O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) abriu a reunião ministerial da última terça-feira (14), no Palácio do Planalto, com transmissão ao vivo da TV Brasil e uma enorme bronca:
"Qualquer genialidade que alguém possa ter, é importante que antes de anunciar faça uma reunião com a Casa Civil. Para que a Casa Civil discuta com a Presidência da República e que a gente possa chamar o autor da genialidade e a gente então anuncie como se fosse uma coisa do governo".
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O nome do ministro não foi citado, mas era óbvio para todos os presentes, e até mesmo para os que acompanham o dia a dia da política, que o recado era para Márcio França, ministro de Portos e Aeroportos. Ele anunciou no final de semana uma proposta de um programa de venda de passagens aéreas a R$ 200 para aposentados, servidores públicos e estudantes.
Profissionais do setor de turismo ouvidos pela Fórum estranharam a ideia. Há uma visão geral de que não se trata apenas de dar passagens baratas para que pessoas menos favorecidas possam viajar de avião para férias ou visitar parentes. Isso, é claro, é positivo, mas não basta.
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Turismo é um setor econômico amplo, que não só emprega inúmeros profissionais como também transporta outros de todos os setores. Uma economia que bomba tem um setor aéreo que bomba e vice-versa.
Os três fatores
Os bons tempos dos dois primeiros governos Lula foram um claro exemplo disto. A passagem baixou pela metade e o número de passageiros triplicou por conta da combinação de três fatores.
O primeiro deles foi o preço do querosene de aviação (QAV), que representa quase 40% das despesas de uma companhia aérea. O QAV custava na época de Lula algo em torno de R$ 1,80 a R$ 1,90 o litro. No início de fevereiro deste ano, o preço do litro chegou a R$ 5,30.
Aliado a isso, o dólar, que permaneceu abaixo de R$ 3,00 até 2014, ultrapassou a marca de R$ 5,00. Os custos em dólar, incluso aí o QAV, representam em torno de 59% dos custos totais no caso da aviação.
Para completar a equação, no período dos dois governos Lula, as pessoas tinham mais renda e as empresas um poder de investimento muito maior. O resultado foi mais gente voando – inclusive pessoas de classe média e média baixa que tanto incomodaram nossas elites nos aeroportos – e tarifas mais baratas.
França antecipou a ideia a Lula
De acordo com a jornalista Jeniffer Gularte, em O Globo desta quarta-feira (15), a ideia foi apresentada por França de forma preliminar a Lula na sexta-feira (10) no Palácio do Planalto. Auxiliares afirmam que o presidente gostou da ideia e o orientou a encaminhá-la à Casa Civil, a pasta que coordena as ações de governo, comandada por Rui Costa. França não se conteve e a antecipou para o jornal Correio Braziliense, que publicou no domingo (12) uma entrevista em que o ministro anunciava que o programa estava montado e que dependia apenas do aval do Planalto.
A barafunda estava montada e culminou com a bronca de Lula na reunião ministerial.
O diálogo foi aberto
Lula estava coberto de razão ao dar a bronca. De acordo com várias informações vindas de todos os lados, o presidente e seus assessores receberam inúmeros telefonemas do setor com perguntas e reclamações sobre o assunto. Como diria Garrincha, “faltou combinar com os russos” antes de soltar a notícia.
Noves fora, a ideia — que não é de todo ruim, tampouco é de todo boa, pois nem de longe resolve o gargalo do setor — parece ter sido queimada na largada.
No mais, o certo mesmo é que tanto esse quanto a maior parte dos grandes problemas estruturais pelos quais passa o país serão resolvidos mesmo é do outro lado da Esplanada, com Fernando Haddad, no Ministério da Fazenda.
E, para tal, será preciso de muita conversa. Tudo o mais é band-aid.
Mas, no final das contas, o anúncio de França teve um lado positivo: abriu o diálogo. A Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) e as companhias aéreas afirmaram que estão à disposição para debater o tema com o Ministério de Portos e Aeroportos.
Posto isto, os jatos começam a se preparar para taxear na pista com mais frequência