A crise da saúde mental no trabalho: um problema social urgente – Por Danilo Tavares
A crise da saúde mental no trabalho não é apenas uma questão individual. Ela reflete as escolhas políticas e econômicas que determinam a forma como vivemos e trabalhamos
O Brasil enfrenta uma epidemia silenciosa que afeta milhões de trabalhadores: a crise da saúde mental no ambiente de trabalho. Os números são alarmantes. Em 2024, 472 mil pessoas foram afastadas por transtornos psicológicos como ansiedade e depressão, aumento de 68% em relação ao ano anterior. No total, 3,5 milhões de pedidos de licença médica foram registrados no país, evidenciando o colapso no bem-estar dos trabalhadores.
O impacto econômico dessa crise é devastador. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os afastamentos por transtornos mentais geram uma perda global de US$ 1 trilhão por ano. No Brasil, o governo gastou bilhões de reais apenas em benefícios previdenciários para trabalhadores afastados, sem contar as perdas com produtividade reduzida e o aumento da falta de pontualidade e da ausência do funcionário no seu posto de trabalho. Para as organizações, isso significa mais rotatividade, maior desgaste entre funcionários e prejuízos financeiros cada vez mais difíceis de reverter.
As causas do adoecimento mental o trabalho
O adoecimento mental no ambiente profissional tem origens multifatoriais. A precarização das relações de trabalho, impulsionada por um modelo econômico que prioriza a produtividade a qualquer custo, tem levado muitos trabalhadores à exaustão. Jornadas exaustivas, salários defasados, metas inatingíveis, assédio moral e insegurança profissional tornaram-se parte da rotina de milhões de brasileiros.
A pandemia da Covid-19 agravou ainda mais esse cenário. Além das pressões diárias, os trabalhadores enfrentaram isolamento social, luto pela perda de entes queridos e um aumento nas separações conjugais, fatores que contribuíram significativamente para o crescimento dos transtornos mentais. As condições de trabalho também sofreram mudanças drásticas, especialmente com o avanço da chamada “uberização”, modelo que transforma profissionais em autônomos sem garantias trabalhistas. Como consequência, milhões de pessoas enfrentam instabilidade financeira e exaustão física e mental, sem acesso a suporte adequado.
Outro agravante é a sobrecarga de trabalho. Muitas empresas e órgãos públicos reduziram seus quadros de funcionários, mas mantiveram a demanda, levando os empregados restantes a assumirem um volume de tarefas cada vez maior. A pressão por performance, aliada à falta de reconhecimento e estruturas de trabalhos inadequadas, cria um ambiente tóxico onde o desgaste psicológico se torna constante.
Boas práticas e soluções possíveis
Apesar desse cenário preocupante, alguns empregadores têm adotado iniciativas para mitigar os impactos da crise da saúde mental no trabalho. Grandes corporações vêm investindo em programas de bem-estar, oferecendo terapia ocupacional, horários flexíveis e políticas de equilíbrio entre vida pessoal e profissional.
No cenário internacional, modelos bem-sucedidos apontam caminhos promissores. A redução da jornada de trabalho na Islândia e as políticas de desconexão na França, que garantem ao trabalhador o direito de não responder a e-mails ou mensagens fora do expediente, demonstram que funcionários mais descansados são também mais produtivos.
A urgência de políticas públicas eficazes
Diante desse contexto, é essencial fortalecer os direitos trabalhistas e garantir que a legislação proteja efetivamente a saúde mental dos trabalhadores. A recente atualização da Norma Regulamentadora NR1, que obriga empresas a identificarem e mitigarem riscos psicossociais, representa um avanço. No entanto, sem fiscalização rigorosa e penalizações exemplares para empregadores negligentes, a medida pode se tornar ineficaz.
Para que essas normas sejam cumpridas, é imprescindível um aumento no efetivo das promotorias do trabalho e do Ministério do Trabalho e Emprego, responsáveis por investigar denúncias e garantir o cumprimento da lei. Os sindicatos também precisam atuar de forma mais ativa na defesa dos trabalhadores, fornecendo suporte jurídico e denunciando práticas abusivas.
Trabalho digno deve der prioridade
Empresas e órgãos públicos têm o dever de promover ambientes de trabalho saudáveis e humanizados. Redução da carga horária, flexibilização do home office, suporte psicológico, formação de lideranças empáticas e conforto térmico e sonoro são algumas das ações fundamentais para reverter esse quadro alarmante.
O modelo de sociedade atual, que glorifica a hiperprodutividade e minimiza a importância dos direitos trabalhistas, tem gerado uma população exausta, doente e infeliz. A busca pelo lucro sem limites ignora as necessidades humanas e compromete o futuro da sociedade como um todo. Se quisermos um Brasil mais justo e saudável, precisamos romper com essa lógica exploratória e lutar por condições dignas de trabalho.
A crise da saúde mental no trabalho não é apenas uma questão individual. Ela reflete as escolhas políticas e econômicas que determinam a forma como vivemos e trabalhamos. Os dados e informações apresentados neste texto foram extraídos do recente episódio do podcast “O Assunto” – “Crise mental: o impacto no trabalho”, disponível no YouTube, além de fontes como a Organização Mundial da Saúde (OMS).
A mudança precisa acontecer agora. Não podemos mais ignorar esse problema.
-Assine a petição pelo fim da escala 6x1.
-Portaria que atualiza a Norma Regulamentadora NR1.
-Denúncias ao Ministério do Trabalho e Emprego.
*Danilo Tavares (@danilotavaressol) é produtor cultural, funcionário público municipal e secretário de comunicação do PSOL de São Vicente, além de membro do Conselho de Economia Solidária de São Vicente e do Fórum de Economia Solidária da Baixada Santista e diretor da Casa Crescer e Brilhar.
**Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.