Cassada na última quinta-feira (30) pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) por abuso de poder político, a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) ainda pode recorrer ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e, até a análise do recurso, manterá seu mandato.
As chances da bolsonarista radical reverter a situação e não ser cassada, entretanto, são mínimas. O TSE, segundo especialistas ouvidos pela Fórum, deverá manter a decisão da corte paulista e confirmar a perda do mandato de forma célere, antes das eleições de 2026.
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Zambelli foi cassada por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação para divulgação de fake news sobre o sistema eleitoral brasileiro durante as eleições de 2022. Além disso, foi condenada à inelegibilidade por 8 anos.
A ação foi movida pela deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) após a bolsonarista divulgar vídeos com informações falsas sobre o processo eleitoral. Entre as alegações estão histórias mentirosas, como a de que urnas seriam manipuladas em um sindicato no interior de São Paulo e de que um suposto grupo de técnicos da Justiça Eleitoral teria pleno controle sobre os resultados por possuir o código-fonte das urnas.
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No acórdão sobre a cassação de Zambelli, o TRE-SE declarou que a parlamentar utilizou seus perfis nas redes sociais para “disseminar informações falsas, incitando animosidade contra o sistema eleitoral e o Poder Judiciário, com o escopo de comprometer a normalidade e a legitimidade das eleições”.
“Não é demasiado se reconhecer que as condutas da representada alcançaram repercussão e gravidade aptas a influenciar na vontade livre e consciente do eleitor e em prejuízo da isonomia da disputa eleitoral. Portanto, realidades justificadoras da cassação do diploma de deputada federal e da declaração de inelegibilidade, sanções a ela impostas por prática de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação”, disse o relator do caso desembargador José Antonio Encinas Manfré.
Cassação de Zambelli confirmada antes de 2026
Advogados especialistas em direito eleitoral ouvidos pela Fórum afirmam que o TSE não somente deve confirmar a decisão do TRE-SP de cassar Zambelli e condená-la à inelegibilidade, bem como deve fazê-lo ainda este ano ou, no mais tardar, no início de 2026.
Luiz Eduardo Peccinin, advogado eleitoralista e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), explica que o TSE já possui uma jurisprudência bastante embasada para casos do tipo, relembrando que a situação de Zambelli é similar a do ex-deputado Fernando Francischini, do Paraná, cassado e condenado à inelegibilidade exatamente pelo mesmo motivo.
O caso de Francischini é notório e abriu precedentes para outras condenações por motivos semelhantes. Em 2018, quando ocupava o cargo de deputado federal, justamente no dia da eleição que se candidatou a deputado estadual, Francischini fez uma live para espalhar a notícia falsa de que duas urnas estavam fraudadas e, aparentemente, não aceitavam votos no então candidato à presidência da República Jair Bolsonaro. Na transmissão, ele também afirmou que urnas tinham sido apreendidas e que ele teria tido acesso a documentos da Justiça Eleitoral que confirmariam a fraude - uma mentira.
Vale lembrar, ainda, que o ex-presidente Jair Bolsonaro também foi condenado pelo TSE à inelegibilidade por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação para divulgar notícias falsas e conspirações contra o sistema eleitoral brasileiro.
"A situação da deputada é bastante similar com o caso Francischini. O TRE-SP reconheceu que Zambelli divulgou desinformação sobre o processo eleitoral e reconheceu o abuso de poder político e dos meios de comunicação pela deputada. O caminho para reverter será difícil para ela perante à Corte", afirma o advogado Luiz Eduardo Peccinin.
Também ouvida pela Fórum, a advogada Carla Nicolini, especialista em Direito Eleitoral e membro da Abradep, foi na mesma linha e cravou que a jurisprudência do TSE abre caminho para que Carla Zambelli tenha sua cassação confirmada após apresentação do recurso.
"O TSE deve confirmar a decisão do TRE-SP de cassar o diploma da deputada federal Carla Zambelli. O entendimento jurisprudencial do TSE sobre abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, especialmente em relação à disseminação de desinformação sobre o processo eleitoral, está alinhado com as condutas atribuídas à Carla Zambelli. O TSE já se posicionou no sentido de que a propagação de informações falsas e o ataque infundado ao sistema eleitoral, com o objetivo de desacreditar a legitimidade do pleito, configuram abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, autorizando a aplicação de sanções, como a cassação de mandato. Portanto, considerando a gravidade das condutas atribuídas à Carla Zambelli e a jurisprudência consolidada do TSE, é provável que a Corte Superior mantenha a decisão de cassar o diploma da deputada federal", crava a especialista.
Ambos os advogados avaliam, ainda, que o processo será rápido e que Zambelli deverá ter sua cassação confirmada pelo TSE antes das eleições de 2026.
"O recurso deve chegar entre fevereiro e março ao TSE, mas até o julgamento dependerá da pressa do tribunal de encerrar a questão e se ela conseguirá recorrer com o mandato ou fora dele. Todavia, é seguro dizer que o tribunal deverá, sim, julgar a questão antes das próximas eleições, visto que a situação afeta diretamente a elegibilidade da deputada", analisa Luiz Eduardo Peccinin.
"Não é possível saber quanto tempo demora para subir para o TSE, talvez um ou dois meses. O TSE, por sua vez, deve priorizar o julgamento em razão do término do mandato em 2026, para garantir a eficácia da decisão. Se o recurso subir nos próximos meses, é possível que o julgamento do TSE seja no segundo semestre deste ano ou no início do próximo", pontua, por sua vez, Carla Nicolini.
Outros deputados do PL vão perder o mandato
Uma vez que o TSE confirmar a cassação de Carla Zambelli, os 946.244 votos que a deputada recebeu nas eleições de 2022 serão anulados. Com isto, de dois a três deputados do PL eleitos pelo seu coeficiente eleitoral também serão afetados pela decisão e perderão seus mandatos.
Francisco Everardo Oliveira Silva, o Tiririca, e Paulo Bilynskyj, são os primeiros da "fila" que foram eleitos com os votos de Zamebelli e que devem perder o mandato. Antonio Carlos Rodrigues e Luiz Orleans Bragança também se elegeram através do coeficiente eleitoral da radical bolsonarista.
"A Justiça Eleitoral deve anular os votos de Zambelli e promover o recálculo do quociente partidário, o que pode, sim, atingir outros mandatos. Como ela teve votação bastante expressiva, é bem provável que outros deputados possam perder o mandato indiretamente", explicou à Fórum o advogado Luiz Eduardo Peccinin.
"A cassação do mandato de Carla Zambelli, que recebeu cerca de 1 milhão de votos, deverá levar à perda de 2 a 3 mandatos de deputados federais do Partido Liberal. Isso porque, de acordo com a jurisprudência do TSE, a anulação do mandato de um candidato em ação autônoma implica na anulação de todos os votos por ele obtidos. No caso de Carla Zambelli, essa anulação representará a perda de uma quantidade significativa de votos para o PL. Isso ocorre porque o quociente eleitoral e a distribuição das cadeiras entre os partidos serão recalculados, excluindo-se os votos atribuídos a Zambelli", completa Carla Nicolini.