O general Marcos Amaro dos Santos deu mais um passo -ousado- no processo de manter o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e o Palácio do Planalto sob controle militar: nomeou nesta quinta-feira (18) o coronel do Exército Laurence Alexandre Xavier Moreira como diretor do Departamento de Segurança Presidencial da Secretaria de Segurança e Coordenação Presidencial do GSI. Ele será o responsável pela segurança do prédio do Palácio do Planalto.
O coronel Moreira foi oficial de gabinete e braço direito do general Villas Bôas, líder militar do golpe contra Dilma Rousseff e da operação de manter Lula na prisão em Curitiba durante a eleição de 2018 -esteve no cargo entre 2017 e 2018, quando Villas Bôas era o comandante do Exército. Não só. Como assessor especial da Abin, em 2022, foi um dos homens de confiança do general Heleno, então ministro e um dos principais articuladores militares de Bolsonaro. O coronel atuava como “olhos” de Heleno dentro da Abin, a Agência Brasileira de Inteligência, subordinada ao GSI. Entre outras tarefas, era o responsável pela coordenação das pesquisas “sensíveis” e determinava o que seria encaminhado a Heleno e, posteriormente, a Bolsonaro.
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Ele não irá cuidar da segurança de Lula, Janja, Alckmin, Lu e seus filhos, pois estará encarregado da segurança do prédio do Planalto apenas. A segurança pessoal continua a cargo da SESP (Secretaria Extraordinária de Segurança Imediata do Presidente) mas, a depender de Amaro, o ministro-chefe do GSI, por pouco tempo. Ele sonha em recuperar para os militares o controle da segurança. Nesse caso, Moreira teria sob seus olhos e ouvidos todos os passos do presidente, do vice e de suas famílias.
A guerra entre militares sob comando de Amaro e civis sob comando do chefe da SESP, delegado Alexsander Castro de Oliveira, está encarniçada. Amaro afirmou logo depois de ter sido nomeado, em 4 de maio, que Lula teria lhe assegurado que a segurança presidencial voltaria às mãos dos militares. Depois, contestado pela SESP, recuou, afirmando que o presidente havia apenas “sinalizado” a troca e, nesta semana, disse que Lula poderia definir pela prorrogação da SESP - a Secretaria tem existência por prazo definido, até o fim de junho, quando o GSI reassumiria o encargo da segurança presidencial.
Segundo os dirigentes da SESP, Lula tem sinalizado que a Secretaria terá sua existência prorrogada até o fim de 2026 -o que a tornaria, na prática, numa instituição permanente.
É uma guerra silenciosa mas que tem explodido aqui e ali na imprensa. E tem lances até grotescos. Por exemplo: existe uma frota de carros blindados destinada à segurança presidencial. Eles estavam alocados no GSI durante o governo Bolsonaro. O órgão recusou-se a repassá-los à SESP. Eles ficam estacionados nas garagens do Planalto enquanto a PF tem cedido seus carros para rodar nas ruas.
Janja ocupa um papel central na disputa. Ela quer ver os militares pelas costas, asseguram assessores palacianos e recusa-se a andar cercada por eles. Mas o GSI divulgou nos últimos dias que ela teria “cedido” e já aceitaria o cerco militar.
O general Amaro teve uma estrondosa derrota pública recente. No dia 9 de maio, o GSI anunciou ter aberto uma concorrência pública para a compra de 62 mil grades de proteção para o Planalto e o Alvorada. Logo depois de sua nomeação, havia decretado: “A segurança física do Palácio do Planalto é muito deficiente”.
Lula ficou irritado com a decisão de cercar ainda mais os palácios e, no dia seguinte ao anúncio da licitação, mandou tirar todas as grades que isolavam o Planalto e anunciou que em breve fará o mesmo no Alvorada. Não se sabe ainda se a licitação do GSI será mantida.
Veja a manifestação de Lula em 10 de maio, no dia do fim das grades: “"A democracia voltou neste país. o palácio não precisa estar cercado de grade”.
Assista:
O general Amaro havia prometido um “novo GSI” com maior equilíbrio entre militares e civis. O GSI divulgou esta semana que teria havido uma “enxurrada” de demissões de bolsonaristas do órgão, mas das 900 pessoas do quadro, apenas 80 foram afastadas -e substituídas por militares quase que exclusivamente.
Dois generais e uma história estranha
Em 9 de maio, o Informex, boletim oficial do Exército, publicou que dois generais haviam sido designados para a cúpula do GSI. O general Ivan de Souza Corrêa Filho foi “designado” para o segundo cargo mais importante do órgão, como secretário-executivo, e o general Ricardo Augusto do Amaral Peixoto, como secretário
O primeiro deles era até agora, o que é significativo, comandante de Comunicações e Guerra Eletrônica do Exército (CCOMGEX) e havia sido promovido a general três estrelas no governo Bolsonaro. O segundo comandava a 2ª Brigada de Infantaria de Selva.
No entanto, a nomeação dos dois até hoje não foi publicada no Diário Oficial. Como é que eles estão despachando e dando ordens no GSI há mais de uma semana?
Pelo jeito, para os militares, o boletim do Exército equivale a um Diário Oficial. É totalmente ilegal, mas parece que vigora no país uma “Constituição Verde-Oliva” (que nada tem a ver com o meio ambiente).
Veja abaixo a pesquisa para o general Ivan de Souza Corrêa Filho no Diário Oficial da União. A nomeação mais recente dele foi em dezembro de 2022. Nada há sobre o GSI. Mas ele está lá, mandando e desmandando
Aliados e adversários
O delegado Alexsander Castro Oliveira, chefe da SESP, atua em parceria com o diretor geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues. Ambos estão com Lula no Japão, para a reunião do G20 e, segundo líderes da SESP, “tratados com enorme deferência pelo presidente”. Ambos estavam com Lula no encontro da manhã desta sexta-feira em Hiroshima com o primeiro-ministro da Austrália, Anthony Albanese.
O grande aliado da SESP na queda de braço com os militares do GSI é o chefe de Rodrigues, o ministro Flávio Dino. Ele tem defendido que a segurança presidencial fique sob controle civil e afirma ser um risco devolvê-la aos militares, ainda mais depois dos eventos de 8 de janeiro.
Outro que naturalmente seria um aliado da PF e da SESP seria o chefe da Casa Civil, Rui Costa. Mas ele recusa-se até a andar na mesma calçada que Dino. Virou seu inimigo, sente-se incomodado com a liderança e proeminência do ministro da Justiça e, portanto, está em silêncio -lavou as mãos.
No entanto, Costa está sendo cozinhado em fogo brando pelos militares. Numa das derrotas do antigo GSI, a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) passou para a alçada da Casa Civil. O general Amaro já explicitou publicamente que quer a Abin de volta.
Nesta quinta-feira, houve uma reunião no GSI entre Amaro e Luiz Fernando Corrêa, novo chefe da Abin. É o que diz a agenda pública do general. Veja:
O que a agenda não diz é que o general Amaro convocou Corrêa e toda a direção da Abin para o encontro. Do outro lado da mesa estava toda a cúpula do GSI. Foi uma reunião semiclandestina, fora das normas que regulam a atividade de altos funcionários do Estado.
Segundo as normas de conduta do governo federal é obrigatório o registro na agenda pública toda a reunião com a presença de Ministros de Estado e/ou pessoas com cargos de natureza especial (DAS 5 e 6 ou equivalentes), presidente, vice-presidentes e diretores de autarquias, fundações públicas, empresas públicas ou sociedades de economia mista. O registro não foi feito mas, segundo uma fonte da Fórum no Palácio, a reunião aconteceu de maneira irregular.
O general Amaro está agindo, pelas costas de Costa.
Lula e os militares
Uma das medidas de Lula em seu terceiro governo foi afastar os militares de sua “cozinha”, a Ajudância de Ordens. Lula rejeitou a tradição segundo a qual militares da ativa são os ajudantes de ordens presidenciais e quem cumpre este papel hoje é o grupo de seguranças que o acompanha desde que deixou a Presidência -e foi fiel a ele mesmo no tempo da prisão em Curitiba.
São militares, é fato. Mas todos da reserva, de baixa patente e foram “descontaminados” da ideologia do partido militar pelos anos ao lado de Lula.
Segundo assessores de Lula, é difícil imaginar em tal contexto que Lula se entregue nas mãos dos militares.
Lula deixará sua segurança nas mãos de um coronel que foi braço direito de Villas Bôas, que foi o definidor do veto à sua candidatura em 2018, e de Heleno, que dispensa apresentações?