TERCEIRA VIA

"Mensalão" do Tarcísio turbina emendas a deputados em ano de eleição e pós privatização da Sabesp

Ex-ministro de Bolsonaro importa esquema de cooptação de deputados com emendas para São Paulo. De forma discreta, Folha revela estrutura que financia até deputados federais e senadores e oculta beneficiados

Tarcísio de Freitas na privatização da Sabesp na Bovespa.Créditos: Mônica Andrade/Governo de SP
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Ex-ministro de Infraestrutura de Jair Bolsonaro (PL), Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos) instalou uma espécie de "mensalão" com emendas parlamentares para cooptar deputados estaduais e angariar apoio no Congresso Nacional distribuindo verbas do Estado para deputados federais e até senadores aliados em troca de lobby.

A revelação bombástica foi feita na edição desta sexta-feira (27) da Folha de S.Paulo. No entanto, o jornal do clã Frias buscou um tom ameno, muito distante do chamado "escândalo do Mensalão", termo inventado pelo ex-deputado Roberto Jefferson (PRD), que está preso desde outubro de 2022, quando abriu fogo contra policiais federais que cumpriam ordens sobre a revogação de sua prisão domiciliar.

À época foi aberta uma investigação baseada apenas na declaração de Jefferson que afirmou, sem nunca ter provado, que o então secretário-geral do PT, Delúbio Soares, pagava uma mesada de R$ 30 mil mensais para congressistas aliados. A Folha, no entanto, transformou as declarações do ex-deputado no primeiro "grande escândalo" para atacar Lula.

O jornal, no entanto, não dá tanta ênfase e nem cria neologismos para mostrar que Tarcísio destinou R$ 2,14 bilhões em emendas voluntárias a deputados estaduais, federais e até senadores "como moeda de troca em votações". O assunto ganhou um rodapé na capa da edição imprensa da Folha com a chamada "Tarcísio Mais que dobra emendas e privilegia aliados".

Folha brinca de "Onde Está Wally" com Mensalão do Tarcísio na capa do jornal (Reprodução)

O valor deste ano é mais que o dobro - 124,9% - dos R$ 858 milhões distribuídos pelo mesmo Tarcísio no ano anterior.

A destinação da verba bilionária seria um acerto de contas pela cooptação de deputados que deram os votos necessários na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) para que o bolsonarista privatizasse - em meio à uma série de denúncias - a Sabesp, uma das maiores empresas pública de saneamento do mundo que foi entregue por um valor 44% abaixo do real.

ENTENDA: Privatização da Sabesp: Tarcísio e o esquema neoliberal para abastecer a sanha do mercado

A entrega da Sabesp ao grupo Equatorial, que não tem experiência na área de saneamento, em dezembro de 2023. Mas, a conta aos deputados foi acertada via emendas voluntárias em 2024 - ano em que Tarcísio se dedicou à reeleição de Ricardo Nunes (MDB) na capital paulista.

Conveniência e privilégios

Os R$ 2,14 bilhões reservados por Tarcísio em 2024 é maior do que os R$ 1,38 bi distribuídos em 2022 por Rodrigo Garcia (PSDB), então governador que turbinou as emendas para tentar se reeleger a um novo mandato no Palácio dos Bandeirantes.

Para pagar a conta da entrega da Sabesp e turbinar seus candidatos no Estado em ano eleitoral, Tarcísio distribuiu, segundo a Folha, R$ 20 milhões, em média, para deputados da base, de 16 partidos.

Para deputados do PT, a banca administrada pelo assessor especial Gilberto Kassab - presidente nacional do PSD e fiador da candidatura de Tarcísio pela chamada "terceira via" em 2026 - destinou R$ 5 milhões. Parlamentares do PSOL, segundo o jornal, terminaram o ano de mãos vazias. 

Os R$ 20 milhões dados de forma "voluntária" por Tarcísio aos aliados é quase o dobro do que é pago pelas emendas impositivas, que são obrigatórias e destinam R$ 11 milhões para cada um dos 94 membros da Alesp, independentemente de bandeira partidária.

Os efeitos eleitorais da distribuição já apareceram em outubro. Segundo a Folha, "os partidos que elegeram mais prefeitos no estado em 2024, como PSD, PL e Republicanos, aparecem também entre os cinco primeiros no ranking de emendas voluntárias".

O jornal, no entanto, não dá nome aos bois e oculta os nomes dos parlamentares - em um conluio com o governador ao melhor estilo "orçamento secreto", esquema de compra do Centrão criado por Arthur Lira (PL) e Jair Bolsonaro na Câmara.

Tarcísio ainda usou a verba para financiar o lobby bolsonarista de São Paulo contra Lula no Congresso Nacional retomando, segundo a Folha, "uma prática tucana e distribuir emendas voluntárias para a bancada federal".

Dos R$ 2,14 bilhões em emendas voluntárias, o governador paulista reservou R$ 726 milhões para cooptar o apoio de 70 deputados federais e 3 senadores, com uma média de R$ 10 milhões. Em 2023, o governo paulista destinou zero recursos para a bancada federal paulista.

Mensalão e emendas 

O esquema de cooptação de parlamentares criado por Tarcísio em São Paulo é um misto de mensalão e "orçamento secreto" - ao que tudo indica, a Folha ocultou os nomes dos deputados agraciados voluntariamente, colocando apenas alguns de seu interesse.

Na reportagem, o jornal do clã Frias faz questão de dizer que "até a primeira semana de dezembro, pouco mais da metade (52%) desse valor já havia sido efetivamente empenhado ou pago, e o restante ainda estava em processamento, o que é motivo de reclamação nos corredores da Assembeia".

Mas, acaba confessando que "o pagamento das emendas voluntárias não é obrigatório e ocorre conforme a conveniência do Palácio dos Bandeirantes. Por isso, esse mecanismo acaba servindo como moeda de troca na política, privilegiando deputados que votam a favor do governo".

Em nota ao jornal, o próprio governo Tarcísio afirma que as emendas são parte do "relacionamento" [termo colocado pela Folha] com a Alesp  "especialmente com os deputados da base, que [...] apoiam os programas e projetos desenvolvidos pelo Executivo e conhecem em detalhes as demandas de regiões específicas".

Na prática, Tarcísio confessa que usa a distribuição "voluntária" das emendas para comprar apoio para seu levante fascista neoliberal em São Paulo. E tudo isso com a conivência da mídia que flerta para que ele seja o candidato "anti-Lula" da terceira via.
 

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