O deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) recebeu informações, no ano passado, sobre operações realizadas pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no Rio de Janeiro, onde ele era diretor durante o mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), entre julho de 2019 e março de 2022.
Ramagem teria recebido as informações pelo oficial de inteligência Victor Felismino Carneiro, sucessor no comando da agência até dezembro de 2023. Carneiro afirma ter entregue ao deputado uma lista de operações realizadas pela Abin no Rio de Janeiro e o custo aproximado de cada uma.
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"Entrei em contato e passei informações referentes à operação no Rio, mas não era documento oficial", confirmou Carneiro, ao Globo. Ele ocupava a superintendência da Abin no estado sob o comando de Ramagem.
No final do ano passado, a Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência (CCAI) do Congresso Nacional e a Abin empenharam-se no levantamento de dados acerca da utilização de recursos da agência durante o governo Bolsonaro para pagar informantes no Rio de Janeiro.
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A apuração tinha como finalidade encontrar eventuais irregularidades na destinação da verba, o que não foi comprovado. O então diretor da agência teria ligado para Ramagem e repassado as informações sobre as operações de inteligência deflagradas no Rio.
"Foi um fato específico. Eu estava na linha de tiro. Por isso, procurei Ramagem", defendeu-se Carneiro.
Carneiro passou a ser investigado após ter o nome citado pelo general da reserva Augusto Heleno, então ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), em reunião no Palácio do Planalto na qual Bolsonaro pediu aos ministros para intensificarem os ataques ao sistema eleitoral.
Em 5 de julho de 2022, Heleno afirma que conversou com o "Victor, novo diretor da Abin" no dia anterior, para "montar um esquema para acompanhar os dois lados o que estão fazendo". Bolsonaro, então, o repreende e orienta que o assunto seja discutido em particular, após a reunião.
"O problema da Inteligência, eu já conversei ontem com o Victor, novo diretor da Abin, nós vamos O problema todo disso é se vazar qualquer coisa, a gente se conhece nesse meio, se houver qualquer acusação de infiltração".
O general indica que as decisões deveriam ser tomadas e implementadas antes das eleições. "Não tem VAR, não vai ter segunda chamada de eleição, não vai ter revisão de VAR, então o que tiver que ser feito, tem que ser feito antes das eleições. [Se] tiver que dar soco na mesa é antes das eleições, tiver que virar a mesa é antes das eleições", impõe.
Carneiro, que não foi alvo da operação, admitiu ter conversado com Heleno sobre o tema, mas que detalharia o diálogo diretamente no depoimento à Polícia Federal, realizado na última sexta-feira (16).
ASSISTA: VÍDEO - Heleno admite em reunião secreta ilegalidade do 'esquema' na Abin: "O problema é se vazar"
Ramagem em investigação
A Polícia Federal deflagrou, em 25 de janeiro, a Operação Vigilância, que investiga a formação de uma organização criminosa responsável por estabelecer uma "estrutura paralela" dentro da Abin. Quatro dias depois, a Polícia PF cumpriu 21 mandados de busca e apreensão.
Centro das apurações policiais, a Abin teria monitorado, de forma ilegal, autoridades públicas e outras pessoas, utilizando ferramentas de geolocalização de dispositivos móveis sem a devida autorização judicial.
O software israelense FirstMile foi usado cerca de 30 mil vezes em alvos, como os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes. A agência adquiriu o sistema por R$ 5,8 milhões, com dispensa de licitação, em dezembro de 2018, pouco antes da posse de Jair Bolsonaro, com uso previsto até maio de 2021.
O uso indevido do órgão teria ocorrido durante chefia do deputado federal e ex-diretor, Alexandre Ramagem. O gabinete, o apartamento funcional no DF e a casa do deputado no Rio foram alvos de busca e apreensão da PF.
Ramagem é suspeito de ter praticado corrupção passiva no caso que envolve o uso ilegal do software de espionagem FirstMile. A Procuradoria-Geral da República (PGR) apontou que "há indícios de prática de [...] corrupção passiva pelo ex-diretor-geral da Abin Alexandre Ramagem".
A PF ainda investiga se a família Bolsonaro teria se beneficiado por meio do acesso às informações sigilosas. A suspeita da Polícia Federal é que o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) teria recebido "materiais" obtidos ilegalmente pela Abin, como informações sobre inquéritos contra membros de sua família e aliados.
Em uma mensagem enviada por uma assessora do filho "02", os investigadores encontraram um pedido à Ramagem por dados de um inquérito da Polícia Federal "envolvendo PR e 3 filhos", uma possível referência ao ex-presidente da República Jair Bolsonaro e seus três filhos – Flávio, Carlos e Eduardo.
"A solicitação de realização de ‘ajuda’ relacionada a Inquérito Policial Federal em andamento em unidades sensíveis da Polícia Federal indica que o Núcleo Político possivelmente se valia do Del. Alexandre Ramagem para obtenção de informações sigilosas e/ou ações ainda não totalmente esclarecidas", diz a PF.
Com informações do Globo