A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado vai votar nesta quarta (4) a PEC 3/2022, a chamada PEC das Praias, que prevê a transferência da propriedade das terras litorâneas do Brasil da União para estados, municípios e donos privados. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) é o relator do projeto, e trabalha contra resistências à PEC para levar adiante a emenda constitucional que elimina o domínio exclusivo da União sobre as praias.
Em vídeos publicados nesta segunda (2) e nesta terça-feira (3), Flávio mudou o discurso e criou uma narrativa surreal em torno da PEC, dizendo que a proposta é “exclusiva para a preservação de praias” e promove mais “acesso”, além de alegar que “há uma insegurança jurídica para aqueles que "adquiriram" o terreno e que “vai aumentar a arrecadação de impostos”, criticando o Fundo Amazônia, uma das maiores iniciativas do governo federal para o combate à crise climática.
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Um levantamento do portal UOL em junho mostrou que a aprovação da "PEC das Praias" poderia beneficiar diretamente pelo menos 295 políticos, incluindo vereadores, deputados e senadores que possuem imóveis em terrenos de marinha e deixariam de pagar as taxas atualmente exigidas.
Caso seja aprovada na CCJ, a proposta ainda precisará passar por votação em dois turnos no plenário do Senado. Para avançar, o texto deve ser pautado pela Presidência da Casa e obter o apoio de 3/5 dos senadores (49 dos 81). Caso sejam feitas alterações substanciais, a PEC retorna à Câmara para análise; caso contrário, segue para promulgação.
PEC das Praias
Aprovada em dois turnos na Câmara dos Deputados em 2022, a PEC propõe novas diretrizes para a propriedade e gestão dos terrenos de Marinha, possibilitando a venda das áreas que dão acesso às faixas de areia para entes privados. Em resumo, a medida facilitaria a privatização das praias.
Em resposta às críticas à PEC, Flávio Bolsonaro incluiu, em seu último parecer, a ressalva de que as praias são "bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido".
Apesar disso, a proposta mantém a possibilidade de que terrenos da Marinha sejam vendidos a pessoas ou empresas que já ocupem as áreas. Na prática, isso significaria que as áreas que dão acesso às faixas de areia poderiam deixar de ser compartilhadas com o governo, ficando restritas ao uso do novo proprietário, como um hotel ou resort. Assim, apenas pessoas autorizadas pelo dono poderiam usufruir do espaço.
Ainda que a praia permaneça pública, o acesso a elas ficaria sob o controle de um dono, o que abre brecha para a restrição da entrada das pessoas. Além disso, especialistas apontam que a proposta deve atrair a construção de megaemprendimentos próximos às faixas de areia, como hotéis e resorts, o que compromete o ecossistema local e pode trazer impactos para as comunidades locais. O termo "onerosa" implica que os ocupantes devem arcar com a aquisição, mas especialistas apontam que o texto possui lacunas que podem favorecer brechas de calote.
Governo Lula é contra
O governo Lula já manifestou oposição ao projeto. "O governo é contrário a qualquer programa de privatização das praias públicas, que cerceiam o povo brasileiro de poder frequentar essas praias. Do jeito que está a proposta, o governo é contrário a ela", afirmou o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, em junho.
Otto Alencar (PSD-BA), líder do governo no Senado, reforçou o posicionamento contrário e revelou que não foi informado pelo presidente da CCJ, Davi Alcolumbre (União-AP), sobre o retorno da PEC à pauta. "Vou conversar com ele [Alcolumbre]. A princípio, não tem acordo. A posição do governo é contra a aprovação", declarou. Caso a CCJ, de fato, vote e aprove proposta, ela seguirá depois para análise do plenário do Senado.