OPERAÇÃO LESA PÁTRIA

Carlos Jordy: quem é o bolsonarista radical alvo da ação da PF por atos golpistas

Deputado é investigado por incentivar manifestantes a invadirem Brasília; CPI da Covid o apontou como articulador de fake news durante a pandemia

Carlos Jordy foi eleito em 2018, com apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).Créditos: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados
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O deputado federal Carlos Jordy (PL) é alvo de um mandado de busca e apreensão na 24ª fase da Operação Lesa Pátria, deflagrada pela Polícia Federal nesta quinta-feira (18). O parlamentar é investigado pelo planejamento, financiamento ou incitação dos atos democráticos de 8 de janeiro.

Em cumprimento ao mandado expedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a Polícia Federal fez buscas na Câmara dos Deputados, em Brasília, e em endereços ligados ao parlamentar no Rio de Janeiro e no Distrito Federal.

Os crimes inscritos no Código Penal que envolvem o cumprimento do mandado de busca e apreensão são abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L), golpe de Estado (art. 359-M), associação criminosa (art. 288) e incitação ao crime (art. 286).

Quem é Carlos Jordy

Nascido em Niterói (RJ), Carlos Roberto Coelho de Mattos Júnior tem 41 anos de idade e é deputado federal pelo PL, partido ao qual é filiado. Ele ocupa uma cadeira na Câmara dos Deputados pelo segundo mandato consecutivo, pelo qual recebe salário mensal de R$ 41,6 mil e emprega 29 pessoas em seu gabinete.

Graduado em Turismo e Hotelaria pela Universidade do Vale do Itajaí, foi analista de planejamento e orçamento na Prefeitura Municipal de São Gonçalo entre 2011 e 2015, e, em seguida, exerceu função de analista administrativo na Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), até 2017.

Neste ano, elegeu-se vereador na Câmara Municipal de Niterói pelo PSC. No cargo, empenhou-se em pautar temas caros à extrema direita, como o uso de banheiros femininos por transexuais na Universidade Federal Fluminense (UFF), caso em que seu ofício enviado à administração da instituição recebeu uma nota de repúdio como resposta.

Em 2018, foi eleito parlamentar com 204 mil votos. O então pré-candidato ao Senado pelo Rio de Janeiro, Flávio Bolsonaro (PL), demonstrou apoio no evento de filiação de Jordy ao PSL, antigo partido do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que também aprovou sua candidatura na época. 

Jordy deve permanecer no cargo público até o final de 2027, mandato reeleito nas eleições de 2022, nas quais recebeu 114,6 mil votos. É líder da oposição na Câmara desde março de 2023 e compõe a Frente Parlamentar da Mineração e Construção Civil, além de integrar a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC).

Campanha de difamação contra Felipe Neto

Em abril de 2019, Jordy insinuou que o youtuber Felipe Neto seria indiretamente responsável pelo atentado que deixou 10 mortos em Suzano (SP), em março daquele ano, na escola estadual Professor Raul Brasil. O influenciador digital, então, moveu processo criminal por calúnia e difamação, no qual a Justiça determinou a exclusão da publicação.

De acordo com o deputado, o youtuber teria ensinado seus seguidores – em sua maioria, um público de crianças e adolescentes – a entrarem na deep web, nome dado para uma zona da internet que não pode ser detectada facilmente pelos tradicionais mecanismos de busca e que, portanto, pode ser utilizada para prática de crimes.

"Quando digo que pais não devem deixar os filhos assistirem vídeos do Felipe Neto, não é brincadeira. Em 2016 ele fez vídeo ensinando a entrarem em sites da deepweb. Agora descobriram que os assassinos de Suzano pegaram as informações para o massacre num dos sites após assistirem ao vídeo", escreveu em seu perfil no Twitter. Em seguida, ele apagou a postagem.

A Justiça estadual também penalizou Jordy com o pagamento de indenização por dano morais no valor de R$ 66 mil, montante que foi celebrado por Felipe Neto: "Hoje é um grande dia. O deputado bolsonarista Carlos Jordy fez o pagamento em juízo da indenização que me devia". O valor foi doado ao Instituto Marielle Franco e ao movimento Ocupa Sapatão.

Relação com Daniel Silveira

Em fevereiro de 2021, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), ordenou a prisão do então deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) pela divulgação de vídeos com ataques e ameaças aos ministros do Supremo e fazer apologia ao AI-5, ato institucional mais repressivo da ditadura militar. Jordy saiu em sua defesa.

O bolsonarista chamou Alexandre de Moraes de "vagabundo" diante da prisão do colega, em suas redes sociais. Ele ainda informou que conversou com Silveira para que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) intercedesse em seu favor.

"Acabei de falar com o deputado Daniel Silveira e fiquei sabendo que sua prisão foi ordenada pelo vagabundo do Alexandre de Moraes por ele ter feito uma live criticando o Ministro Fachin. Não iremos recuar! Espero que o Presidente Arthur Lira haja com postura contra esses ditadores!"

Jordy chegou a cogitar novas estratégias para reverter a prisão de Silveira, como um recurso na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), sob justificativa de que o ex-deputado teria sido alvo de perseguição política.

Bate-boca com Carlos Bolsonaro

No início de janeiro de 2022, o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ) discutiu com Jordy nas redes sociais, de modo que atraiu uma horda de bolsonaristas nos comentários das publicações. Ele criticou uma postagem em que o deputado comentava a respeito da prisão de Daniel Silveira em um evento, no qual um olavista repreendeu Jair Bolsonaro.

 

No "Congresso Politicamente Incorreto", realizado em Niterói, Jordy pregou o "impeachment de ao menos um ministro" do STF para "acabar com essa patifaria toda de prender deputado", em referência à Silveira, que compareceu ao evento.

O filho de Jair Bolsonaro revoltou-se com a publicação: "Ainda tenho que ouvir isso? Pqp! É inacreditável? Não! Sei exatamente como esses agem", comentou.

Jordy rebateu: "É isso mesmo? Então você não considera importante que seu pai tenha mais deputados e senadores aliados para não ficarmos mais reféns do presidencialismo de coalizão? Não entendi sua crítica. Então agora, desde 2016 ao lado do seu pai, sou traidor?".

Uma das respostas a este comentário surgiu de um usuário que questionou a participação de Jordy em um congresso que teria criticado o então presidente. "Você trabalha contra a eleição dele com as tais críticas construtivas, que não passam de um método para minar, desgastar e sabotar o governo do Bolsonaro [...] ".

O deputado respondeu sobre as críticas dos olavistas à Bolsonaro, especialmente Silvio Grimaldo: "O Congresso era meu. Se alguém teve culpa em chamar o Silvio, fui eu. Silvio foi infeliz na fala dele, mas ele era convidado e expressou a opinião dele. Mas o que eu disse está errado? Quero entender. Queremos deputados bolsonaristas ou aliados do diálogo?".

Gesto de supremacia branca

Em junho de 2021, o deputado federal realizou um gesto comum de supremacia branca no plenário da Câmara dos Deputados ao fazer um discurso em defesa de Felipe Martins, assessor especial da Presidência que teria feito o mesmo gesto em uma sessão do Senado Federal, em março daquele ano.

"Para a militância esquizofrênica de esquerda e também para o Ministério Público aparelhado, este é um gesto de supremacistas brancos", afirmou. "Este é o primeiro caso em que um judeu é denunciado por um crime de nazismo por estar ajustando a sua lapela", completou.

Uma denúncia pelo crime de racismo foi aberta pelo Ministério Público Federal (MPF). O gesto de unir o dedo indicador ao polegar, enquanto estica os demais dedos da mão, forma as letras "WP", referente ao lema White Power ("Poder Branco", em tradução livre do inglês). O gesto é apropriado por grupos supremacistas brancos, principalmente dos Estados Unidos.

A justificativa de Martins foi de que estava alinhando o paletó na ocasião, quando o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) identificou o gesto e alertou o presidente da bancada, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A perícia do Senado desmentiu a versão do bolsonarista.

"Em primeiro lugar, o apelado é professor e foi assessor do ex-Presidente da República. Portanto, trata-se de pessoa que entende de política e é conhecedor das suas simbologias específicas, incluindo aquelas que enaltecem torturadores, fascistas e racistas. E utiliza essa simbologia de forma reiterada", argumentou o desembargador Ney Bello, que reabriu o inquérito.

"O que temos são indícios. Fortes indícios, diria eu. Por serem fortes indícios, não é cabível a manutenção da absolvição sumária do apelado."

O caso será investigado, sob pena de "o Judiciário ser leniente em sua atuação com a prática de condutas racistas". Em outubro de 2021, o juiz da 11ª Vara Criminal do Distrito Federal encerrou o processo por avaliar que o gesto denunciado pelo MPF não configura crime e absolveu o réu.

Esposa empregada pelo Mário Frias

O ex-secretário especial de Cultura do governo Jair Bolsonaro, Mário Frias, nomeou Lais Sant'Anna Soares para o cargo de Coordenadora de Inovação no departamento de Empreendedorismo Cultural na pasta. Então noiva de Jordy, eles estão casados e têm uma filha.

De acordo com seu perfil no LinkedIn, Lais trabalhava em um escritório de advocacia da família antes de ser nomeada, e nunca teve nenhuma relação com a área de inovação para a qual foi contratada.

Frias, que já havia sido noticiado pela contratação do cunhado em um cargo de confiança na Embratur – com salário de R$ 18,4 mil – troca muitos elogios com Jordy pelas redes sociais, além de serem próximos do deputado estadual Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente.

Frias e Jordy trocam elogios [Divulgação]

Fake news na pandemia

O relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid aponta que as investigações compreendem Jordy como integrante de um núcleo que formulou fake news com o intuito de desinformar a população acerca do coronavírus e gerar engajamento da base de apoio popular a Bolsonaro.

Jordy foi indiciado por incitação ao crime, em decorrência do constante incentivo ao descumprimento das normas sanitárias impostas para conter a pandemia, como o desincentivo ao isolamento social e ao uso de máscaras de proteção; e o compartilhamento de conteúdos na redes sociais com desinformação sobre a pandemia, a defesa do tratamento precoce contra o vírus, a eficácia da vacina e a defesa da imunidade de rebanho pela contaminação.

   

 Em 15 de março de 2020, em meio ao crescimento no número de casos de contaminação de covid-19, o deputado organizou uma manifestação no bairro do Icaraí – bairro  com elevado índice de idosos – com centenas de pessoas.

Na ocasião, ocorreu um salto no número de casos devido à aglomeração: em 14 de março, Niterói possuía apenas 1 caso confirmados e menos de 40 suspeitos; e em 20 de março, eram 10 casos confirmados, cerca de 100 suspeitos e 1 morte, de acordo com a Secretaria Municipal de Saúde.

O relatório indica que, durante a pandemia, Jordy "realizou várias postagens seguindo a linha de pensamento do Presidente Jair Bolsonaro, defendendo a cura da covid-19 por meio do tratamento precoce, questionou a obrigatoriedade da vacina e chamou por diversas vezes a Coronavac de 'Vachina'".

Reportagem em atualização