A Controladoria-Geral da União (CGU) destituiu, nesta sexta-feira (12), Luciano de Freitas Musse, ex-gerente de projetos da secretaria-executiva do Ministério da Educação (MEC) durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). O advogado foi acusado de envolvimento no esquema de pastores suspeitos de operar um "gabinete paralelo", que chegou a negociar barra de ouro para liberar verbas às prefeituras.
Musse já havia sido exonerado em março de 2022, dois dias após o pedido de demissão do então ministro da pasta, Milton Ribeiro. Embora não tenha sido definido um impedimento para que ocupasse função pública, a decisão da CGU determina que ele não poderá mais ser indicado, nomeado e exercer cargos públicos no Poder Executivo por oito anos.
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O órgão concluiu o processo administrativo disciplinar que investigou a participação de Musse na atuação dos pastores evangélicos Gilmar Silva dos Santos e Arilton Moura Correia na cobrança de propina de prefeitos para liberação de verbas do MEC.
A partir de janeiro de 2021, os dois pastores teriam negociado com prefeituras a liberação de recursos federais para obras de creches, escolas, quadras esportivas ou compra de aparelhos de tecnologia.
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A CGU avaliou que o ex-gerente de projetos participava da organização que parasitava o ministério. "O indiciado foi descrito por testemunhas como uma espécie de segurança dos pastores", apontou o órgão, após oitivas de testemunhas – inclusive, de prefeitos a quem foram solicitadas as propinas.
Segundo a Controladoria, foram encontrados comprovantes de depósito e emissão de passagem para Musse pela prefeitura de Piracicaba (SP) para a participação em um evento organizado pelos pastores, apesar de seu vínculo com o MEC.
Conforme depoimento anônimo de um assessor contratado por vários municípios da região Norte, ele supôs que o advogado trabalhava para os pastores, e não para o MEC, no contato que teve com o então gerente na viagem que Milton Ribeiro fez a Centro Novo (MA).
Com salário mensal de R$ 10 mil como funcionário da pasta, ele teria recebido R$ 20 mil por indicação de um dos pastores para atuar na negociação de verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para prefeituras, uma espécie de "balcão de negócios" da pasta.
Em junho de 2022, Luciano Musse foi alvo de prisão preventiva em Goiânia (GO) na Operação Acesso Pago da Polícia Federal com o intuito de apurar a prática de "tráfico de influência e corrupção para a liberação de recursos públicos". A mesma ação prendeu Milton Ribeiro, Gilmar Santos e Arilton Moura.
Ao atender um habeas corpus apresentado pela defesa de Ribeiro, todos foram liberados após a revogação da decisão pelo desembargador Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que atua em Goiás.
Relembre o escândalo
Em 21 de março de 2022, um áudio vazado e divulgado pela Folha de S.Paulo mostrou Milton Ribeiro assumindo que o ex-presidente Jair Bolsonaro pediu que o MEC priorizasse os pedidos de destinação de verba feitos pelo pastor Gilmar Silva dos Santos, presidente da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus no Brasil (CGADB).
"A minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar. [...] Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do Gilmar", diz Ribeiro na conversa.
O áudio, gravado durante conversa do ministro com prefeitos e os pastores, foi o primeiro passo da investigação de um "gabinete paralelo" no qual foi descoberto que Arilton Moura pediu propina de um quilo de ouro – de valor equivalente a R$ 300 mil – para liberar recursos do MEC destinados à construção de escolas e creches em sua cidade.
"Ele [Arilton Moura] disse: ‘Traz um quilo de ouro para mim’. Eu fiquei calado. Não disse nem que sim nem que não [...] Ele disse que tinha que ver a nossa demanda, de R$ 10 milhões ou mais, tinha que dar R$ 15 mil para ele só protocolar [a demanda no MEC]. E na hora que o dinheiro já estivesse empenhado, era para dar um tanto, X. Para mim, como a minha região era área de mineração, ele pediu 1 quilo de ouro", revelou Gilberto Braga (PSDB), prefeito de Luis Domingues (MA).
Ribeiro negou envolvimento no esquema e disse que ter acionado a CGU quando prefeitos denunciaram o esquema, embora a denúncia tenha vindo à tona por meio de reportagem publicada no Estado de S. Paulo.
Dias depois, Bolsonaro defendeu o ministro durante sua live semanal. O presidente disse que colocaria sua "cara no fogo" pelo pastor: "O Milton, coisa rara de eu falar aqui: eu boto minha cara toda no fogo pelo Milton. Estão fazendo uma covardia contra ele". Os pastores teriam visitado Bolsonaro 45 vezes no Planalto.
No mesmo dia da defesa do então presidente, Cármen Lúcia, ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a abertura de um inquérito contra o ministro, atendendo a um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Milton Ribeiro pediu exoneração numa semana após a divulgação dos áudios. O ministro havia colocado o cargo à disposição para evitar danos maiores à campanha de reeleição de Bolsonaro. Em seguida, foi revelada a confecção e distribuição pelo MEC de bíblias com fotos de Milton Ribeiro e dos pastores envolvidos no esquema que ficou conhecido como "Bolsolão do MEC".
*Com informações da Folha de S.Paulo.