No Fórum Onze e Meia desta quarta-feira (5), o ex-ministro da Educação, da Justiça e das Relações Institucionais Tarso Genro falou sobre o cenário político do Brasil atual e as perspectivas para a disputa eleitoral de 2026. Genro comentou sobre o governo Lula e seus desafios atuais e futuros, a ascensão da extrema direita e a possível prisão ou candidatura de Jair Bolsonaro.
Confira abaixo os principais trechos da entrevista de Tarso Genro ao Fórum Onze e Meia e a íntegra no final desta reportagem.
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Movimento suprapartidário de ex-ministros
Genro iniciou a entrevista comentando sobre a criação de um movimento suprapartidário composto por ex-ministros, analistas, intelectuais e outras personalidades para discutir o futuro político do Brasil diante do embate de forças e das ameaças da extrema direita em relação ao campo democrático.
"Nós partimos de uma análise mais ou menos homogênea entre nós, cada um com as suas peculiaridades, suas características, que teria que surgir um movimento no país que não colocasse como ponto de partida quem vai ser o próximo presidente da República, porque o próximo presidente da República, se a situação do Congresso Nacional, da Câmara e do Senado, continuar a mesma, ele vai ser um presidente limitado por todo esse processo de extorsão orçamentária, que a maioria do parlamento do Brasil, no Congresso da Câmara, faz para qualquer presidente", explicou o ex-ministro.
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Genro afirma que, desde 1980, há em maior ou menor grau uma desconstituição do poder do presidente da República e uma submissão de funções do Executivo para dentro do Congresso, "que manipula interesses regionais, oligárquicos, espúrios, a partir da apropriação de uma grande parte do orçamento público".
"Isso adquiriu uma dimensão extraordinária agora neste terceiro governo do presidente Lula, porque se formou uma espécie de santa aliança no congresso. Uma aliança entre a direita conservadora tradicional, a extrema direita bolsonarista, fascista, um grande número de políticos tradicionais que têm relações oligárquicas muito estáveis nas regiões e foram puxando para dentro do seu poder deliberativo um enorme volume de recursos orçamentários, descaracterizando as funções da Presidência da República de uma parte, e de outra instalando um parlamentarismo pervertido em última análise", afirmou Genro.
"Então, essas conversas em ramos que nós fizemos nas redes, uma série de dirigentes políticos, ex-dirigentes políticos, intelectuais, artistas, profissionais liberais, homens e mulheres de todos os setores da academia, nós tivemos a ideia de lançar um movimento para criar um contorno estratégico para frente políticas regionais que fossem repercutindo depois numa frente política nacional para mudar a composição do congresso. Particularmente, é muito importante mudar a composição do Senado, que é a estrutura federativa de integração nacional do ponto de vista político mais importante da Constituição", defende o ex-ministro.
Questões estratégicas para o governo e para a sociedade civil
Tarso ainda afirma que há três questões estratégicas que o governo e a sociedade civil progressista e democrática têm que lidar para chegarem em boas condições de disputa eleitoral em 2026. O ex-ministro aponta: a relação de forças no Congresso Nacional, o desafio da Segurança Pública e o combate à crise climática.
"A primeira questão é a relação de forças que vai ter o Congresso Nacional e particularmente o Senado no próximo ano. A segunda grande questão é a segurança pública. O que nós vamos dizer para a sociedade, no fim do governo Lula, sobre o que fizemos da segurança pública? Nós temos duas forças burocráticas institucionais da mais alta relevância e de respeito internacional aqui no Brasil, que é a nossa Polícia Rodoviária Federal, que a nossa Polícia Federal, que, em última análise, o conjunto de instituições de controle e de inteligência política hoje no Brasil que estão funcionando de maneira muito mais adequada do que funcionavam antes."
O ex-ministro ainda aponta a questão da crise climática, "que vai informar o conteúdo de todos os programas governamentais do próximo período, que são questões rejeitadas pela extrema direita e pelo fascismo aqui no Brasil".
Tarso acrescenta que o governo deve ter uma visão homogênea em relação aos últimos dois problemas, da Segurança Pública e da crise climática, e mais "empatia" com mudança na correlação de forças no Congresso Nacional no próximo período.
A ameaça do extrema direita fascista
O ministro também falou sobre a ascensão cada vez maior da extrema direita fascista na política brasileira. Genro defendeu que deve haver um movimento democrático forte o bastante para isolar processualmente essa ala política.
"Nós temos uma direita conservadora aqui no país que é uma direita que ainda está no campo democrático, que ninguém quer que ele se desloque para a extrema direita. Mas hoje nós temos uma polarização muito clara no país, que é de um lado uma extrema direita golpista, rançosa, com tendências fascistizantes, que é alavancada pelas redes globais ancoradas em plataformas, inclusive de alto poder conversível contra as democracias que se instalaram, que são vigentes hoje na América Latina e também em todo mundo. E temos um outro campo que nós queremos que seja um campo democrático estável, ou seja, aqueles que não aceitam qualquer tipo de golpe e não aceitam que a extrema direita tenha legitimidade novamente para assumir o poder através do processo eleitoral", afirma.
"Então, nós temos uma extrema direita que hoje forma o polo anti-democrático do país, radicalmente anti-democrático, que tem que ser isolado processualmente, tem que ser deixado no seu tamanho normal, no seu tamanho reduzido, porque essas pessoas não querem conviver na democracia. E elas são agressivas em todos os poros da sociedade, seja num ato de formatura, seja numa eleição sindical, nas movimentações de rua."
"São pessoas doentias, agressivas, são aquelas que botavam um telefone na cabeça, para se comunicar com os extraterrestres, aquelas pessoas que se ajoelharam perante pneus. Mas estes doentes mentais, eles são a minoria, a maioria deles é uma minoria social muito vinculada àquela visão hitlerista, fascista e mussolínica de constituição do poder político. Alguns deles com mandato, inclusive", acrescenta Genro.
O ex-ministor completa que o campo democrático tem que estar preocupado desde agora não somente com os processos judiciais que os líderes da extrema direita estão respondendo, mas também com o "papel que eles vão ocupar na próxima fase de consolidação da nossa democracia no país".
"Eu tenho impressão que se nós tivermos uma democracia com essas dificuldades de implementar programas sociais, de implementar projetos estratégicos para agregar socialmente o país, para fazer as pessoas conviverem na política democrática de maneira normal, e se nós perdermos essa oportunidade em 2026, pode ser que nós não consigamos recuperar a estabilidade estratégica que o país precisa para se desenvolver e para ser um líder da América Latina, com uma presença forte em todo mundo."
O novo desafio de Lula
Questionado sobre os próximos desafios de Lula para aumentar sua popularidade e avaliações positivas para a campanha eleitoral de 2026, o ex-ministro apontou que, ao contrário do que defendem outras personalidades do entorno do governo, o novo desafio do presidente não se refere às entregas e programas sociais, mas sim à uma construção de um sentimento que agregue a nação brasileira diante da globalização.
"O presidente tem uma experiência extraordinária de entregas de programas sociais, de obras, de realizações ao longo dos seus governos. Eu acho que o problema é outro, é qual vai ser o discurso político que o Lula vai fazer para agregar a nação nesse próximo período da globalização, que reflete não só na estrutura jurídica e política interna do Brasil, mas também na ideologia que as pessoas vão adquirindo em relação às suas necessidades, ao tipo de sociedade que está sendo formada, às relações que elas têm com o consumo e sobretudo em relação ao seu futuro. Tem uma semântica para abordar essa questão que eu vi colocada num determinado momento por um grande sociólogo brasileiro, o Jessé Souza, que ele diz o seguinte: 'olha, o negócio não é mais garantir as três refeições por dia'. Isso aí vai ser uma questão sempre presente. Todo mundo sabe que o governo Lula é o governo que mais garantiu três refeições por dia para a nossa população. Então, o que se disputa hoje é o imaginário das classes sociais no Brasil, das classes subalternas e daquelas que, de maneira fracionada ou integral, participam do pacto democrático, sobre o que é o seu futuro."
"A nossa sociedade vai ser uma sociedade da descartabilidade, dos excessos de consumo motivados pela publicidade para os extratos superiores da população. Exclusivamente do consumo necessário das populações para sobreviverem com dignidade. Ou vai ser uma sociedade articulada em cima de uma ideia de nação, uma ideia de convívio social, de uma ideia de redução das desigualdades, de combate aos preconceitos, de uma educação de alto nível para que as pessoas convivam no novo mundo?", pontua o ex-ministro.
O futuro de Bolsonaro
O ex-ministro também falou sobre o futuro político do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que pode ser preso por tentativa de golpe de Estado em 8 de Janeiro de 2023, já está inelegível por 8 anos, mas mesmo assim defende sua candidatura em 2026. A Procuradoria-Geral da República (PGR) deve apresentar a denúncia contra Bolsonaro nos próximos dias.
Questionado sobre a possibilidade de Bolsonaro se candidatar em 2026, Genro afirmou que não acredita nesse cenário, pois acha que o ex-presidente será defenestrando pelos seus aliados. "Eu acho que ele vai continuar tentando se apresentar, certamente vai sofrer alguma denúncia do Ministério Público Federal, vai ser processado, não sei se vai ser preso pelo acúmulo de provas que já tem contra ele. Mas todo mundo sabe hoje que ele tentou um golpe de Estado, que ele foi se homiziar nos Estados Unidos para não sentir os efeitos da retorsão se esse golpe de Estado não funcionasse. Aí o grupo dele se desmantelou, um começou a denunciar o outro e todo mundo quer salvar sua pele."
"Então, eu acho que não será candidato, acho que o candidato mais provável vai sair do seu entorno, das suas relações tradicionais. Provavelmente o Tarcísio, governador de São Paulo. Porque os demais líderes da extrema direita aqui no país não têm prestígio político, nem o seu meio, para coesionar o seu pessoal em direção a uma nova eleição", afirmou Genro.
Confira a entrevista completa do ex-ministro Tarso Genro ao Fórum Onze e Meia abaixo: