DELAÇÃO DE MAURO CID

Almirante Garnier: veia golpista e mamatas do militar que pôs tropas à disposição de golpe de Bolsonaro

Ex-comandante da Marinha protagonizou vexame ao não comparecer à transmissão de cargo no governo Lula e coleciona mamatas obtidas durante o governo Bolsonaro.

Almirante Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha, e Jair Bolsonaro.Créditos: Alan Santos/PR
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Alçado ao cargo de Comandante da Marinha do Brasil em 9 de abril de 2021, após atuar como Secretário-Geral do Ministério da Defesa na gestão do general Fernando Azevedo e Silva, o almirante de esquadra Almir Garnier Santos protagonizou o mais grotesco dos papelões das Forças Armadas ao não comparecer a passagem de comando ao colega Marcos Sampaio Olsen já no início do governo Lula, em janeiro.

Nove meses depois, a divulgação de trecho da delação do tenente coronel Mauro Cid, nesta nesta quinta-feira (21), mostra que o sumiço do almirante estava intimamente ligado à sua veia golpista.

Segundo o tenente coronel, Garnier Santos teria sido o único comandante das Forças Armadas a aderir prontamente a um golpe de Estado proposto por Jair Bolsonaro (PL). O almirante ainda teria colocado a tropa de marinheiros à disposição do ex-presidente fascista dias antes de se esconder na passagem do comando e, em seguida, entrar para a reserva.

A informação de Mauro Cid também explica o motivo de Bolsonaro se sentir à vontade para mandar uma mensagem cifrada a fuzileiros navais no dia 13 de dezembro, logo após os primeiros atos terroristas em Brasília, no dia da diplomação de Lula.

Bolsonaro afirmou, em nota lida por locutor com a sua imagem no telão, que os fuzileiros navais, com sacrifício da própria vida, "lutaram e sempre lutarão para impedir qualquer iniciativa arbitrária que possam vir a solapar o interesse do nosso país".

O evento, que aconteceu no Grupamento de Fuzileiros Navais em Brasília, foi fechado à imprensa. Antes de Bolsonaro divulgar a nota, o comandante da Marinha, Almir Garnier Santos, disse que Bolsonaro conta "com a minha, com a sua, com a nossa Marinha".

Bolsonaro também premiou Garnier com cargo no comitê-executivo de gestão da Câmara de Comércio Exterior, a Camex. No entanto, o militar foi dispensado por Lula em fevereiro.

Nas redes, Garnier afirmou que "considera bastante positiva a minha contribuição no âmbito da Camex - notadamente nos aspectos referentes à indústria de defesa - razão pela qual me despeço com o sentimento de cumprimento do dever". 

Mamata

A veia golpista do almirante, no entanto, tem pouco a ver com o teor patriótico, propagado por bolsonaristas para louvarem a atitude grotesca dele. A prontidão em colocar as tropas ao lado de Bolsonaro se relaciona mais com a mamata conquistada por Garnier durante o governo fascista - a exemplo do que ocorreu em boa parte da cúpula das Forças Armadas.

Esposa do almirante, Selma Foligne Crespio de Pinho foi contratada pelo governo de Jair Bolsonaro na Secretaria-Geral da Presidência poucos meses depois de se aposentar da Marinha, em abril de 2019.

Para comandar recém criada unidade de Estratégia, Padronização e Monitoramento de Projetos, Selma, que atuava como tecnologista no Comanda da Marinha sem concurso público desde 1993, recebeu um salário de R$ 29,5 mil.

Filho do casal, o advogado Almir Garnier Santos Junior foi contratado pela Emgepron em 29 de julho de 2019, no segundo semestre do governo de Jair Bolsonaro, seis meses depois do pai ser alçado ao segundo posto de comando do Ministério da Defesa.

Junior foi contratado para a função de "assessor-adjunto de Compliance e Integridade Corporativa (Compliance Officer)", com salário de R$ 10,9 mil mensais.

Empresa Gerencial de Projetos Navais, a Emgepron foi criada em 1982 e é vinculada ao Ministério da Defesa por intermédio do Comando da Marinha e tem por objetivos, entre outros, promover a indústria naval e gerenciar projetos que integram programas aprovado pelo Comando da Marinha.

Turismo com a FAB

Em maio de 2022, já gozando do status de Comandante da Marinha, Garnier resolveu levar a esposa e um grupo de convidados para visitar a região da Toscana, um dos principais polos turísticos da Itália. Detalhe: a “comitiva” viajou em um avião da Força Aérea Brasileira (FAB).
 
Eles foram ao exterior para participar de uma cerimônia militar. Exército e Aeronáutica também mandaram oficiais à Itália. Porém, somente Garnier recusou viajar em avião comercial para voar no jato exclusivo.

O avião da FAB tem pouca autonomia de voo. Por isso, Garnier e seus convidados foram obrigados a fazer 11 escalas durante a viagem.

Após passar três dias na Toscana, a “turma” esticou e foi à Turquia, em “missão oficial” de quatro dias. Antes do retorno ao Brasil, todos ficaram um dia em Lisboa, Portugal.

Golpismo nas redes e na mídia

Da sala de comando da Marinha, Garnier também se ocupava das redes sociais e da condecoração de figuras caricatas que ganharam fama na mídia aliada ao bolsonarismo.

Em agosto de 2021, o almirante usou o perfil oficial no Instagram do Comandante da Marinha (@comandante.mb) - que ainda é utilizado por ele - para curtir uma publicação da atriz e ex-secretária de Cultura, Regina Duarte, atacando o sistema de votação.

Na publicação, Regina Duarte divulgou uma arte sobre a tentativa da bancada bolsonarista em pautar a PEC do voto impresso no plenário, após derrota na Comissão Especial da Câmara. "O que o meu coração pede é transparência eleitoral! Não há o que temer … ou há ?!", escreveu a atriz.

Garnier também usou o cargo para condecorar com a medalha Mérito Tamandaré diversos nomes que defenderam o golpismo propagada pelo ex-presidente mesmo após a derrota para Lula nas eleições.

Em 13 de dezembro, o almirante condecorou o dono da Jovem Pan, Antônio Augusto Amaral de Carvalho, o Tutinha, e funcionários da emissora à época como Rodrigo Constantino, José Maria Trindade e Augusto Nunes.

A medalha, concedida para personalidades que tenham prestado "relevantes serviços à Marinha do Brasil, no sentido de divulgar ou fortalecer as tradições da força armada, honrando seus feitos ou realçando seus vultos Históricos", também foi entregue a José Roberto Guzzo, ex-Editora Abril, que colabora com diversos meios conservadores e publicações de clubes militares.