Em entrevista à RPC TV, afiliada da Globo no Paraná, a candidata bolsonarista à prefeitura de Curitiba, Cristina Graeml (PMB), fez uma declaração absurda contra mães solos. Durante a sabatina, disse que se eleita, vai instituir um "instituto pró-vida" para a doação de crianças de mulheres pobres "abandonadas pelo marido".
Mesmo citando o atendimento de mulheres vulneráveis pelo Estado, a bolsonarista insiste que filhos devem ser dados a pessoas de “maior condição financeira” e “casais que querem uma criança, esperam e não têm” – como descreveu o jornalista Leandro Demori, “basicamente propondo comprar filho de gente pobre”.
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“Vou fundar um instituto pró-vida municipal (…) para que a mulher que engravida sem querer e é abandonada pelo marido tenha um acolhimento discreto do município, atendimento psicológico e todo o acesso à questão legal, para que fique claro que ela pode ter aquele filho e inclusive doar. Vai ter ajuda financeira também, porque tem muita entidade querendo vir junto, mas ela pode inclusive doar para centenas de milhares de casais que querem uma criança em adoção, esperam e não têm”, disse a candidata em discurso sem fundamento.
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‘Como se os filhos fossem coisas’
A declaração gerou forte reação de repúdio por parte de 13 entidades da sociedade civil, que compararam a fala da candidata de extrema direita a práticas do Brasil Colônia. Graeml disputa o segundo turno das eleições municipais contra Eduardo Pimentel (PSD). “No Brasil Colônia até o inicio do século XX, era essa triste e chocante realidade quando mulheres solteiras abandonavam seus filhos em decorrência do preconceito e da opressão social, na Roda dos expostos ou Roda da Misericórdia”.
“Tal pronunciamento veiculado na última segunda-feira, revela profundo preconceito contra as mulheres – mães solos. A candidata sem nenhum pudor, sem nenhum respeito, com total desumanidade, estimula que mães ‘solteiras’ doem seus filhos como se estes fossem coisas”, afirma o manifesto.
De acordo a nota de repúdio, Graeml propõe algo que remete à antiga "roda dos rejeitados", transformando o município em uma agência de distribuição de crianças, filhos e filhas de mulheres pobres, tratadas como meros objetos.
“Histórias dramáticas de separações de crianças e mães não domiciliadas, em situação de rua, vulnerabilizadas, acontecem em nosso país, em nossa cidade, provocando uma drástica ruptura dos vínculos dessas mulheres com seus filhos e filhas. Essa proposta defendida por essa candidata, estigmatiza as mulheres, estimula o abandono”, dizem as entidades.
Leia o manifesto completo
O Movimento Nacional da População em Situação de Rua e demais entidades abaixo-assinadas manifestam profunda indignação pela fala da candidata à prefeitura de Curitiba, sra. Graeml, exibida em entrevista em canal de televisão na cidade de Curitiba. Tal pronunciamento veiculado na última segunda-feira, revela profundo preconceito contra as mulheres – mães solos. A candidata sem nenhum pudor, sem nenhum respeito, com total desumanidade, estimula que mães “solteiras” doem seus filhos como se estes fossem coisas. Ou seja, para ela e em seu governo caso se eleja a prefeitura vai atuar para que mães vulnerabilizadas, em situação de rua, mães solos abandonem seus filhos e os coloquem para adoção. Essa crueldade proferida por essa candidata, não é nova, infelizmente.
No Brasil Colônia até o inicio do século XX, era essa triste e chocante realidade quando mulheres solteiras abandonavam seus filhos em decorrência do preconceito e da opressão social, na Roda dos expostos ou Roda da Misericórdia. Uma infinidade de crianças foram jogadas em rios ou deixadas ao tempo onde morriam por ataque de animais, doenças e fome. A roda de expostos era um depósito onde mães abandonadas, deixavam seus bebês. Essa Roda se constituía em um cilindro de madeira colocado nos Conventos e Casas de Misericórdia, onde as crianças eram deixadas pelas mulheres. O estranhamento diante de uma situação então banal, resulta do fato de que, diferente daqueles tempos, vemos hoje surgir propostas que se assemelham a esse período triste de nossa história.
Essa candidata quer recriar a “roda dos rejeitados” como uma agência municipal de distribuição de crianças, filhas e filhos de mães pobres, para doação, como se fossem objetos ou coisas. Histórias dramáticas de separações de crianças e mães não domiciliadas, em situação de rua, vulnerabilizadas, acontecem em nosso país, em nossa cidade, provocando uma drástica ruptura dos vínculos dessas mulheres com seus filhos e filhas. Essa proposta defendida por essa candidata, estigmatiza as mulheres, estimula o abandono, reforça práticas autoritárias já realizadas por parte de equipes médicas e/ou judiciais que muitas vezes afastam mãe de seu bebê, pelo fato de que em suas avaliações esta não teria condições de cria-los. Sabemos que parte da justificativa da separação desses bebês de suas mães é a incapacidade do estado, e das políticas públicas, de atendê-las e cuidar para que a criança tenha seus direitos atendidos no convívio com suas mães.
Essa candidata, desconhece que em nosso país, vivemos novas relações sociais e humanas e com isso novas organizações familiares se formam. Essa candidata, desconhece o Estatuto da Criança e do Adolescente promulgado em 1990 e que inaugurou no ordenamento jurídico brasileiro a Doutrina da Proteção Integral, que declarou ser dever da família, da sociedade e do Estado assegurar, à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade os seus direitos. Também desconhece que a maioria dos lares brasileiros são chefiados por mulheres. Segundo pesquisa do IBGE/PNAD, 50,8% das famílias são chefiadas por mulheres, e mulheres, que foram abandonadas, mulheres que escolheram ficar sós, mulheres que foram abusadas e se encontravam em situação de violência. No Brasil e no mundo, as mulheres estão na linha de frente da resistência ao fascismo.
Os ataques aos corpos e sexualidades, com a violência em suas formas mais extremas, junto com o reforço do modelo de família heteropatriarcal, aumentam a sobrecarga de trabalho diante da crise e precarização das condições de vida, afetando principalmente as mulheres negras. Queremos que a Prefeitura crie casas de referência para mulheres em situação de rua, com programas e ações que reconstruam a dignidade dessas mulheres, com direito a trabalho digno, qualificação profissional, geração de renda, moradia e proteção social e que possam escolher ficar com seus filhos. O que queremos é que o Estado olhe para as mães, em especial as mães vulnerabilizadas, mães com filhos com deficiência, mães em situação de rua mães negras, periféricas e pobres que são a maioria nessa cidade que inclusive contribui com os impostos, criando e fortalecendo politicas públicas universais.
Não queremos e não permitiremos que tirem nossos filhos e filhas! Exigimos respeito e tratamento igual, conforme a Constituição brasileira!
Assinam:
Movimento Nacional da População em Situação de Rua – MNPR
Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiros (as) – ABENFO/PR
Centro Estadual de Defesa dos Direitos Humanos das populações em situação de rua e catadora de materiais recicláveis no Paraná – CEDDH/PR
Coletivo Luzia
Grupo Dignidade
Liga Brasileira de Lésbicas – LBL/PR
Instituto Nacional de Direitos Humanos da População em Situação de Rua – INRua
Irmandade Sem Fronteiras
Marcha Mundial das Mulheres – MMM/PR
Observatório Estadual de Direitos Humanos da População em Situação de Rua – ODH POP Rua
Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos – Regional Paraná (RFS/PR)
Rede Brasileira de EDH – ReBEDH
União Brasileira de Mulheres – UBM/PR