ANTES DE DESMAIAR

Cid diz que "não lembra" para quem mandou áudios e afirma estar "sensível"; veja íntegra do depoimento

Tenente-coronel, que foi preso logo após a oitiva, negou que tenha sido coagido em depoimentos anteriores e ainda afirmou que a Veja, ao divulgar áudios, presta um "desserviço"

Mauro Cid.Créditos: Lula Marques/Agência Brasil
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O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), tornou pública a ata do depoimento prestado pelo tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, na tarde desta sexta-feira (22). Logo após a oitiva, o militar foi preso por descumprimento de medidas cautelares e obstrução à Justiça. 

Cid foi obrigado a se apresentar a um juiz instrutor do gabinete de Moraes para prestar esclarecimentos sobre os áudios que enviou a um interlocutor e que foram vazados à revista Veja nos quais critica a Polícia Federal (PF) e diz haver uma "narrativa pronta" nas investigações sobre tentativa de golpe de Estado, joias e falsificação de cartões de vacina. 

Nos áudios em questão, o tenente-coronel, que mantém um acordo de delação premiada com a Justiça, disse ter sido pressionado pela PF durante depoimentos anteriores, sugerindo que foi coagido a "confessar coisas que nunca fez”, fazendo críticas aos policiais e ao próprio Moraes.  

Na nova oitiva para explicar os áudios, entretanto, Cid negou que tenha sido coagido e confirmou o conteúdo de seus depoimentos anteriores. Afirmou que suas declarações nos áudios em questão se deram em um momento de "desabafo", pois estaria, recentemente, "mais sensível"

Perguntado para quem mandou os áudios, Mauro Cid disse que não se lembra, adicionando ainda que mantém contato com poucas pessoas - a maioria seria familiares e militares próximos. O ex-ajudante de ordens afirmou, ainda, que "perdeu tudo o que tinha" e que o que falou nas gravações foi apenas "uma maneira de se expressar". Isto é, voltou atrás.

Segundo Cid, os amigos o "tratam como leproso", pois ninguém quer ter contato com ele, sua carreira está "desabando" e, nos últimos meses, engordou mais de 10 quilos. 

O militar ainda criticou a revista Veja pelo vazamento dos áudios. "É um desserviço o que a Veja faz ao inquérito, a minha família, às minhas filhas", declarou. 

Confira a íntegra da ata do depoimento de Mauro Cid 

Os áudios 

Bolsonaristas entraram em polvorosa com a divulgação dos áudios pois acreditam que o material teria potencial para anular as provas obtidas a partir dos depoimentos de Cid à PF que implicam Jair Bolsonaro, militares, membros do antigo governo e aliados.

Investigadores da PF, entretanto, avaliam que os áudios vão apenas para anular o acordo de delação do tenente-coronel, enquanto as provas colhidas a partir dos relatos de Cid continuarão valendo - algo que prejudicaria o próprio militar, que perderia possíveis benefícios acordados na delação. 

Mauro Cid havia deixado a cadeia em setembro de 2023, sob condição do uso de tornozeleira eletrônica, justamente após o acordo de delação ser homologado. 

Os áudios vazados de Mauro Cid coincidem com a estratégia de Jair Bolsonaro, que desde que o acordo de delação foi firmado tem dito a interlocutores que o ex-ajudante sofreu uma pressão emocional para falar sobre as investigações.

Na última semana, Bolsonaro voltou a dizer a pessoas próximas que Cid só aceitou a fazer a delação porque estava sob forte pressão após ficar preso por mais de 100 dias - impedido, inclusive, de se encontrar com a família.

Nos áudios vazados pela Veja, Cid repete o discurso de Bolsonaro, de que já há uma "narrativa pronta" feita pela PF.

"Eles estão com a narrativa pronta. Eles não queriam saber a verdade, eles queriam só que eu confirmasse a narrativa deles. Entendeu? É isso que eles queriam. E todas as vezes eles falavam: ‘Ó, mas a sua colaboração. Ó, a sua colaboração está muito boa’. Ele (o delegado) até falou: ‘Vacina, por exemplo, você vai ser indiciado por nove negócios de vacina, nove tentativas de falsificação de vacina. Vai ser indiciado por associação criminosa e mais um termo lá’. Ele falou assim: ‘Só essa brincadeira são trinta anos para você’", diz Cid, em um dos áudios.

“Eu vou dizer o que eu senti: já estão com a narrativa pronta deles, é só fechar, e eles querem o máximo possível de gente para confirmar a narrativa deles. É isso que eles querem”, emendou.

Em seguida, também alinhado à narrativa bolsonarista, o ex-ajudante de ordens da Presidência diz que "o Alexandre de Moraes é a lei".

"Ele prende, ele solta, quando ele quiser, como ele quiser. Com Ministério Público, sem Ministério Público, com acusação, sem acusação”, diz.

O militar ainda faz suspense sobre um suposto encontro entre Moraes e Bolsonaro. “Eu falei daquele encontro do Alexandre de Moraes com o presidente, eles ficaram desconcertados, desconcertados. Eu falei: ‘Quer que eu fale?’".

Mais adiante, ele volta a falar que Moraes "já tem a sentença dele pronta".

“O Alexandre de Moraes já tem a sentença dele pronta, acho que essa é que é a grande verdade. Ele já tem a sentença dele pronta. Só tá esperando passar um tempo. O momento que ele achar conveniente, denuncia todo mundo, o PGR acata, aceita e ele prende todo mundo".

Cid também reclama de sua vida ter sido completamente destruída por Jair Bolsonaro, a quem serviu de maneira tão fiel como ajudante de ordens por todos esses anos.

“Quem mais se fodeu fui eu, quem mais perdeu coisa fui eu. Pega todo mundo aí. Ninguém perdeu carreira, ninguém perdeu vida financeira como eu perdi. Todo mundo já era quatro estrelas, já tinha atingido o topo, né? O presidente teve pix de milhões, ficou milionário. Está todo mundo aí. Pra quem é político é até bom essas porras porque depois ele consegue se eleger fácil. O único que teve pai, filha e esposa envolvidos; o único que perdeu a carreira; o único que perdeu a vida financeira, toda fudida, fui eu”, lamentou.