O Fórum Onze e Meia desta segunda-feira (16) recebeu o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, para comentar sobre os programas do governo federal e os cenários nacional e internacional sobre o tema. O ministro analisou os ataques da extrema direita à Organização Mundial de Saúde (OMS), a nova iniciativa "Agora Tem Especialistas" e a reposição de profissionais brasileiros no programa Mais Médicos.
Padilha afirmou que o abandono da OMS por parte de governos de extrema direita é um movimento "absurdo" liderado por Donald Trump. Ao assumir a presidência em janeiro deste ano, o empresário retirou novamente os Estados Unidos da organização. Já em maio, o secretário de Saúde, Robert F. Kennedy Jr., classificou a OMS como "moribunda" e pediu que outros países deixassem o órgão. No mesmo mês, o presidente da Argentina, Javier Milei, seguiu a ordem e retirou o país.
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"A OMS tem um papel muito importante, inclusive para esses países [Estados Unidos e Argentina]", afirmou Padilha, relembrando que esteve, nos dias 13 e 14 de junho, em uma reunião de ministros do Mercosul, em Buenos Aires. O Brasil assumiu a presidência pro tempore (temporariamente) do órgão.
"A gente sabe da importância dos dados que a OMS organiza, da compra de medicamentos, de vacinas do fundo rotatório da Organização Pan-Americana de Saúde, inclusive para ajudar a Argentina a enfrentar seus problemas, inclusive para ajudar os Estados Unidos", acrescentou o ministro. Isso porque dados dos dois países para cálculo de risco de epidemia passam pela OMS. "Então, a situação é absurda", afirmou o ministro.
Por outro lado, Padilha defendeu que também vê o cenário como uma oportunidade, para o campo progressista e para aqueles que defendem a ciência, de isolar a extrema direita. O ministro disse que, durante a reunião do Mercosul, a posição antivacina foi isolada. "O próprio ministro da Argentina não falou lá sobre a OMS, porque se falasse ia ter um isolamento total com os demais. E a nossa presidência pro tempore do Mercosul vai buscar isolar ainda mais essa postura da extrema direita", comentou Padilha.
O ministro ainda afirmou que os representantes pretendem fazer um Dia D Nacional do Mercosul de Vacina. Além disso, Padilha contou que informou, durante encontro com o setor industrial da Argentina no sábado (14), que não quer o Mercosul submetido às posturas de Trump, não só em relação à OMS mas a outros temas, já que o presidente dos EUA também vem adotando um comportamento de perseguição a pesquisadores e redução de investimentos na área farmacêutica, de acordo com o ministro.
O objetivo, então, é "ampliar uma aliança com um setor importante que está sentindo os impactos das ações do Trump em relação a isso", disse Padilha. Para isso, o Brasil vai "tomar a frente" desse processo para atrair recursos e investimentos para pesquisa de vacina que os EUA estão rejeitando e trazer para o país.
Um exemplo disso é a produção de vacinas tipo RNA mensageiro, que, apesar de ter sido fundamental para o combate à pandemia de Covid-19, foi rejeitada pelos Estados Unidos devido ao discurso negacionista de que ela "colocaria chip nas pessoas". "Então, o governo brasileiro vai fazer no Butantã e na Fiocruz duas plataformas de produção de vacina RNA mensageiro. Nós estamos fazendo uma ação de atração desses pesquisadores que estão sendo retirados dos Estados Unidos", anunciou Padilha.
A intenção do Brasil é, segundo o ministro, criar um ambiente, junto com a indústria farmacêutica europeia, para atrair esses pesquisadores que estão sendo perseguidos. "Então, eu acho que nós temos que constituir uma barreira aqui a partir do Brasil e do Mercosul de resistência a essa ação do Trump contra a vacina, contra a ciência, contra a Organização Mundial de Saúde", defendeu o ministro.
Padilha explica por que Trump foi contra acordo pandêmico
O ministro também citou que o Brasil teve um papel fundamental na assinatura de um acordo histórico da OMS há três semanas. O documento, chamado de "acordo pandêmico", prevê regramentos que devem ser seguidos pelos países em caso de pandemia. Durante a reunião, o secretário de Saúde dos EUA, Robert F. Kennedy Jr., gravou um vídeo em que criticava o acordo. A gravação foi a mesma em que ele chamou a OMS de "moribunda".
Padilha explicou que os EUA se colocam contra o acordo porque um ponto-chave do documento é o compartilhamento de tecnologia, que prevê que países desenvolvidos devem colaborar com o desenvolvimento de vacinas e medicamentos para combater pandemias ao redor do mundo.
"Muitas vezes as pandemias surgem na periferia dos países centrais, né? Os patógenos, os vírus surgem nos países mais pobres, nos países tropicais, e os países mais ricos obrigam esses países a mandar as informações - o que está correto dentro do fluxo da OMS, é importante essa informação ser repassada - só que eles desenvolvem medicamentos, vacinas, tecnologias para enfrentar esses vírus sem compartilhar essa produção com os países de onde surgiu a identificação", explicou o ministro.
"Então, uma das questões chaves do acordo pandêmico - e o Trump era contra - é a obrigação de compartilhamento. Ou seja, é obrigado a informar, mas quem tem condições de produzir a tecnologia é obrigado a compartilhar essa tecnologia com os países que informaram o surgimento daquele vírus, daquela bactéria, daquele patógeno que está criando a pandemia", acrescentou Padilha.
Novo programa "Agora Tem Especialistas"
O ministro também falou sobre o novo programa do governo federal, o "Agora Tem Especialistas", lançado no final de maio com o objetivo de reduzir as filas de espera pelo Sistema Único de Saúde (SUS) com a maior oferta de médicos. Padilha classificou a iniciativa como a "maior mobilização já feita para a área da saúde, depois da pandemia, para tentar enfrentar um problema".
Padilha esclareceu que, apesar de as pessoas conseguirem atendimento mais fácil hoje nas unidades de saúde, a espera ainda é grande em caso de encaminhamento para médicos especialistas. "Essa espera aumentou ainda mais por conta da pandemia, por conta da postura criminosa do Bolsonaro. A gente teve a pandemia por mais tempo no Brasil, com mais hospitais lotados, então muitas cirurgias, exames, foram cancelados, tudo isso ficou represado e veio tudo para cima do Sistema Único de Saúde agora", esclareceu o ministro.
Diante disso, Padilha afirmou que, durante os dois primeiros anos do governo Lula, houve um esforço do Ministério da Saúde para acelerar essas cirurgias, o que fez com que o SUS batesse recorde de cirurgias eletivas em 2024, mas que isso ainda é insuficiente. O "Agora Tem Especialistas" busca resolver esse cenário ao utilizar tanto a estrutura pública quanto privada para atendimento de pacientes do SUS com foco em seis áreas prioritárias: oncologia, ginecologia, cardiologia, ortopedia, oftalmologia e otorrinolaringologia.
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Retomada de brasileiros no Mais Médicos
Outro tópico debatido por Padilha foi a ampliação do número de brasileiros no programa Mais Médicos, que antes era formado, majoritariamente, por profissionais cubanos. O ministro explicou que esse cenário se reverteu devido à política implementada pelo governo de Dilma Rousseff (PT), em 2013.
Padilha destacou que o Mais Médicos, lançado naquele ano, e que foi tão criticado, previa três eixos de atuação. O primeiro era construção e reforma de unidades de saúde; o segundo tinha o objetivo de levar médicos para áreas em condições mais críticas de saúde. A prioridade nesse segundo tópico era para médicos brasileiros, mas, caso eles não quisessem, a busca seria por profissionais estrangeiros, o que levou à busca por médicos cubanos, já que Cuba tinha a maior experiência de provimento de seus profissionais.
No entanto, foi o segundo eixo que resultou na ampliação de médicos brasileiros. "O terceiro eixo, que as pessoas não falavam tanto, era abrir novas oportunidades para o jovem brasileiro se formar médico. Então, a gente abriu novos cursos de medicina em universidades públicas e alguns em universidades privadas em áreas específicas", esclareceu o ministro. "Isso fez com que hoje a gente forme muito mais médicos no Brasil do que a gente formava lá em em 2013", disse.
"Então, nós estamos colhendo um resultado positivo de algo que foi planejado lá em 2013, que é dar mais oportunidades para os jovens brasileiros poderem fazer curso de medicina".
Confira a entrevista completa do ministro Alexandre Padilha ao Fórum Onze e Meia
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