Com claras pretensões de conquistar definitivamente o espólio eleitoral do ex-chefe, Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos) prestou um depoimento morno como testemunha de defesa do ex-presidente no Supremo Tribunal Federal (STF) e disse que "jamais" teve conhecimento de uma articulação golpista, afirmando apenas que nas vezes em que esteve com Jair Bolsonaro (PL) após a derrota para Lula o encontrou "triste, resignado".
"Jamais [tive conhecimento de intenções golpistas]. Nunca. Assim como nunca tinha acontecido no meu período de ministério. Nesse período em que estive com o presidente nessa reta final, nas visitas que eu fiz, ele jamais tocou nesse assunto e não mencionou qualquer tipo de ruptura. Encontrei um presidente triste, resignado. Esse assunto nunca veio à pauta", disse Tarcísio.
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A declaração vai ao encontro do que Bolsonaro tem pedido às testemunhas indicadas por ele, como o general Hamilton Mourão (Republicanos-RS), que confessou ter recebido uma ligação do ex-presidente com um roteiro para o depoimento ressaltando que ele negasse quaisquer tentativas de "ruptura institucional". Após a declaração ventilar na Procuradoria-Geral da República (PGR), que chegou a cogitar a prisão preventiva do ex-presidente, Mourão voltou atrás.
Nesta sexta-feira, o ex0ministro da Casa Civil, o senador Ciro Nogueira, presidente nacional do PP, também depôs e disse que "foi tudo dentro da normalidade e o presidente em momento nenhum quis obstaculizar”.
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Nas redes, Jair Bolsonaro comemorou com uma publicação em que aparece ao lado de Tarcísio o depoimento do ex-ministro. "'Jamais', diz Tarcísio sobre hipótese de golpe de Bolsoaro", diz reportagem no print compartilhado.
A Primeira Turma do Supremo já ouviu mais de 30 testemunhas indicadas pelas defesas dos réus até o momento. O depoimento de Tarcísio foi colhido por videoconferência e faz parte da fase de instrução da ação penal em que Bolsonaro é réu por tentativa de golpe de Estado.
As reuniões no Alvorada
Segundo registros obtidos pela Polícia Federal (PF) e pela Procuradoria-Geral da República (PGR), Tarcísio esteve com Bolsonaro no Palácio da Alvorada em duas datas-chave: 19 de novembro e 11 de dezembro de 2022. Ambas as visitas ocorreram semanas após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas urnas e são mencionadas nos autos da investigação como momentos em que o entorno do então presidente discutia estratégias para impedir a posse do presidente eleito.
No caso de 19 de novembro, Bolsonaro teria se reunido também com Filipe Martins, seu assessor especial para assuntos internacionais, apontado como um dos principais articuladores da minuta golpista. A minuta, localizada pela PF na casa do ex-ministro Anderson Torres, previa a decretação de estado de defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a anulação do resultado da eleição presidencial.
Já em 11 de dezembro, a visita de Tarcísio coincidiu com outro momento de ebulição golpista: nessa mesma semana, a PF aponta que militares e civis ligados ao governo discutiam medidas para manter Bolsonaro no poder, inclusive com apoio logístico das Forças Armadas.
Desconfiança
Apesar de ainda ser tratado publicamente como aliado, o nome de Tarcísio passou a circular entre os bastidores bolsonaristas com crescente desconfiança. O silêncio do governador diante dos novos desdobramentos da investigação, somado ao distanciamento de figuras-chave do bolsonarismo e à tentativa de construir uma imagem mais moderada nas redes sociais, tem gerado desconforto no núcleo mais fiel ao ex-presidente.
A reação do pastor Silas Malafaia – que o chamou de “urubu” ao lado de outros articuladores do centrão – evidenciou o racha interno e expôs o temor de que Tarcísio esteja pavimentando sua candidatura presidencial às custas do enfraquecimento de Bolsonaro.