A sexta ‘micareta golpista’ do ano foi realizada neste domingo (29) na Avenida Paulista, convocada por Jair Bolsonaro e aliados sob o slogan “Justiça Já”, numa tentativa de pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF) em meio ao julgamento que já tornou o ex-presidente réu por suposto envolvimento nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.

Por volta das 15h30 Bolsonaro discursou. Em tom de balanço político, afirmou ter chegado à Presidência em 2018 por um “milagre” — citando a facada que sofreu em Juiz de Fora — e creditou parte do sucesso ao trabalho do filho, o vereador Carlos Bolsonaro, a quem chamou de peça-chave de sua estratégia de comunicação.
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Bolsonaro lamentou a derrota na eleição de 2022, voltou a atacar o STF — que, segundo ele, “pôs a mão pesada na balança” — e afirmou ter sido alvo de acusações de genocídio e racismo. Criticou novamente o resultado das urnas e justificou sua saída do país dizendo que “jamais passaria a faixa para um ladrão”, em referência ao presidente Lula.
No trecho mais polêmico, Bolsonaro minimizou o ataque golpista de 8 de janeiro de 2023, questionando as prisões e as condenações dos envolvidos. Disse que não havia armas, que “apenas estilingues e bolinhas de gude” foram apreendidos, e chamou as penas — que chegam a 17 anos de prisão — de “brutal injustiça”.
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O ex-presidente inelegível e às portas da prisão ainda pediu apoio político para voltar a ter força no Congresso: “Se vocês me derem 50% da Câmara e 50% do Senado, eu mudo o destino do Brasil. Nem preciso ser presidente. Faremos isso por vocês”, disse.
Tropa bolsonarista
O ato começou por volta das 14h, em frente ao vão livre do Masp, na Avenida Paulista. Além de Bolsonaro, estão presentes s governadores Tarcísio de Freitas (SP), Romeu Zema (MG), Cláudio Castro (RJ) e Jorginho Mello (SC), além de senadores como Marcos Rogério, Flávio Bolsonaro e Magno Malta, todos do PL, e o presidente do partido, Valdemar Costa Neto.
Deputados como Marco Feliciano, André do Prado, Bia Kicis e Gustavo Gayer, além do vice-prefeito de São Paulo, Coronel Ricardo Mello Araújo, também participaram.
Por volta das 15h, Tarcísio discursou defendendo Bolsonaro, criticando o governo federal e os juros altos, pedindo anistia e prometendo “resposta nas urnas”. Depois, o pastor Silas Malafaia atacou o STF por decidir sobre a responsabilidade das redes sociais por postagens criminosas.
Anistia para golpistas
Além do apoio a Bolsonaro, o evento reforça pedidos anteriores, como a anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro, os “malucos” - como disse Bolsonaro durante depoimento ao ministro Alexandre de Moraes no dia 10 de junho sobre os próprios apoiadores - “que ficam com aquela ideia, de AI-5, intervenção militar”.
Manifestantes vestiam verde e amarelo, agitavam bandeiras do Brasil, EUA e Israel, concentrados próximo ao palco montado no cruzamento com a Alameda Ministro Rocha Azevedo.
Este é o sexto grande ato convocado pelo ex-presidente na Paulista desde que deixou o Planalto. Para os organizadores, o tamanho do público importa menos do que o recado político de pressionar o STF em nome de “justiça” e “liberdade”.
Ao rolar o feed no X, as imagens da "micareta golpista" mostram menos público — dependendo do ângulo, se não for montagem, IA ou foto antiga. Público menor ou não, há muito “maluco”.
Confira registros nas redes
Refresque a memória
Bolsonaro e mais sete aliados respondem por cinco crimes graves: organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, instigação de golpe de Estado, dano qualificado com violência e deterioração de patrimônio tombado. Se condenado, pode pegar de 20 a 26 anos de prisão.
Não custa lembrar quais crimes pesam sobre os “malucos” que vandalizaram Brasília em 8 de janeiro de 2023: associação criminosa armada, golpe de Estado, tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito, terrorismo, incitação ao crime, dano qualificado, destruição de patrimônio tombado, invasão de prédios públicos, entre outros.
Naquele domingo, cerca de 5 mil manifestantes invadiram Congresso, STF, Planalto e Esplanada para tentar reverter a posse do presidente Lula, deixando um rastro de destruição em obras de arte, móveis históricos e documentos.
Mais de 1.400 foram presos em flagrante; ao todo, 2 mil pessoas foram detidas nos dias seguintes. Destas, 919 foram denunciadas, sendo 219 por crimes mais graves, e até agora 480 já foram condenadas, com penas de 3 a 17 anos e meio de prisão.
O prejuízo estimado chega a R$ 26 milhões, sendo R$ 12 milhões só no STF, e a AGU já cobra R$ 56 milhões na Justiça para reparar os cofres públicos — com R$ 3 milhões já bloqueados de réus.
Contra a justiça tributária
Também não faltaram ataques às propostas de justiça tributária do governo Lula — um exemplo recente foi o veto do Congresso à tentativa de ajustar as regras do IOF.
A equipe econômica queria elevar o IOF em algumas operações para ampliar a arrecadação de forma mais equilibrada, cobrando mais de quem movimenta grandes valores para aliviar a carga de quem ganha menos. A proposta foi barrada, mantendo a distorção que faz o imposto pesar proporcionalmente mais no bolso de quem mais precisa de crédito ou faz pequenas transações.
A hipocrisia da "Justiça Já" bolsonarista
Enquanto os bolsonaristas clamavam por "Justiça Já" para livrar Bolsonaro da cadeia, as propostas de justiça tributária — como o ajuste no IOF, vetado pelo Congresso com apoio do bolsonarismo, ou a Taxação BBB (bilionários, bancos e bets) — seguem barradas, mantendo a distorção que faz o imposto pesar proporcionalmente mais sobre quem mais precisa de crédito ou faz pequenas operações.
Os parlamentares bolsonaristas que discursam por "Justiça Já" para Bolsonaro não estão interessados em justiça para a maioria da população. Em sintonia com o centrão — vem avançando em pautas que ampliam privilégios e pressionam ainda mais a renda de quem já vive no limite.
Na semana passada, a Câmara aprovou em dois turnos a PEC que aumenta o número de deputados federais, ampliando de 513 para 550 vagas. A proposta, defendida abertamente por partidos do centrão e bancada bolsonarista, cria novas cadeiras sob o argumento de “corrigir distorções” de representatividade, mas na prática amplia custos do Congresso — cada novo parlamentar custa, em média, R$ 240 mil por mês aos cofres públicos, somando salários, gabinete e verbas de estrutura.
Em paralelo, deputados da base bolsonarista foram decisivos para aprovar um projeto que eleva a conta de luz. Na prática, trata-se da inclusão de incentivos bilionários para grandes empresas do setor elétrico, bancados por todos os consumidores. Pelas estimativas da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), essa conta extra pode chegar a R$ 26 bilhões repassados diretamente à tarifa paga por residências e pequenos negócios — um custo que pesa especialmente para famílias de baixa renda, que já comprometem até 10% do orçamento doméstico só com eletricidade.
E não para por aí: nos bastidores, líderes governistas do centrão e aliados de Bolsonaro articulam a votação de um projeto que flexibiliza o descanso semanal remunerado, na prática permitindo que empresas escalem trabalhadores por até 12 dias seguidos, pagando folga em outra data. Entidades sindicais apontam que a mudança é um ataque direto a um dos direitos trabalhistas mais antigos, garantido desde a Constituição de 1943, e que atinge principalmente categorias precarizadas, como comércio, serviços e entregadores.
Enquanto no palanque o discurso clama por “Justiça Já” — mirando no STF e em processos que podem manter Bolsonaro inelegível e na prisão —, na prática a aliança bolsonarismo-centrão segue aprovando pacotes que beneficiam a elite política e econômica, enquanto transferem a fatura para quem ganha menos.