um atentado com o objetivo de criar uma situação que em tese permitira a instauração de um Estado de Sítio pelo Presidente da República. Essas conversas também se deram no reduto bolsonarista instalado em frente ao órgão militar. Sousa também disse à Polícia Civil que foi influenciado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) a se armar e deixar sua casa para promover atos de terrorismo na capital.
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Busca e apreensão
Outra possibilidade, alternativa ao esvaziamento dos acampamentos, é a realização de uma ação de busca e apreensão nos locais. Embora não haja qualquer decisão proferida neste sentido ainda, o STF pode agir a qualquer momento e as conversas relatadas dão indícios de que a corte pode fazer isso antes da posse, caso o governo de Brasília não garanta condições seguras para a transição de poder. O advogado Lênio Streck explica que o STF pode expedir mandados para o esvaziamento de acampamentos ou para busca e apreensão nos locais. "Conforme o inquérito das fake News, o ministro relator pode agir de ofício. O plenário considerou constitucional o regimento interno", explica o jurista.
A competência de ação em relação à garantia da segurança pública coletiva é do Poder Executivo. Por isso os ministros do Supremo têm mantido tais diálogos. Integrantes do governo do DF disseram aos representantes do Judiciário o mesmo que têm declarado à imprensa: que existiria um limite de poder de polícia na “área militar”. Entretanto, de acordo com as informações de Andréia Sadi, a área assim classificada seria, na verdade, área urbana ocupada por bolsonaristas. Assim, o argumento de limitação vai se revelando apenas um pretexto para não dar uma solução aos ataques.
Medidas imediatas
Enquanto o governo do Distrito Federal vai sendo pressionado a dar respostas, os integrantes do futuro governo já preparam ações a serem tomadas assim que tomarem posse. A primeira delas é reavaliar os procedimentos de segurança para a cerimônia de posse. Alguns membros do novo governo defendem que não haja desfile em carro aberto, por exemplo. A segurança pessoal do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), atualmente realizada pela Polícia Federal, sob o comando do delegado Andrei Augusto Passos Rodrigues, permanecerá sendo conduzida dessa maneira até o dia 1º de janeiro. O futuro ministro da Defesa, José Múcio, também está em Brasília para acompanhar a situação deste momento e para contribuir com o debate sobre a segurança durante a posse.
Após a posse, a segurança presidente seguirá de forma inédita nas mãos da PF, porém sob a tutela do delegado Aleksander Castro Oliveira, uma vez que Rodrigues passará ao comando da corporação. A decisão contraria a prática de todas as transições da recente democracia brasileira, mas tende a uma preocupação a respeito do nível de aparelhamento do Gabinete Institucional da Presidência da República (GSI), hoje sob o comando do general Heleno Augusto. Esta Fórum chegou a apresentar denúncia de um integrante do órgão que relatou como os ataques terroristas a Brasília em 12 de dezembro foram concebidos dentro do GSI.
Após a posse
Outra medida é garantir investigação e responsabilização dos envolvidos em ações violentas ou terroristas, como o futuro ministro da Justiça e da Segurança Pública, Flávio Dino (PSB), tem repetido em sucessivas declarações. Para tanto, sua equipe já tem embasamento jurídico para classificar os integrantes de acampamentos como membros de uma organização criminosa. Ministros do STF teriam afirmado ao blog de Sadi que o próprio objeto dos acampamentos é criminoso: um atentado contra a Constituição Federal ao pedir intervenção federal.
Inclusive já foram solicitados 27 inquéritos para responsabilizar suspeitos de atos de vandalismo e terrorismo, mas não há resposta efetiva da gestão atual. A inexistência de qualquer prisão durante os ataques realizados em Brasília no dia 12 de dezembro, após a prisão do cacique Sererê, corroboram a avaliação, feita por interlocutores de Flávio Dino e Andrei Rodrigues.
Alvos de investigação
As investigações não devem se limitar aos integrantes de acampamentos, entretanto. Para as autoridades que assumirão funções no novo governo a partir de janeiro, além de cobrar na Justiça as omissões e convivências de Anderson Torres, atual Ministro da Justiça, a ideia é incluir o presidente Bolsonaro, pelo seu papel de incentivo às ações golpistas. O aparelhamento das instituições também será combatido. Há previsão, por exemplo, de troca no comando de pelo menos 20 das 27 superintendências da Polícia Federal. Além disso, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) deve ser retirada da tutela do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.
O que a população quer
De acordo com Marivaldo Pereira, futuro secretário de Acesso à Justiça da pasta de Dino, "a população não aguenta mais ficar tendo que lidar com esses fatos atentatórios à estabilidade institucional". Durante o programa Fórum Café desta segunda (26), ele afirmou que os anseios do povo são outros. "A população quer ver a gente discutindo projeto de desenvolvimento econômico e social, quer ver a gente discutindo como é que a gente vai enfrentar a extrema pobreza, como é que a gente vai combater a fome, como é que a gente vai devolver os recursos para a ciência e tecnologia, quando é que a gente vai retomar o pagamento das bolsas de pesquisadores e estudantes das universidades federais, é isso que a população espera do governo federal, não esse tipo de coisa que a gente vem assistindo desde que Jair Bolsonaro chegou ao poder", disse Marivaldo.
Para ele, as ações recentes fazem parte da disputa da pauta pública no país. "Esses factoides, essas ameaças, são uma desculpa para esconder a incompetência de um governo que destruiu tudo, que não construiu nada e só destruiu tudo, o que infelizmente resultou na morte de centenas de milhares de brasileiros", concluiu o futuro secretário.