TRUMP & BOLSONARO

Documentário joga luz no nacionalismo cristão, que busca governo imposto pela minoria

Deus & Pátria analisa a ascensão da direita religiosa nos EUA

Fervor.Cristo branco veste o boné de Trump e bolsonaristas orando diante do Alvorada.Créditos: Reprodução de vídeo e Agência Brasil
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Um documentário recém-lançado nos Estados Unidos joga luz no "nacionalismo cristão" que embala o movimento político de apoio a Donald Trump -- e, ainda que indiretamente, no fervor religioso que pode lotar a avenida Paulista na manifestação convocada por Jair Bolsonaro para o próximo dia 25.

Deus & Pátria, dirigido por Dan Partland, localiza nos televangelistas dos anos 70 e 80 do século passado, nos Estados Unidos, a ascensão do cristianismo milenarista, que usa o discurso do bem contra o mal para encobrir um objetivo político: dar à minoria o controle sobre o sistema político.

De acordo com o documentário, a minoria barulhenta, de apenas um terço dos eleitores registrados para votar nos EUA, parece dominante nos debates políticos por falar absurdos em voz alta.

Ao analisar o documentário, um crítico resumiu, sobre os nacionalistas cristãos:

Trabalham nos bastidores e em plena luz do dia para reestruturar a máquina política através de manipulação, supressão de eleitores e instalação de juízes federais amigáveis para permitir o governo permanente de uma minoria.

Nos Estados Unidos, o voto é distrital. A manipulação a que se refere o documentário é o constante redesenho das fronteiras dos distritos eleitorais para favorecer os conservadores.

Já a supressão do voto é histórica e inclui desde a colocação de poucas urnas eleitorais em bairros negros até a exigência de documentos que dificultem o voto dos mais pobres.

No Brasil, o equivalente seria montar barreiras policiais em dia de eleição para impedir o trânsito de eleitores.

O New York Times destacou que o filme:

Descreve a ameaça crescente à democracia representada pelos eleitores que subscrevem a crença de que os Estados Unidos são acima de tudo uma nação cristã e que isto deve influenciar as políticas sobre o aborto, a educação pública, a imigração, e assim por diante.

Nos EUA, o nacionalismo cristão inclui não apenas os evangélicos, mas fundamentalistas católicos. De maneira genérica, eles enxergam em Donald Trump a possibilidade de retorno a um "passado idílico", que encobre o desejo de retomar uma hierarquia social controlada por homens brancos.

O fato de que Trump não é exemplo de retidão cristã pouco importa. No dizer de um analista, Trump é o bárbaro disposto a qualquer coisa "para nos defender dos bárbaros" -- na visão do crente.

Da mesma forma, no Brasil, Jair Bolsonaro remete aos "tempos de paz" da ditadura civil militar (1964-1985), em que no topo estavam seus colegas de farda dispostos a prender, torturar e matar adversários políticos.

Ou seja, estavam dispostos a tudo para livrar o país do que os bolsonaristas acreditam serem os portadores de "decadência moral".

Os nacionalistas cristãos, com seu fervor religioso, foram essenciais para organizar e perpetrar o ataque de 6 de janeiro de 2021 contra o Congresso dos Estados Unidos; no Brasil, os golpistas do 8 de janeiro de 2023 agiram "em nome de Deus".

EXEMPLO DE RESISTÊNCIA

O documentário não tem um tom anti-cristão.

Lembra o papel central do pastor Martin Luther King na luta pelos direitos civis nos Estados Unidos nos anos 60 do século passado, por exemplo.

Destaca o papel do reverendo William Barber II, tido como um dos herdeiros espirituais de King:

O nacionalismo cristão tenta santificar a opressão e não a libertação. Tenta santificar mentiras e não a verdade. Na melhor das hipóteses, é uma forma de negligência teológica. Na pior das hipóteses, é uma forma de heresia.

O reverendo, que organiza marchas dos trabalhadores da indústria do fast-food e co-dirige a Campanha dos Pobres: Um Chamado Nacional para o Reavivamento Moral, defende a reabilitação de uma frente ampla dos deserdados como resposta ao nacionalismo cristão de Trump.

As pessoas pobres representam agora 30% do eleitorado e mais de 40% do eleitorado em todos os estados onde a margem de vitória para a presidência foi inferior a 3%. Se conseguirmos que elas votem [o voto não é obrigatório nos EUA], poderiam mudar fundamentalmente todas as eleições.

O reverendo está se referindo não apenas à escolha do ocupante da Casa Branca, uma vez que nos Estados Unidos milhares de cargos públicos são preenchidos por voto direto.

Dependendo da unidade da federação, isso pode incluir o xerife, o procurador-geral e mesmo os juízes da Suprema Corte estadual (caso do Colorado, por exemplo).